Programa de proteção a adolescentes ameaçados segue em modo “emergencial” um ano após desvios

PPCAAM segue em atividade com recursos do Fundo Especial para a Infância e Adolescência

Um ano depois de ter mais de meio milhão de reais desviado de seu caixa, o Programa de Proteção a Crianças e Adolescentes Ameaçados de Morte (PPCAAM) segue operando em modalidade emergencial no Paraná. Até hoje, o valor não foi recuperado, apesar dos processos instaurados contra o diretor da então entidade responsável, a Avis. Por causa das irregularidades e da falta de previsão orçamentária, vítimas em risco de morte ainda estão sob socorro de verba alternativa, sem injeção de recursos do estado na execução dos trabalhos que as mantém sob resguardo.  

Na prática, são os repasses mensais do Fundo Especial para a Infância e Adolescência (FIA) que vêm viabilizando as atividades. O PPCAAM é o recurso mais extremo adotado para proteger crianças e adolescentes em risco, considerada, portanto, uma intervenção essencial. Pelo perfil, até pode receber aporte de fundos, mas de maneira complementar, e não essencial, como ocorre no Paraná desde que uma sequência de irregularidades arriscou a continuidade da política, no início do ano do passado.

Os erros vieram à tona com o desvio de R$ 580 mil do programa pelo diretor da Avis, Marino Galvão. O dinheiro foi retirado da conta em datas posteriores ao fim do convênio do PCCAAM assinado entre governo do estado e União. Portanto, à época dos saques ilegais, os valores não deveriam mais nem estar sob posse da entidade e, sim, já ter retornado aos cofres públicos.

A própria Secretaria de Estado da Justiça, Família e Trabalho (Sejuf) chegou a reconhecer que falhas na gestão do contrato facilitaram o crime, mas afastou a possibilidade de envolvimento de servidores no desfalque. Mesmo assim, a pasta passou por uma dança das cadeiras depois da ocorrência.

E sem verba rubricada e com o contrato junto ao governo federal expirado, a gestão de Ratinho Jr. confortavelmente apelou ao FIA para que o programa não fosse interrompido.

O Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente (Cedca), que controla as aplicações do fundo, aprovou R$ 1,68 milhão em caráter excepcional para custear as ações, em liberações mensais de R$ 140 mil. Diante da crise, o FIA não decidiu, mas apenas deu um aval formal ao único socorro possível à manutenção das atividades de guarda naquele momento. E que continua até hoje.

Planilha orçamentária do FIA tornada pública mostra que, até dezembro do ano passado, cerca de 50% do valor já havia sido repassado aos custeios da política. Embora a Sejuf tenha previsto começar 2022 com a casa em ordem, as atividades seguem sendo executadas por uma empresa contratada em modalidade emergencial, com licitação dispensada, e já se aproxima de 15 meses a falta de vínculo formal com a União – responsável por 80% da verba aplicada ao PPCAAM nos estados.

Na Lei Orçamentária do Paraná de 2022 não há uma verba descrita especificamente para o programa, ainda que a execução da medida conste como parte de uma verba geral de R$ 4,3 milhões reservada a políticas públicas de cidadania e direitos humanos.

Os repasses do Fundo Especial para a Infância e Adolescência vencem em junho, às vésperas do encerramento do contrato temporário firmado com a Universidade Livre para a Eficiência Humana (Unilehu), renovado por mais seis meses em fevereiro. Na quarta-feira (12), a Secretaria Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, subordinada ao Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos (MMFDH), confirmou ao Plural tratativas para um novo convênio do PPCAAM junto à Sejuf.

Segundo a pasta, a formalização do documento ocorrerá quando acabar o vínculo da Unilehu com o Executivo estadual. Por causa do perfil do programa, não se aplicam os impedimentos a contratos públicos comuns em anos eleitorais, ou seja, tudo indica que até final do ano – quase dois anos depois – o programa vai voltar a operar em normalidade.

Sem dinheiro recuperado

No Tribunal de Contas do Paraná (TC) ainda tramita processo de tomada de contas aberto a partir de ofício encaminhado pela própria Avis. Ou seja, não há até agora decisões do órgão a respeito do caso. O processo aberto a pedido da Sejuf foi arquivado. Trecho do despacho compartilhado com a reportagem não explica o porquê.

A Sejuf foi procurada na última quinta-feira (7) para responder a diferentes questionamentos sobre a execução técnica e financeira do PPCAAM e também sobre o andamento dos processos movidos pelo estado para recuperar o dinheiro levado no caixa. No entanto, não houve respostas. Na tarde de terça (12), a pasta entrou em contato para agendar uma entrevista em data posterior ao fechamento deste conteúdo.

Até o ano passado, a secretaria tinha uma comissão interna para acompanhar os desdobramentos do desfalque nos cofres do PPCAAM. O grupo foi instituído pelo então secretário Ney Leprevost (União Brasil), já fora da pasta para tentar reeleição a deputado federal nas eleições deste ano.

Informações sobre a situação do programa e do uso do dinheiro repassado pelo FIA também foram cobradas por conselheiros em reunião do Cedca de fevereiro – a última tornada pública pela Sejuf. Os encontros posteriores ainda não foram disponibilizados, nem as atas dos mesmos, onde deve constar parte dos dados solicitados. A reunião foi no dia 18 de fevereiro.

Na Justiça, a Procuradoria-Geral do Estado (PGE) moveu ação civil pública de improbidade administrativa na tentativa de reaver a verba. O processo não mira na entidade, mas no à época diretor da organização, Marino Galvão, que confessou ter retirado os valores por decisão individual. Em julho de 2021, a 5.ª Vara da Fazenda Pública decretou cautelarmente a indisponibilidade de R$ 2,3 milhões em bens de patrimônio de Galvão e de um segundo agente apontado na peça, John Pimenta Santos, para um eventual ressarcimento.

Quando os fatos vieram à tona, Galvão alegou ter sido vítima do golpe do bilhete premiado. O nome de Santos, contudo, já foi alvo da Comissão de Valores Mobiliários, vinculada ao Ministério da Economia, por administrar irregularmente títulos de propriedade.

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