Por que a tarifa do ônibus em Curitiba é tão cara?

Rodrigo Salvador fala do impacto da economia e do Uber sobre a passagem de ônibus

Menos passageiros, mais concorrência. O sistema público de transporte em Curitiba conviveu por anos com termos como “modelo” e “referência”, e talvez não esteja tão distante disso no cenário nacional. Financeiramente, porém, ele apenas sobrevive.

No mês de fevereiro, defendi a dissertação “Análise da variação de passageiros no sistema de transporte público de Curitiba: projeção de valores e identificação de fatores de influência”, na Universidade Federal do Paraná, sob a orientação do Prof. Dr. Gustavo Valentim Loch e colaboração do Prof. Dr. Cassius Tadeu Scarpin. Na pesquisa, foram analisados dados do sistema de transporte de Curitiba desde 2010. O total de passageiros deste período foi obtido junto à Setransp (o Sindicato das Empresas de Ônibus de Curitiba).

No trabalho, foram aplicadas técnicas de previsão de séries temporais para estimar o total de passageiros em 2018. A demanda se mostrou necessária dado que a URBS considerou sempre apenas o ano anterior para fazer suas estimativas, sem considerar todo o histórico. Por conta disso, a queda de 25% no total de passageiros nesta década foi aos poucos pegando as empresas de surpresa.

Além disso, a pesquisa também selecionou fatores de impacto no transporte dentro de um grupo pré-estabelecido de elementos associados ao sistema. Foi possível verificar a influência que a economia exerce na variação da quantidade de passageiros. Admissões e demissões na cidade, além de matrículas na rede escolar, influenciam fortemente a variação. Outro fator de destaque é quantidade de veículos próprios na cidade. Esses fatores, juntamente à variação de PIB, INPC e IPCA, foram suficientes para explicar a variação percebida de passageiros.

Uma situação interessante surgiu da análise: todos os modelos – tanto de previsão quanto de seleção de fatores de impacto – mostraram erros pequenos até julho de 2017. Após isso, o erro pulou para a casa dos 5% e assim se manteve. Se o modelo não estivesse incorreto, algum fator desconhecido deveria explicar este fenômeno. E de fato tal fator foi identificado: o impacto do Uber, que foi regulamentado na cidade exatamente nesta época.

Os aplicativos de compartilhamento de veículo mostraram, então, não serem concorrentes apenas dos táxis, como muito se debateu. Seu impacto foi percebido também no transporte público. Através de uma pesquisa pela Internet, os resultados da pesquisa e a hipótese de influência do Uber foram comparados com opiniões dos moradores da cidade, usuários ou não do sistema. Nesta consulta popular, tanto a queda quanto a influência do Uber foram confirmadas.

Todo este cenário pode ajudar a compreender o motivo da subida da tarifa técnica, de R$ 4,71 para R$ 4,79. De forma simples, pode-se pensar que se todos os passageiros (inclusive idosos e demais isentos) pagassem o valor da tarifa técnica, ainda haveria o prejuízo operacional do sistema. Aí entra o subsídio, que para 2019 foi definido em R$ 150 milhões.

Mesmo com a elogiada infraestrutura, o transporte público de Curitiba precisa pensar em meios para atrair mais passageiros. É possível pensar em incentivos a empresas, para pagarem o deslocamento de seus empregados diretamente no ônibus.

Outra possibilidade são ônibus circulares menores e em maior quantidade, dado que o tempo de espera do passageiro nas paradas foi bastante lembrado na consulta.

Sejam quais forem as soluções, elas devem ser eficazes e rápidas. A tarifa subiu 70% no período, muito mais que o salário da grande maioria dos passageiros. O subsídio do governo pode ser entendido como um valor que nós pagamos além da passagem para sustentar o sistema. Essa década mostrou que as soluções não foram eficazes, já que tivemos tarifas maiores, subsídios maiores e menos passageiros.

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