Na primeira onda Covid-19, 98 pessoas morreram em UPAs com suspeita da doença

Pacientes ficaram internados nas Unidades, cuja finalidade é só pronto atendimento

Pelo menos 98 pessoas com sintomas de Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) na região de Curitiba morreram em atendimentos realizados por Unidades de Pronto Atendimento (UPA) entre março e outubro deste ano. A informação está no banco de dados de notificações por SRAG do Ministério da Saúde.

Outros três pacientes morreram por outras causas.

(O Plural irá utilizar o termo "internado" entre aspas nesta reportagem porque, do ponto de vista oficial, não existe internação em UPA. Os dados, no entanto, mostram que estes pacientes precisaram de leitos, sofreram procedimentos e permaneceram na UPA durante todo o período. Para facilitar a compreensão, então, usamos o termo entre aspas para sinalizar que ele descreve a situação, mas não é adequado do ponto de vista formal).

Esse grupo é parte de um total de 375 pacientes que foram atendidos em 9 UPAs de Curitiba e região metropolitana e não chegaram a ser transferidos para hospitais. Na prática, foram pessoas “internadas” nas UPAs, muito embora essas unidades não sejam para internação.

As mortes registradas nas UPAs durante a primeira onda da doença na região tem algumas características. A maioria – 58 pacientes – morreu nas primeiras 24 horas do atendimento. Outras 31 pessoas faleceram no segundo ou terceiro dia em que permaneceram no local.

Entre esses 375 pacientes “internados” em UPAs, 245 precisaram de suporte ventilatório, das quais 69 foram intubadas (84% desses pacientes morreram).

Apesar desse dado, o diretor do Departamento de Urgência e Emergência, Pedro Almeida, aponta que houve uma redução, nos últimos anos, no número de pacientes intubados em UPAs. Segundo ele, no mês de junho foram 335 intubações em 2018, 260 em 2019 e apenas 50 em 2020, em meio a pandemia.

Proteção aos hospitais

Quando é atendido na UPA, o paciente com suspeita de SRAG é encaminhado para a ala Covid. A equipe então coleta o exame PCR, avalia a gravidade dos sintomas e, se for o caso, inicia um protocolo de tratamento. “Se o paciente reverte o quadro, é liberado”, explica o diretor Pedro Almeida, diretor do Departamento de Urgência e Emergência da Secretaria Municipal de Saúde (SMS).

É o que acontece com a maioria das pessoas. Segundo Almeida, cerca de 20% das pessoas atendidas vão precisar efetivamente de internamento. A UPA atende justamente os 80% de casos que precisam de estabilização e curta permanência. É uma estratégia para evitar o sufocamento dos hospitais.

Esses pacientes “internados” cujo registro o Plural analisou seriam, portanto, uma exceção.

“Pela nossa legislação, a UPA deveria ser de curta permanência. Em Curitiba, em setembro, o tempo médio foi de 25 horas. Temos pessoas que ficam, especialmente agora com maior demanda”, diz Almeida.

Fora da exceção do período de pandemia, o tempo de entrada na UPA até a transferência para o hospital é ainda menor: 8 horas em 2020. Em 2018 este tempo era de 34 horas e em 2019, 24h.

Ele alerta, porém, que a qualidade dos dados da notificação por SRAG (que o Plural está usando nesta reportagem) é questionável.

Um exemplo seriam os cinco casos de pacientes cuja permanência na UPA registrada no Banco de dados foi superior a 10 dias. O problema seria que, após o paciente deixar o local, a atualização da informação ficaria sob responsabilidade do departamento de epidemiologia.

UPAs sob pressão

Os dados analisados pelo Plural contém informações importantes sobre a pressão que as UPAs sentiram naquela primeira fase, justamente neste momento em que estas unidades estão recebendo muito mais demandas. Segundo Almeida, cada UPA tem cerca de 16 leitos de observação, mais 20 leitos de poltrona.

Não fica tudo dedicado a Covid-19, porque as UPAs estão atendendo com fluxo em Y, separando suspeitas da doença da demanda comum. Agora, enquanto o sistema está novamente sob pressão, o número de UPAs diminuiu, uma vez que duas de Curitiba foram transformadas em leitos de retaguarda para o Hospital do Idoso.

É por isso que a prefeitura suspendeu o atendimento de algumas unidades básicas e remanejou a equipe.

Os dados analisados pelo Plural mostram que as UPAs Boa Vista e Sítio Cercado foram as que mais tiveram casos de pacientes “internados” por SRAG. São também as duas maiores unidades da capital, com cerca de 15 mil atendimentos por mês.

A UPA Sítio Cercado hoje está recebendo pacientes que deixaram de ser atendidos pela UPA Boqueirão, fechada para ser transformada em leitos clínicos de retaguarda para o Hospital do Idoso. Outra UPA que irá receber mais pacientes é a Pinheirinho, para onde a população atendida pela UPA Fazendinha foi encaminhada.

As notificações analisadas pelo Plural registram casos de Síndrome Respiratória que exigiram internação. No sistema de atendimento de saúde pública brasileiro, as UPAs não internam ninguém. Criadas em 2007, as UPAs têm a finalidade de oferecer atendimento de urgência e emergência e desafogar os pronto atendimentos de hospitais de alta complexidade.

No atendimento de casos suspeitos de Covid-19, é para as UPAs que são encaminhados os pacientes que relatam sintomas moderados e graves (assintomáticos e pessoas com sintomas leves são atendidos pelo telefone).

Casos gravíssimos, com possibilidade de morte iminente, são encaminhadas diretamente para hospitais. Mas o restante vai para as UPAs, seja via SAMU, seja por demanda espontânea (quem vai por meios próprios para a unidade). Parte desses pacientes vão acabar transferidos para hospitais se não reverterem o quadro de acordo com a fila de leitos da Central de leitos.

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