Greca elimina controle social do combate à Covid-19

Comitê que deveria acompanhar crises como a pandemia não é convocado pelo prefeito desde março, quando a cidade teve seus primeiros casos

Na teoria, a ação do administrador público deveria estar sujeita à avaliação e ao controle da sociedade. No caso específico de uma emergência de saúde pública, como a Covid-19 em Curitiba, essa participação da sociedade deveria se dar pelo menos por duas vias: o Comitê Municipal de Resposta às Emergências em Saúde Pública e o Conselho Municipal de Saúde.

Mas o Plural apurou que nada disso está acontecendo. Além de não incluir o Conselho Municipal de Saúde no debate sobre as ações do município, desde março a Secretaria Municipal de Saúde não convoca o Comitê Municipal de Resposta às Emergências em Saúde Pública.

Composto por 40 entidades do setor de saúde, governamentais e não governamentais, o Comitê tem duas funções: acompanhar situações de emergência de saúde pública e “avaliar e sugerir ações que minimizem os riscos da população exposta”.

O órgão foi recriado pelo próprio Greca especificamente para “orientar as decisões e dirimir dúvidas acerca das medidas adotadas contra a pandemia na cidade, além de instruir casos omissos na legislação”, como informado em março, quando a cidade declarou emergência de saúde pública por causa da Covid-19.

O Comitê é composto por representantes de hospitais, clínicas, de categorias da saúde, da pesquisa científica, entre outros e presidido pela Secretaria Municipal de Saúde. É um lugar para esses atores todos poderem munir de informações a secretaria, além de cobrar acesso a dados do governo para poder avaliar as decisões tomadas.

A administração municipal diz que as medidas são discutidas com o setor grupo a grupo, em convocações específicas. Porém não houve qualquer formalização de subcomitês temáticos dentro da estrutura que a própria lei municipal estabelece. Nem mesmo a reunião ordinária trimestral do grupo aconteceu desde março, quando a situação de emergência foi declarada na cidade.

Isso apesar de, teoricamente, o plano de contingência de enfrentamento da pandemia ter sido elaborado com apoio do Comitê, como a própria prefeitura divulgou amplamente em janeiro.

Sem transparência

Ao Plural a SMS informou que “aconteceram e acontecem outras reuniões virtuais, porém por segmentos, de acordo com os pontos de pauta. Por exemplo, com os representantes de hospitais quando há necessidade de avaliação nesse cenário. Com representantes de categorias de representação de serviços de saúde, sociedades, associações. Com as categorias de poder judiciário e ministério público e assim por diante. Lembrando que o comitê tem caráter consultivo e de atualização, então essa reuniões acontecem para ouvi-los, prestar esclarecimentos, e claro, colher informações do cenário do ponto de vista de outras instituições”.

A reportagem questionou porque a SMS não faz uma convocação do Comitê se os componentes do órgão estão sendo ouvidos separadamente. A secretaria respondeu que “vivemos um cenário diferente, em que não é possível convocar grandes reuniões”. Mas sem convocação oficial, não há registro nem de atas das reuniões, nem convocação pública, o que permitiria que outras instituições e pessoas solicitassem espaço para ser ouvidas pela administração municipal.

A convocação também garantiria o registro das informações apresentadas tanto pela prefeitura quanto pelos outros componentes na reunião, dando transparência ao processo. A SMS também não soube informar quando nem quem foi chamado a se reunir com a secretária de saúde ou outros representantes do governo para discutir a pandemia.

Para a fundadora do Observatório Mirante, dedicado a fiscalizar contas públicas, Denise Campos, a falta de participação social nas políticas de combate ao Covid-19 é um atraso imenso no processo de democratização. “Essas decisões afetam diretamente inúmeros segmentos sociais e precisam ser explicadas e transparentes. Parte importante dessa transparência acontece em Comitês em Conselhos. Tirar esses meios de participação é voltar a uma política antiquada típica do regime militar implantado em 1964”, diz.

Sem voz

Na prática, todo plano e ação da prefeitura de Curitiba na condução da resposta a crise do Covid-19 estão sendo decididos pela secretária municipal de Saúde, a enfermeira Márcia Huçulak, o prefeito Rafael Greca (DEM) e outros dois membros do Comitê de Técnica e Ética Médica: o diretor do Centro de Epidemiologia da Secretaria Municipal da Saúde (SMS), Alcides Oliveira, e a infectologista da SMS, Marion Burger.

Este outro comitê foi criado por Greca no decreto que estabeleceu emergência de saúde pública na cidade, em março. Em vídeo veiculado à época Greca afirmava ter o amparo de especialistas nas decisões tomadas pelo governo municipal. O apoio viria desse grupo.

O Comitê, porém, só é formado por membros do próprio governo municipal, todos envolvidos diretamente na criação e implantação das medidas tomadas. Ou seja, quem decide também avalia e corrobora a decisão. Para Campos, esta é uma prática, no mínimo, ineficaz. “Que condições alguém que está na operacionalização de uma crise tem de avaliar de forma independente o que está sendo feito?”

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1 comentário em “Greca elimina controle social do combate à Covid-19”

  1. So pode ser piada mesmo. Se tiver de ouvir as opiniões e fechar consenso com estes grupos politiqueiros em.plena pandemia nao teriamos resolvido nada. Ate no face ta dando briga.

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