Governo não repassa salário de presos há dois meses

No PR, 4,5 mil estão sem o rendimento, única fonte de sustento para muitas famílias

Presos das unidades penais do Paraná que têm trabalho remunerado estão sem receber o salário desde agosto. Repassadas pelo Departamento Penitenciário (Depen), as remunerações, equivalentes a um salário mínimo, estão atrasadas para 4,5 mil encarcerados, muitos dos quais destinam o dinheiro diretamente a famílias dependentes. O problema é na troca do sistema de transferências utilizado pela instituição.

Apesar de ter informado que “até julho, todos os pagamentos foram feitos. Em breve, o mesmo será feito em relação aos meses de agosto e setembro”, o Depen disse nesta terça (20) que os salários estão atrasados há um e não dois meses – embora não tenha detalhado no primeiro contato a lógica dos repasses. A pasta disse que os presos que trabalharam em agosto, deveriam ter recebido entre o fim de setembro e começo de outubro.

O total de presos com salários prejudicados equivale a 57,8% do total de 7.785 encarcerados que hoje trabalham sob custódia do Depen, tanto em atividades internas como em contratos com empresas cooperadas. Os que não recebem dinheiro algum trabalham apenas por remição de pena, modelo permitido pela Lei de Execução Penal (LEP).  

Com o retardo significativo do repasse dos valores, familiares do lado de fora dos estabelecimentos carcerários, que têm os pagamentos como fonte principal de renda, se veem em uma situação ainda mais precária diante da alta no preço dos alimentos e da crise no mercado de trabalho gerada pela pandemia do coronavírus.

“Existe uma lógica. Para os que trabalham fechados, dentro do sistema, o dinheiro vai automaticamente para as famílias. E os que trabalham fora usam o dinheiro, que é pouco, para sobreviver. Tem muita família que depende só desse dinheiro e, por isso, estamos falando de uma situação lamentável. É desesperador para muitas famílias”, argumenta Isabel Kugler Mendes, presidente do Conselho da Comunidade da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba. A entidade atua para reduzir os efeitos danosos da marginalização decorrente da condenação criminal.

O descompasso no repasse dos salários, no entanto, não tem a ver com inadimplência dos conveniados, mas com a transferência do dinheiro por parte do Depen, que não negou o atraso.

Em nota, a pasta, vinculada à Secretaria de Estado da Segurança Pública (Sesp), se refere à situação como “pontual” e afirma que o problema ocorre por causa da troca do sistema utilizado pela instituição. “Houve uma falha técnica, a qual já está sendo resolvida”. O Depen diz ainda que, até julho, todos os pagamentos foram feitos e que a regularização dos meses de agosto e setembro será feita “em breve”. No entanto, não estabelece prazos.

“O que chama a atenção é que não temos notícias desse mesmo atraso no Judiciário, no Legislativo, nem no Executivo. Foi afetar justamente quem menos ganha, os mais pobres desse sistema”, observa Mendes.

Um salário mínimo

As atividades remuneradas de condenados em período de cumprimento de pena não são regidas pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), mas pela Lei de Execução Penal, que defende o acesso do condenado ao trabalho como um dever social e condição de dignidade humana.

Por essa legislação, os presos têm de receber remuneração mínima de 3/4 do salário mínimo – R$ 784, de acordo com o piso mínimo nacional em vigor, de R$ 1.045.

Mas os custodiado no Paraná recebem – ou deveriam estar recebendo – o piso completo. Deste valor, segundo o Depen, 75% é destinado ao preso, por intermédio de uma conta-poupança prisional do Banco do Brasil. Dos 75%, caso o preso autorize, até 80% do valor que ele recebe pode ser repassado a um familiar. O restante (25%) vai para o Fundo Penitenciário do Paraná – e é utilizado para pagar os internos que trabalham para o próprio sistema prisional, com faxina, lavanderia e fabricação de uniformes, por exemplo.

O Depen não respondeu qual o total de canteiros de trabalho espalhados pelos estabelecimentos penitenciários, mas disse que, somente com convênios de fora, foram 112 convênios com empresas para contratação de mão de obra prisional, entre 1º de janeiro e esta segunda-feira (19). O número faz do Paraná o terceiro estado com o maior número de presos trabalhando.

Balanço mais recente do órgão, de novembro de 2019, mostrava que as unidades tinham ao todo 429 canteiros de trabalho, sendo 313 próprios e 116 com contratos de conveniados.

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