Eleição teve vereador fiscal e “carona” de eleitores

Troca de acusações entre candidatos, presença de vereadores e mensagens de whats estão entre os casos relatados

A leitura dos processos de impugnação de candidaturas ao Conselho Tutelar de Curitiba mostra um pouco do que acontece longe dos holofotes da política tradicional. As denúncias, às quais o Plural teve acesso na íntegra, serviram de base para os processos de impugnação de candidatura analisados pelo Comtiba (Conselho Municipal dos Direitos da Criança e Adolescente de Curitiba) nos últimos dias 25 e 28 de outubro.

É importante destacar que apenas quatro candidatos foram cassados (outros sete receberam uma advertência) e que ainda cabe recurso.

A eleição de conselheiros tutelares em Curitiba está cercada de denúncias, polêmicas e erros desde muito antes da primeira votação, que acabou anulada (e depois parcialmente revertida). O próprio processo de registro de candidaturas é alvo de ação da Defensoria Pública.

Mas o que se lê nas atas é uma disputa intensa de lideranças e grupos políticos. Num dos episódios mais curiosos, uma eleitora chegou ao local de votação “cianótica”, diz a ata de registros do dia. A senhora, que sofre de esclerose sistêmica, teria sido transportada até o local para votar na candidata Marcia Regina da Silveira.

A situação foi flagrada pela presidente da seção eleitoral e pelos fiscais que acompanhavam o pleito. Na defesa, Márcia declarou que o transporte de eleitores foi uma ação espontânea dos próprios. “Me emociono que os eleitores se disponibilizaram em dar carona para vizinhos e amigos, pois os mesmos me conhecem e sabem que farei um trabalho de qualidade”, registrou.

A candidatura dela foi cassada.

Márcia, no entanto, não foi a única candidata acusada de transporte ilegal. Daiane Moura Kehl Menin foi denunciada por ofertar transporte e teve a candidatura cassada. Ela mesma, na defesa, anexou um print de conversa com uma eleitora na qual a cidadã pede carona e Daiane combina de ir buscá-la.

Outra candidata, Kauana Lopes Maia da Regional Tatuquara, teria utilizado um Ford Ecosport do próprio pai para transportar eleitores. A denúncia contra ela, que foi feita por outro candidato e corroborada pelo Ministério Público, detalha que foram feitas filmagens do carro que transportou os eleitores no dia 6.

O processo registra ainda que houve envolvimento de funcionário da administração regional da prefeitura. Kauana é conselheira tutelar e está tentando a reeleição. A candidatura dela foi cassada.

Políticos e religiosos

A legislação que disciplina a eleição para conselheiro tutelar é clara: não pode haver vinculação partidária no pleito. Isso porque o cargo, prevê a lei, não é político, e sim de fiscalização independente dos poderes. No entanto, a presença do Estado, de lideranças é constante.

As denúncias feitas ao Comtiba contam uma história curiosa. A candidata Roseli Aparecida Bronosky, da Regional Tatuquara, indicou para fiscal, no dia do pleito o marido, que é o vereador Rogerio Campos (PSC). Como fiscal, Campos passou o dia de votação na seção eleitoral, cumprimentando eleitores e acompanhando o processo.

A situação foi registrada pelo promotor Willian Lira de Souza, que fiscalizou o pleito na região e encaminhada para a promotora Fernanda Nagl Garcez, da 3.ª Promotoria de Justiça da Criança e do Adolescente, para que então se decidisse se haviam elementos para denúncia. O Ministério Público então apresentou pedido de impugnação contra a candidata, que acabou arquivado pelo Comtiba.

Ao Plural, o vereador disse que foi fiscal e deverá ser novamente no dia 10 de novembro, quando os eleitores do Tatuquara devem votar novamente. “Se não infringi nenhuma lei, se não fiz boca de urna, não tem porque não estar presente”, disse.

O Ministério Público recorreu do arquivamento. O caso deverá ser novamente apreciado no dia 5 de novembro.

Campos disse ainda que não faz campanha para a mulher e que se sente constrangido por não poder acompanhá-la nas agendas de campanha. “Tudo na vida tem como base a sua família”, respondeu quando questionado porque ele precisaria acompanhar a mulher numa atividade profissional dela.

Outro vereador citado indiretamente nas denúncias é Marcos Vieira (PDT). Uma denúncia contra Salete Maria Pires Costa aponta o motorista do parlamentar como responsável por pedir votos para ela durante um evento religioso. A assessoria do vereador informou ao Plural que não tem relação com a pessoa citada.

O processo contra Salete também diz que um religioso, Frei Edmilson Borges, da Paróquia Profeta Elias, teria pedido votos para ela. A denúncia é da Associação de Moradores, Cultura, Lazer e Turismo do Bairro Novo A, que indica que o próprio Frei Edmilson Borges teria enviado mensagens pelo aplicativo Whatsapp no dia 6 de outubro (dia da eleição, portanto, já vedada a veiculação de propaganda), no qual dizia “Vamos lá votar na eleição do Conselho Tutelar, votar como campista. vc sabe muito bem em quem votar”.

O Frei Edmilson Borges, da Paróquia Profeta Elias, afirmou em manifestação dirigida ao Comtiba que não houve propaganda em favor de nenhum candidato “sendo caluniosa afirmação ao contrário”. Salete teve a candidatura cassada.

Ao Plural, Frei Edmilson disse que, como padre, acompanha “variados casos de violência contra os menores” e que sempre apoia “o exercício da cidadania. Se o grupo era de campista, devo votar como campista”, que é “estar sempre empenhado em defender a vida sobretudo dos que mais precisam”. Por fim, afirmou que vai continuar a insistir na participação de processo sem apresentar nomes de candidatos.

Já o vereador Mauro Ignácio (PSB), foi citado na denúncia contra Kerley de Castro Lara  por oferta de transporte de eleitores via conversa por aplicativo de chat. O parlamentar também teria participado de um evento da Associação de moradores Amopis, do qual Kerley participou com uma camiseta de campanha.

A assessoria de Ignácio informou que ele esteve na Associação para falar sobre a Semana de Gestão Pública, não para endossar a candidatura.

Denúncias

Nem os conselheiros do Comtiba escapam das denúncias. Em pedido de providências encaminhado pela Femotiba ao Ministério Público e ao Comtiba, a instituição, que representa associações de moradores e clubes de mães da cidade, denuncia os conselheiros por falsidade ideológica e improbidade administrativa.

Neste dia 30, a Federação fez um acréscimo a denúncia, pedindo a anulação de todas as audiências que analisaram pedidos de impugnação. A instituição entregou ao Ministério Público gravação na qual os conselheiros aparecem assinando a ata de uma audiência da qual não participaram. A expectativa é que o caso vire um processo judicial em breve.

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