Definição de professora no Google revela nosso histórico de ignorância

Pesquisa revela definição que já estava presente em dicionários brasileiros pelo menos desde 1975

A internet brasileira se chocou no último dia 21 de outubro ao descobrir que, ao procurar o termo “professora significado” no Google, o resultado destaca pela ferramenta informar que é “mulher que ensina ou exerce o professorado”, mas também diz que regionalmente também significa “prostituta com quem adolescentes se iniciam na vida sexual”.

Uma campanha informal já se formou para denunciar o resultado, e uma série de veículos noticiou o caso, como é o caso de qualquer coisa que “viraliza” na internet (e é noticiado mais pelo potencial de audiência do que pelo valor-notícia). Mas afinal, o Google realmente chama as professoras de prostitutas?

Não. Há alguns anos o Google vem aprimorando os resultados de busca se valendo da imensa força e capacidade de padronização que exerce na web. Traduzindo: se submeter ao padrão do Google é o mínimo para conseguir emplacar páginas bem colocadas nos resultados da ferramenta.

Uma das ações da empresa tem sido estabelecer padrões para conteúdos específicos, como notícias, receitas, conteúdos enciclopédicos. Isso permite que a ferramenta identifique esses conteúdo e possam mostrar de forma proeminente alguns resultados que melhor representam a resposta que o usuário quer.

Na prática, isso significa que o Google nunca produz conteúdo de fato, ele só se vale da imensa coleção de informações na web. Então quando ela informa que o significado de professora no Brasil também é de “prostituta”, ele só está reproduzindo o conteúdo de sites que ele identificou como de referência.

Mas então quem é que definiu professora assim? Muita gente. O Dicionário Aurélio, por exemplo, desde sua primeira edição, de 1975, contém o seguinte verbete:

professora (ô).
[Fem. de
professor] S. f. 1.
Mulher que ensina
ou exerce o
professorado;
mestra. 2. Bras. N.
E. Pop. Prostituta
com que
adolescentes se
iniciam na vida
sexual. [Pl.:
professoras (ô),
Cf. professora e
professoras do v.
professorar.]

VERBETE “professora”: o que (não) diz o Dicionário Aurélio. Papéis: Revista do Programa de Pós Graduação em Estudos de Linguagens – UFMS, Campo Grande, MS, v. 18, ed. 35, p. 77-93, 2014. Disponível em: https://periodicos.ufms.br/index.php/papeis/article/view/3012. Acesso em: 22 out. 2019.

O Google é um sistema semântico, que tenta encontrar relações entre termos e diferentes significados de palavras. Quando você digita São Francisco, a ferramenta não se limita a procurar simplesmente pelo termo digitado, ela tenta descobrir se você se refere a cidade, ao santo, ao bairro ou ao rio. Se a busca por professora resulta numa definição carregada de sexismo é porque nossa ignorância e machismo já havia feito tal relação.

Mas então o Google não tem culpa? Bem, não é bem assim. Primeiro porque ao abraçar essas definições ele ajuda a tornar universal um entendimento que, às vezes, é pontual. Segundo porque, muito embora não seja produtor de conteúdo, o Google não só reproduz como monetiza o conteúdo alheio, portanto precisa se responsabilizar por ele. Mas essa é uma discussão para outro artigo.

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