Escolas municipais devem voltar às aulas presenciais?

Tema foi discutido em audiência na Câmara dos vereadores, que pressionam pela retomada

Um mês após as escolas da Rede Particular de Ensino do Paraná terem retomada as aulas presenciais, a discussão em torno da volta na Rede Municipal foi tema de uma audiência pública nesta sexta-feira (7), na Câmara de Vereadores de Curitiba. A pressão pela retomada foi evidente, mas professores e Prefeitura dizem que ainda não é o momento.

A superintendente de gestão educacional, da Secretaria Municipal de Educação (SME), Andressa Pereira apresentou as ações da pasta desde 2020, passando pelo planejamento pedagógico e pela composição do protocolo de segurança sanitária contra a Covid. Ela falou da volta às salas de aula, por uma semana, em fevereiro de 2021.

“Foi um movimento lindo, professores ansiosos para este retorno, equipes preparadas, instruídas quanto aos protocolos. Não esperávamos um decreto de suspensão, com números alarmantes. Bandeira vermelha, risco grande de contágio. Mas a Educação não parou e a garantia do direito à Educação permanece”, disse a superintendente.

A Capital segue no ensino remoto desde então. Andressa lembrou que, ano passado, 241 servidores foram contaminados pelo coronavírus, o que representava 0.84 casos por dia. De 9 de fevereiro a 2 de maio deste ano, foram 630 servidores positivados – uma proporção diária de 7.68 casos. “A taxa de ocupação nas UTIs era de 78%, hoje está em 91%. Já as Enfermarias estavam 55% ocupadas, hoje estão com 81% de ocupação.”

O diretor do Centro de Epidemiologia da Secretaria Municipal da Saúde (SMS), Alcides Oliveira, destacou que há apoio à vacinação dos professores, mas ela não é condicionante à abertura. “Ela protege contra forma grave da doença, evita internamento e morte. Porém, mesmo os já vacinados poderão adoecer e transmitir a doença. A vacina não é passaporte pra imunidade. O passaporte é não se descuidar e não esquecer as regras básicas de proteção.”

Oliveira disse ainda que as contaminações dos servidores na semana presencial, em fevereiro, foram investigadas e se deram “na hora do cafezinho”. Ele alertou que nas próximas semanas os casos de contaminação em Curitiba estão previstos a aumentar e que é preciso “aprender a conviver com a pandemia”.

Sem segurança

Mesmo com os protocolos de retorno implementados, os professores garantem que não há como manter a segurança nas escolas, e pedem a vacinação para todos os profissionais da Educação. “Volta às aulas só quando tiver trabalhadores vacinados, taxa de transmissão controlada e escolas e CMEIs (Centros Municipais de Educação Infantil) com estrutura para garantir os protocolos, mas quem conhece sabe que não temos nenhuma destas três condições”, observou a professora e coordenadora-geral do Sindicato dos Servidores Públicos de Curitiba (Simuc), Cristiane Schunig.

“A gente que está na ponta sabe que não tem condições. A Educação Infantil requer acolhimento, colo, abraços. As crianças chegam muito inseguras e dependem desse carinho para se ambientar. Como será isso com todas as restrições e distanciamento”, questiona. “Vocês acham que elas entendem que não podem chegar perto dos amigos, não tocar os brinquedos, ficar só de máscara? Pra quem fica só sentado em home office é muito fácil falar.”

O professor e diretor do Sindicato dos Servidores do Magistério de Curitiba (Sismmac), Wagner Batista, apontou que, em uma semana de aula em fevereiro, houve casos de contaminação por Covid-19 em pelo menos 64 das 400 escolas e CMEIs. “Foram 115 profissionais infectados, unidades sem água por mais de 24h, não houve testagem e teve criança assintomática indo pra escola a semana toda, e só se descobriu depois que estava com Covid. Ficam nesse empurra que a volta tem que ser imediata, mas as condições do dia a dia não são nem verificadas.”

A favor

Além dos vereadores, dos quais a maioria se mostrou a favor do retorno presencial, incluindo a responsável pela convocação da assembleia, Amália Tortato (Novo), outros profissionais foram chamados para sustentar a tese de que é seguro voltar para escola.

“O Brasil está entre os últimos países do mundo a voltar às aulas e estamos falando de uma atividade essencial. (…) Temos um estudo em São Paulo que mostrou que não houve aumento na taxa de transmissão nos municípios que voltaram às aulas. Os protocolos funcionam, mas há de fato uma complexidade. Precisamos trabalhar os profissionais pois o vírus entra na escola pelos adultos, as crianças são pouco transmissoras”, garantiu a médica epidemiologista Maria Esther Graf, Hospital de Clínicas (HC). Segundo ela, não há relação do aumento dos casos de março com a abertura de escolas públicas, mas sim com a cepa de Manaus.

Na visão do pediatra Rubens Cat, também do HC, “as crianças foram poupadas pelo vírus de ter formas mais graves da doença” e por isso podem ir para escola todos os dias. “O mundo abriu as escolas há um ano e hoje temos um consenso científico em dizer que a escola não é propagadora de vírus. A escola protege. A chance de pegar em casa é maior do que na escola.”

Ele afirmou que “temos que agradecer o vírus com relação às crianças”, já que as novas cepas estão “poupando” elas. “A mortalidade em 2021 é menor do que em 2020. As crianças continuam sendo poupadas de formas mais graves e mortalidades. Somente 11% a 13% dos casos representa crianças.”

Na opinião do médico, a escola pública consegue manter uma estrutura de distanciamento e uso de máscara. “O ensino remoto no Brasil é uma falácia imaginar isso. Não tem como uma criança aprender. Falácia também dizer que só volta com vacina pros professores. Por que as escolas privadas voltaram e a escola pública não pode voltar?”

Esse foi um dos pontos jurídicos questionados pelo advogado Paulo Bandeira, da Comissão da Criança e do Adolescente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/PR). “A Educação é um direito social fundamental. Atender isso não é opção do Estado e do Município, é obrigação. E é preciso oferecer de maneira ampla e igualitária. Nenhuma norma pode restringir esse direito sob pena de termos um retrocesso social. Os mais prejudicados são os pobres, que não estão inseridos na iniciativa privada e ficam à mercê de uma decisão do Estado”, observou.

A justificativa do direito igualitário pela Educação é usada pelo Movimento Escolas Abertas em uma ação popular contra a Prefeitura de Curitiba, no intuito de exigir a reabertura das escolas municipais. O Ministério Público tem ações semelhantes em andamento.

“Vivemos o melhor momento pras escolas, pois temos escolas particulares abertas, a fala do governador sobre 100 municípios já com escolas funcionando e abertura no dia 10. Ficamos muito felizes, mas precisamos continuar atuando para que todos possam voltar pra escola. Precisamos de mais visibilidade pois entendemos que é possível voltar com segurança”, discursou a representante do movimento, Michelle Bigarella. Ela avalia que aulas remotas são medidas excepcionais e que estar longe da escola vem provocando nas crianças “depressão, ansiedade, obesidade, tendência ao suicídio e prejuízos pedagógicos”.

Discurso reforçado pela psicopedagoga Mariana Canova, para quem as consequências do fechamento das escolas são irreparáveis. “Na Psicopedagogia observamos o ser humano no cognitivo, no funcional, no social e no emocional. Se um destes estiver disfuncional vai afetar todo o processo. (…) A defasagem vai perdurar por anos.”

Mãe de um menino autista de 7 anos, a enfermeira Amanda de Carvalho contou que é difícil manter o filho prestando atenção nas aulas online. “Nossa sobrecarga e paciência não são as mesmas, tenho as minhas limitações pois não sou profissional da Educação, não tenho a técnica pra isso. Então sinto que meu filho está penalizado por estar em casa.”

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