Bandeira vermelha veio depois de 17 dias com leitos lotados

Para secretaria de Saúde, a população precisa de "respiro" das restrições da pandemia

Há 17 dias Curitiba já tinha ocupação real de leitos Covid-19 superior a 100%, mas o decreto de bandeira vermelha só veio nesta sexta, dia 28 de maio. Foi uma demora maior que em março, quando o decreto veio 14 dias após o colapso do sistema. A falta de leitos levou a morte 394 pessoas naquele mês. A ocupação real considera o total de pacientes Covid-19 internados tanto em leitos Covid quanto em leitos comuns, mais a fila de pessoas aguardando vagas em hospitais.

Em entrevista coletiva nesta sexta, a médica infectologista Marion Burger disse que apesar da restrição maior ter reduzido o número de casos da doença e internamentos, não havia como mantê-la por mais tempo porque a população “precisa de um respiro”. “A medida perderia a efetividade”, afirmou

A bandeira vermelha decretada em 12 de março ficou em vigor por apenas duas semanas. O gráfico abaixo mostra o total de pessoas internadas em Curitiba em leitos Covid-19 por dia e a linha amarela indica a bandeira de alerta vigente (1 é amarela, 2 é laranja e 3 é vermelha). Nele é possível observar que o efeito da bandeira vermelha (esperado para entre 10 e 15 dias após a implantação da medida) começou justamente quando a medida foi suspensa.

Como consequência a queda no número de casos foi importante e reduziu a ocupação real de leitos para menos de 100%, mas o número de internados permaneceu num patamar alto, pouco abaixo dos mil pacientes e muito acima do patamar registrado no início de fevereiro.

É justamente o alto número de pessoas internadas que colocou o sistema em colapso novamente neste fim de maio. Desde o fim da bandeira vermelha em abril a cidade nunca teve ocupação real de leitos inferior a 90%, um índice crítico. Mas mesmo assim retomou atividades não essenciais e não tomou medidas mais intensas de contenção da doença.

Na coletiva a secretária municipal de saúde, Marcia Huçulak insistiu que o objetivo é equilibrar a necessidade de manter a atividade econômica com a redução dos danos causados pela pandemia e pelo colapso do sistema. O novo decreto tem duração de duas semanas.

Dados sistematizados pelo Plural a partir das informações divulgadas pela própria prefeitura mostram que há 17 dias já estávamos novamente em colapso. Mesmo assim a prefeitura adiou a declaração de bandeira vermelha para esta sexta-feira, 28 de maio, quando a situação já beira o caos e já houve relatos de falta de medicamentos em UPAs.

Há quatro dias Curitiba tem déficit de 400 leitos Covid-19 no SUS e ocupação real de 130% das 1265 vagas disponíveis no sistema. Isso depois da prefeitura ativar 14 leitos de UTI Covid-19 no último dia 27. A fila por leitos está há uma semana acima de 300 pacientes, 40% desses aguardam uma vaga em UTI.

Desde o dia 21 de maio a fila por vagas em leitos de UTI e enfermaria Covid-19 está acima de 300 pacientes. Além disso, o percentual dessa fila que precisa de leito em UTI pulou de 30% para quase 50%, o que indica o aumento de pacientes gravíssimos “internados” em UPAs e pronto socorros, muitos deles intubados sem o cuidado constante exigido pela condição.

Como medida para segurar o aumento da fila por leitos, a prefeitura anunciou o fechamento de todas as UPAs e a conversão delas em leitos de internamento. Na realidade, a medida terá efeito limitado uma vez que as UPAs já atuavam como leitos e as seis unidades que ainda mantinham atendimento de demanda espontânea também mantinham 130 leitos de enfermaria exclusivos para Covid-19. Essas mesmas UPAs agora deverão abrir outros 60 leitos.

A medida evidencia a dificuldade para ativar novos leitos e uma mudança de estratégia. Ainda esta semana a secretária Marcia Huçulak disse que a capital não havia desativado leitos para criar vagas para a pandemia. No entanto, a cidade conseguiu nessa nova onda ativar apenas 14 novos leitos de UTI e deve abrir as 60 vagas em UPA porque a UPA Fazendinha, que havia sido transformada em leito de retaguarda, será também convertida em leito Covid.

Enquanto isso, no setor privado, 89% das UTIs e 77,7% dos leitos em hospitais da rede Unimed Curitiba estão ocupados, segundo boletim do plano divulgado neste dia 28. É um cenário desolador. Como as medidas de restrição só devem começar a ter efeito nos números da pandemia entre 10 e 15 dias, a próxima semana será de extrema pressão sobre as equipes de hospitais da cidade e alto risco para pacientes.

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3 comentários em “Bandeira vermelha veio depois de 17 dias com leitos lotados”

  1. Eu gostaria de ver os números reais de ocupação de leitos, considerando a capacidade normal da cidade, sem contar a ampliação emergencial. Talvez assim, houvesse a consciência de que estamos 300, 400% acima da capacidade!

  2. No dia 14/05, o prefeito inaugurou o Memorial Paranista. Aquela aventura telúrica e infame foi muito bem reportada pelo Plural.

    Há indícios, portanto, de que a prefeitura tenha feito vista grossa ao aumento de casos da Covid-19 para que Greca pudesse inaugurar o, nas palavras dele, “mais lindo e importante museu do Brasil”.

    Importante estabelecer conexões entre a política local e a nacional, particularmente em tempos de CPI. De fato, Bolsonaro é o articulador mor do genocídio que vitima os brasileiros, contudo, há que se imputar outros agentes que também agiram com tibieza. É o caso do prefeito Greca.

    No caso específico do Memorial Paranista, tudo indica ter sido mais um dos rompantes característicos do prefeito.
    Na página da prefeitura, a informação de que “a estrutura do Memorial Paranista e as demais melhorias no São Lourenço receberam investimentos da ordem de R$ 10,6 milhões”.

    Para efeito de comparação, considerando a ocupação diária de 500 leitos UTI-SUS entre abril e maio – e supondo um curso diário de R$2.500,00 por leito -, então, em 60 dias, Curitiba gastou cerca de R$75 milhões para manter tão somente os leitos de UTI-SUS; o montante corresponde a 7 vezes o investimento realizado no Parque São Lourenço. Esta é uma comparação relevante. O dinheiro gasto com os leitos e a estrutura hospitalar é dinheiro público. Sai do bolso de todos, inclusive dos mais vulneráveis e que são submetidos a maiores riscos.

    O discurso da secretária Marcia Huçulak (equilibrar a atividade econômica com a redução dos danos à saúde) é um discurso limitado e falho, tanto do ponto de vista moral, quanto da própria perspectiva econômica.

  3. Enquanto a secretária Marcia fica brincando de equilibrar, mais e mais gente morre e mais se estende o sofrimento para os que tentam fazer o correto. Esse país é uma piada.

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