Apagão nas plataformas Lattes preocupa universidades do Paraná

UFPR teme que persistências das falhas possa atrapalhar andamento de pesquisas científicas conduzidas pela instituição

A pesquisa brasileira sofre com mais um revés, desta vez com o apagão no banco de dados da pesquisa nacional. Falhas em um servidor do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) interromperam o acesso ao sistema das plataformas Lattes, incluindo os currículos de pesquisadores e os diretórios de grupos de pesquisa. O problema foi detectado há pelo menos quatro dias, mas só nesta terça-feira (27) o governo federal prestou esclarecimentos públicos. Diante do pânico generalizado de uma possível perda de dados, pesquisadores e instituições de ensino superior do Paraná se manifestaram em tom de preocupação.

O informe do CNPq, no entanto, afirma que o órgão tem suportes de backups para impedir a perda de dados da plataforma, o que evita uma possível irreversão nas falhas. A declaração sugere que o apagão foi consequência de uma desordem tecnológica já identificada e em processo de reparação, apesar de não haver uma data para normalização dos acessos.

A demora no pronunciamento e a falta de informações precisas deixou a comunidade acadêmica em polvorosa e levou o assunto ao mais comentado das redes sociais do dia. Justificável. A plataforma concentra hoje todo o arsenal de dados da produção científica brasileira, além de ser a ferramenta oficial para o trâmite de processos de seleção de editais de pesquisa, migração funcional de docentes e solicitações de bolsa, por exemplo.

“Seria uma tragédia [caso os dados não fossem recuperados]. Eu não consigo estabelecer com vocês um parâmetro para estimar a profundidade de uma tragédia desse nível”, declarou o professor Francisco de Assis Mendonça, pró-reitor de Pesquisa e Pós-graduação da Universidade Federal do Paraná (UFPR). Referência em estudos brasileiros sobre o clima, ele passou o dia tentando conter acalmar docentes e colegas pesquisadores da instituição sobre a pane no sistema do CNPq. “Oficialmente, estamos seguros de que o problema será consertado”, disse.

Segundo ele, dos quase três mil professores da UFPR, mais de 2 mil são pesquisadores ativos, ou seja, produtores de conhecimento em ritmo acelerado e cujos resultados estão diretamente ligados ao desenvolvimento da sociedade – como estudos sobre Covid-19, inclusive. O apagão que deixa fora do ar as plataformas Lattes, se persistir, deve travar a atualização da produção científica da universidade – e de todas as demais instituições e agências de investigação do país – e prejudicar a adesão a editais de pesquisa que usam o currículo Lattes e o diretório de grupos de estudo como parte do processo de seleção. Contudo, o CNPq afirmou que todos os prazos de ações relacionadas ao fomento da agência  estão suspensos e serão prorrogados.

A Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR), maior universidade privada do estado, disse que está atuando com o Fórum Nacional de Pró- Reitores de Pesquisa e Pós-Graduação (Foprop) “a fim de apoiar possíveis soluções junto ao CNPq para que o problema seja resolvido da melhor forma e o mais rápido possível”.

A Associação de Pós-Graduando da UFPR (APG-UFPR) também se posicionou. Em nota publicada em suas redes sociais no fim da tarde desta terça-feira, o coletivo mostrou preocupação com a situação e alertou para o fato de ainda não haver um posicionamento claro sobre como as falhas podem afetar o pagamento das bolsas. “É importante salientar que o ocorrido é mais um dos diversos exemplos do sucateamento pelo qual a ciência brasileira vem passando nos últimos anos e seguimos na mobilização em defesa das instituições de ensino e pesquisa”, diz o texto.

Sucateamento

O fato deu ainda mais força ao coro dos que gritam contra a precarização da pesquisa no Brasil. O apagão dos dados veio menos de dois meses depois de o governo de Jair Bolsonaro (sem partido) tesourar a previsão orçamentária do CNPq, diminuindo pela metade a intenção de liberação de verbas para fomento em ciência e desenvolvimento tecnológico. Se o orçamento se concretizar – a União prometeu rever os repasses em agosto – será a menor verba da agência desde o início dos anos 2000.

Por isso – somando-se ao corte sistemático de verbas nas universidades públicas –, os problemas no sistema das plataformas Lattes engrossaram o desgosto da comunidade científica nacional.

“Esse apagão que aparece nesse momento não está descontextualizado de uma ação governamental de desvalorização e desincentivo da ciência nacional. Ou seja, já havia avisos anteriores a esse apagão que o sistema estava em deterioração”, disse o pró-reitor da UFPR. Segundo ele, a trava no servidor do CNPq não foi uma surpresa e é apenas mais um resultado da falta de investimentos públicos nos trabalhos de desenvolvimento científico que movimentam universidades e instituições diariamente.

“A surpresa está no impacto que um apagão num sistema como esse possa causar. Mas o fato de mais uma atitude no sentido do desincentivo à ciência nacional, nesse sentido não há novidade”, analisou. “E isso justamente no momento em que a pandemia tornou tão claro que é preciso investir mais em ciência porque é a ciência que é capaz de controlar a gravidade desse processo histórico tão dramático”.

Importantes nomes da produção acadêmica, muitos envolvidos diretamente com estudos sobre a Covid-19, usaram suas redes sociais para alertar sobre a falha. Políticos também se manifestaram. Entre a bancada federal do Paraná no Congresso, apenas dois deputados – Gleisi Hoffmann e Zeca Dirceu, ambos do PT – trouxeram o tema à tona. Aliel Machado (PSB), que é presidente da Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática na Câmara, não havia se manifestado publicamente sobre os erros no sistema Lattes até o fechamento desta matéria.

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