A preocupante baixa adesão à vacinação infantil contra Covid em Curitiba e região metropolitana

A chance das crianças desenvolverem sequelas e problemas graves de saúde em caso de infecção por Covid-19 é infinitamente maior do que as raras reações ao imunizante

O médico pediatra Rubens Cat avalia como irresponsabilidade as informações distorcidas que são propagadas sobre a vacinação infantil. “Assim como no mundo todo, há médicos que não acreditam nos benefícios das vacinas. Os motivos pelos quais esses profissionais não acreditam na segurança e eficácia dos imunizantes é que eu não consigo entender”, critica Cat, complementando que a principal causa de mortes de crianças no Brasil nos últimos dois anos foi a Covid-19 – matou mais crianças e adolescentes que todas as doenças preveníveis por vacinas juntas.

Desde o início da pandemia, cerca de 3 milhões de crianças foram acometidas pela Covid-19 no Brasil. A média de internação é de 1,5 a 2%. Apesar da Ômicron ser menos agressiva, tem propagação maior do que as outras variantes e acaba por infectar um grande número de crianças. A preocupação em relação a esses dados é que quanto maior o número de crianças infectadas, maior o número de internamentos, de complicações e possivelmente maior número de mortes.

Segundo o pediatra, amparado por estudos da Academia Americana de Pediatria e do Centro de Controle de Doenças, a chance de uma criança desenvolver miocardite por reação à vacina é de 0.0001%. A chance de uma criança que teve Covid grave (com necessidade de internamento) desenvolver miocardite e outras lesões cardiovasculares é de 15%.

“Vacina não é opinião, é obrigação. Está no Estatuto da Criança.”

Rubens cat, médico pediatra.

Há quem acredite que não se deve vacinar as crianças pois teriam menos chances de pegar o vírus que adultos. Hoje, a chance de uma criança ser positiva para covid é igual a de um adulto. Um estudo desenvolvido na África do Sul, com a variante Ômicron, demonstrou que crianças abaixo de quatro anos tiveram aumento de 29% nas internações, enquanto houve uma diminuição da taxa em 20% nas internações de adultos. Atualmente no Brasil, a maioria, quase totalidade, dos internamentos na ala pediátrica dos hospitais são de crianças não imunizadas – crianças abaixo de 4 anos ou maiores de 5, elegíveis para a vacinação, mas que não foram vacinadas.

Em uma pandemia, sempre os mais vulneráveis serão os mais atingidos e os mais vulneráveis hoje são os não vacinados, sendo crianças e adolescentes os principais grupos de não vacinados no mundo.

A principal e mais grave complicação da Covid-19 é a Síndrome Inflamatória Multissistêmica. A criança apresenta sintomas leves da doença, sem necessidade de internação, e de duas a seis semanas depois a complicação aparece: “Uma a cada 1.500 crianças que tiveram Covid podem desenvolver essa síndrome. E é a principal causa de internação de crianças em UTIs. Dessas, 50% desenvolveram lesões cardiovasculares e 6% morreram. O risco de complicações e sequelas da Covid em crianças é infinitamente superior do que as raras reações à vacina”, alerta o pediatra Rubens Cat.

“A pessoa que escolhe o risco da Covid está fazendo as contas erradas. Uma a cada sete crianças que foram internadas por Covid terão lesão cardíaca”

Rubens Cat.

Outra temida complicação é conhecida como Covid Longo: 10% das crianças infectadas com Covid podem ter a covid longo, que consiste em problemas cardíacos, respiratórios e, principalmente, neurológicos. Além de outras complicações orgânicas. Mais de 300 mil crianças no Brasil estão em risco de ter esse tipo de sequela.

“É uma questão de custo benefício: o último boletim do CDC indicou que em 9.5 milhões de doses aplicadas de imunizante, em crianças de 5 a 11 anos, houve 12 casos de miocardite. Um caso a cada 800 mil doses aplicadas. Em caso de uma criança pegar covid grave e precisar internar, uma em 15 desenvolve lesão cardiovascular ou miocardite, com taxa de mortalidade de 6%.”

Rubens Cat.

E todos os casos analisados pelo CDC de miocardite por reação à vacina são benignos, não apresentam sequelas e não foram registrados óbitos.

Rubens Cat observa também que Curitiba não é uma exceção quando o assunto é baixa adesão à vacinação infantil. Toda a média nacional está baixa. Para reverter este quadro, o médico entende que a Sociedade Brasileira de Pediatria, que é favorável à vacina infantil, deveria ser mais atuante nesse aspecto, promovendo materiais de conscientização e campanhas massivas e ostensivas para mostrar que o imunizante é seguro e eficaz. E sugere também um esforço em conjunto dos órgãos de saúde com a mídia, a fim de propagar informações amparadas pela ciência, esclarecendo os pais e responsáveis quanto à segurança e eficácia das vacinas com a mesma intensidade que os negacionistas propagam desinformações.

Está em discussão na Academia Americana de Pediatria o aumento do intervalo entre as doses. Na bula original da fabricante, Pfizer, os intervalos indicados são de 3 a 4 semanas. Se houver o aumento do intervalo para 8, 10 ou 12 semanas, é possível que as chances de desenvolvimento de miocardite, que já eram baixos, sejam ainda mais reduzidas, além de produzir uma resposta de imunidade ainda maior. Especificamente em crianças de 5 a 11 anos, a redução da dose da vacina (1/3 da dose para adultos) também é uma medida que pode reduzir, ainda mais, as chances de reação.

“A partir do momento que temos vacinas seguras e eficazes, aprovadas pela Anvisa, uma única morte, seja de adulto, crianças ou adolescente não vacinado, é inaceitável. Se você quer fazer uma seguro de vida para seu filho e proteger não só o coração dele como também sua vida, o vacine”, afirma o pediatra.

“A vacina foi liberada para gestantes. Se a vacina é segura enquanto o feto está em formação, se oferece benefícios para a mãe e o bebê, por que não vacinar crianças?”

Rubens Cat.

Em baixa

Em Curitiba, a imunização da faixa etária de 5 a 11 anos representa o total de 165 mil crianças. Até terça-feira (8), 46% desse público foi vacinado, correspondendo a 76 mil crianças. A adesão à vacina para esse público continua baixa. Segundo a Secretaria Municipal de Saúde (SMS), entre os fatores que podem contribuir para que os responsáveis ainda não tenham levado as crianças para se imunizarem está o período final de férias escolares e o fato de uma parcela estar no período de 30 dias de intervalo necessário para receber a vacina nos casos em que a criança teve Covid-19.

Na última terça-feira (8) foi concluída a convocação de todas as faixas etárias do público de 5 a 11 anos para a vacinação e reforçada a necessidade que pais, familiares e responsáveis levem suas crianças para receber a imunização contra a Covid-19. Inicia-se, portanto, a repescagem para todo o público infantil. A prefeitura de Curitiba tem investido em campanhas que são divulgadas nas redes sociais do município, em painéis digitais, dentro dos ônibus e em mobiliares urbanos.

Em Araucária, são 16 mil crianças que fazem parte da faixa etária de 5 a 11 anos. Dessas, até quarta-feira (9), 7.152 tomaram a vacina. A expectativa da Secretaria de Saúde do município era de ter vacinado pelo menos 10 mil crianças no mesmo período. Identificaram também que um dos motivos para a baixa adesão se deu por conta do isolamento de pais e responsáveis – o município possui no momento 4 mil casos ativos de Covid-19. A prefeitura de Araucária reforça nos canais oficiais a importância da imunização dessa faixa etária e também estão processo de contratação de carro de som, um tipo de divulgação que funciona bem no município. Esperam que na semana que vem os números de crianças vacinadas aumente.  

Em São José dos Pinhais, das 20.033 crianças que se cadastraram para vacinação, cerca de 15 mil foram vacinadas. O município não soube informar o número total de crianças que estão na faixa etária em questão, apenas os cadastrados para imunização.

Em Pinhais, cerca de 13 mil crianças da faixa etária de 5 a 11 anos estariam aptas a serem vacinadas. No entanto, apenas 4,659 crianças foram imunizadas, cerca de 35% da meta. Para a Prefeitura o maior desafio é combater a desinformação. Diferentemente dos demais grupos, a vacinação infantil é a que gera mais resistência. No município a vacinação ocorre por meio de agendamento e muitas famílias faltam no dia marcado. O receio de efeitos colaterais dos imunizantes, bem como o período de férias são alguns dos motivos que a prefeitura encontrou para justificar a baixa adesão à vacinação dessa faixa etária. O município está trabalhando na produção de materiais que esclareçam a população e assim, pretendem aumentar o número de crianças vacinadas.

Em Colombo, são cerca de 28 mil crianças de 5 a 11 anos e apenas 10.060 doses foram aplicadas.

Conscientização

A aposentada Mirian Diniz levou a neta Isabela, de 6 anos, para tomar a primeira dose da vacina infantil na quinta-feira (10).  Isabela estava preocupada com a vacinação. “Não estou muito empolgada não, eu to vendo muita criança saindo de lá chorando”, disse a pequena. Diferente da avó: “Estávamos aguardando a vacinação dela com muita ansiedade. Nós somos bem informadas, então sabemos da importância da vacinação”, afirmou Mirian.

Mirian Diniz e a neta Isabela Foto: Tami Taketani/Plural.

O engenheiro mecânico Marcelo Kasai (42) levou as filhas Maria Luiza, de 8 anos, e Natália, de 5 anos, para tomar a primeira dose de imunizante infantil. Marcelo conta que a desinformação espalhada pelas redes não afetou sua decisão de vacinar as filhas.

“É básico! Os números comprovam. Quando você está vacinado, está protegido. E até como cultura, desde criança, nós sempre tomamos as vacinas que precisavam. E como pais a nossa obrigação é essa, vacinar.”

Marcelo Kasai, engenheiro mecânico.
Marcelo Kasai e as filhas Maria Luiza e Natália Foto: Tami Taketani/Plural.

Para o construtor civil João Tavares de Amorim, 57 anos, a vacinação é imprescindível por motivos bem pessoais: João perdeu o filho de 36 anos, que não estava imunizado, para a Covid-19. “Meu parceiro, jogava bola comigo, tinha a saúde perfeita. Em um período de 10 dias ele foi internado, entubado e faleceu. Nós ficamos muito abalados”, revela o construtor. Na quinta-feira (10) pela manhã levou o filho mais novo, João Tavares de Amorim Neto, de 9 anos, para tomar a primeira dose da vacina.

“Nós estávamos numa expectativa muito grande, a vacina das crianças demorou muito para chegar. Mas graças a Deus hoje conseguimos vacinar ele. Eu noto que a interferência política atrapalhou muito nessa questão da vacinação, gerou muitas dúvidas na população brasileira. O importante é tomar a vacina e se conscientizar que sem ela, infelizmente teremos problemas.”

João tavares de Amorim, construtor.
João Tavares e o filho João Tavares Neto Foto: Tami Taketani/Plural.

O Paraná recebeu na quinta-feira (10) o quinto lote de imunizantes. Das 110 mil vacinas que chegaram ao estado, 65.900 doses serão distribuídas aos municípios para início do esquema vacinal em crianças de 5 a 11 anos, 28.400 doses para crianças de 6 a 11 anos, 792 para a primeira dose de adolescentes, 5.508 para a segunda dose de adolescentes e 10.056 para dose de reforço da população em geral. O Paraná já aplicou 20.733.508 vacinas contra a Covid-19.

Apesar da baixa adesão, o Paraná é o terceiro estado no país em número de crianças vacinadas. Foram 253.140 doses aplicadas, ficando atrás apenas de São Paulo e Minas Gerais. De acordo com o Ministério da Saúde, é esperado que 1,07 milhão de crianças sejam vacinadas no estado. Por enquanto, menos de um quarto do público foi imunizado.

Vacinação em Curitiba

Até quinta-feira (10), Curitiba havia vacinado 1.672.442 pessoas com a primeira dose ou a dose única (Janssen), o que corresponde a 85,8% de toda a população da cidade. Em relação à parcela completamente imunizada (com duas doses ou dose única), a cobertura chega a 77,6%.

Ao todo, foram aplicadas 3.844.560 unidades do imunizante, sendo 1.634.035 primeiras doses e 1.473.821 segundas doses; 38.407 doses únicas; 698.297 doses de reforço (3ª e 4ª doses).

Até o momento, a Secretaria de Saúde vacinou 125.469 adolescentes entre 12 e 17 anos. Destes, 97.636 já receberam também a segunda dose. Em relação às crianças de 5 a 11 anos, 82.054 delas receberam a primeira dose, enquanto quatro já completaram o esquema vacinal com a segunda dose (a primeira aplicação foi há mais de oito semanas, feita no exterior).

Nesta sexta-feira (11), Curitiba registrou 1.544 novos casos de Covid-19 e nove óbitos. São 13.393 casos ativos na cidade, o que corresponde ao número de pessoas com potencial de transmissão do vírus. Ao todo, a capital contabiliza 388.429 casos e 7.993 mortes provocadas pela doença.

Segundo a prefeitura, a taxa de ocupação dos 112 leitos de UTI SUS exclusivos para covid-19/SRAG está em 80%. Restam 22 leitos livres. Em relação aos 256 leitos de enfermarias SUS covid-19/SRAG, a taxa de ocupação está em 53% e há 121 leitos vagos.

Nesta sexta (11), dez leitos exclusivos UTI Covid-SRAG foram convertidos em leitos de UTI geral.

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