O STF é refém das Forças Armadas?

Ministros do Supremo dão a entender que não têm condições de votar livremente soltura de Lula

Nesta semana o Supremo Tribunal Federal iria fazer algo que já devia ter feito há mais de um ano. Julgar as ações que decidem se é ou não constitucional prender alguém apenas com a condenação em segunda instância. Na última hora, em um daqueles eventos esquisitos que têm acontecido em Brasília desde o início da Lava Jato, o julgamento foi suspenso.

A suspensão, em tese, aconteceu porque a OAB, autora de uma das ADCs que seriam julgadas, está sob novo comando e disse que ainda não teve tempo de estudar com calma o assunto. Dias Toffoli, que recebeu o pedido informalmente, suspendeu por tempo indeterminado não só a ADC da OAB como o julgamento inteiro.

Às vésperas da prisão de Lula, em 2018, Cármen Lúcia estranhamente também não colocou os recursos, que questionam o atual entendimento do Supremo, em julgamento. Preferiu, esquisitissimamente, colocar em pauta um recurso que tratava apenas do caso de Lula, para ver se o ex-presidente se encaixava ou não no que o tribunal já havia decidido.

Ora, isso não era o fundamental. Que Lula poderia ser preso dentro do entendimento atual era mais ou menos claro. O que se devia discutir é se o Supremo continua tendo esse entendimento.

Na ocasião, mesmo com a manobra de Cármen Lúcia, o julgamento do habeas corpus foi apertadíssimo, decidido por 6 a 5. E Rosa Weber disse com todas as letras que, se fosse votar a ADC, e não aquele caso, seu voto seria pela mudança de entendimento do STF. Ou seja: Lula não teria ido preso (nem todas as outras pessoas na mesma circunstância, efeitos colaterais da guerra em curso).

Agora, sendo mais ou menos previsível que o resultado seria a favor da libertação dos presos condenados sem trânsito em julgado (como manda a Constituição, de maneira bastante óbvia), Toffoli recebe um pedido informal e engaveta tudo. Como fez sua antecessora.

No dia anterior ao julgamento do HC de Lula, o comandante do Exército foi ao Twitter dizer que, a depender do que acontecesse no julgamento, coisas poderiam acontecer. Tudo de maneira nem tão críptica. Na sequência, vários generais disseram que estavam de espada na mão, cavalo encilhado, só esperando a ordem. Era claro: caso Lula ficasse solto, haveria um golpe de Estado.

Agora, de novo, poucos dias antes do julgamento Luís Roberto Barroso disse em um seminário que era previsível que, caso vote “contra as ruas”, o STF teria sua legitimidade questionada. Sabe a história do jipe com um soldado e um cabo? Parece que não era uma blague, e que não era só um jipe. E quem estaria dirigindo o veículo seriam generais.

O que se tem que discutir com urgência e seriedade é se o Supremo Tribunal Federal, guardião da Constituição, está neste momento refém das forças armadas e do governo federal, que usam as ruas como modo de pressionar para que a lei seja interpretada apenas de um jeito, do jeito que lhes interessa e interessa à Lava Jato.

As duas piores coisas que podem acontecer a uma democracia são uma ditadura dos juízes; ou uma ditadura que impede os juízes de agir como deveriam. O Brasil, por incrível que pareça, pode estar à beira das duas coisas, simultaneamente.

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