“Um cristão candidato a vereador que abriu mão do salário para doar às instituições filantrópicas. Até quando esperar?”. Essa é a autodescrição utilizada por Darlon Dutra (Mobiliza) em sua campanha rumo à Câmara Municipal de Foz do Iguaçu, no extremo Oeste do Paraná.
Bolsonarista, evangélico e com discurso anticorrupção, o candidato virtualmente abnegado é irmão de Andreia Dutra, lotada desde maio de 2023 como assessora parlamentar no gabinete do deputado estadual Matheus Vermelho (PP), com remuneração mensal bruta de R$ 13.796,78.
O Plural apurou após seis meses de investigação que Andreia atuaria como funcionária “fantasma”, sem prestar expediente na Assembleia Legislativa, ou tampouco qualquer serviço que justifique vínculo direto com o gabinete ao qual está contratada.
“Se você perguntasse se ele (Darlon) tem uma irmã, eu não saberia te dizer”, contou, sob a condição de anonimato, o assessor de comunicação de um órgão público de Foz do Iguaçu que tem relação direta com Matheus e Darlon.
A recepcionista do gabinete do parlamentar na Assembleia Legislativa, em Curitiba, disse ignorar o local de trabalho de Andreia, que é desconhecida da imprensa regional e do entorno político do próprio deputado. “Não, aqui não”, respondeu Roseane Brito, por telefone, em 16 de setembro, ao ser questionada se Andreia trabalha no local. Em seguida, ela disse não saber onde encontrar a funcionária.
No mesmo dia, o repórter José Marcos Lopes esteve pessoalmente no gabinete de Matheus Vermelho em busca de informações sobre o expediente da assessora. “Ela é do gabinete, mas lá de Foz. Ela fica lá, ela é da assessoria”, afirmou Marcelo Rosa, ao se apressar para responder o questionamento no lugar da recepcionista.
Conforme verificado pela reportagem, o deputado estadual não tem gabinete próprio em Foz do Iguaçu. Filho do deputado federal Vermelho (PL), Matheus utiliza o escritório do pai para desempenhar suas ações políticas no reduto eleitoral da família. Entre 11 e 25 de março, o parlamentar recebeu lideranças no local com vista à composição da chapa de vereadores que atualmente representa o PP no pleito municipal. À época, Matheus se colocava como pré-candidato a prefeito na cidade.
Em visita ao escritório ocupado pelo político e sua assessoria no dia 13, Andreia não estava presente. Entretanto, Darlon foi flagrado em ação como “social media” responsável pela divulgação das reuniões por meio das redes sociais do parlamentar.
Questionado sobre o motivo de filmar e fotografar a agenda de Mateus, o responsável pelo marketing digital dos Vermelho até antes do início destas eleições municipais respondeu: “Eu não trabalho aqui. Estou aqui por coincidência”. Em seguida, Darlon se apressou para deixar a recepção do escritório e permanecer em outra sala à portas fechadas com Matheus, que ignorou a solicitação de entrevista.
Diante da insistência sobre o paradeiro de Andreia e o exercício de suas atribuições no mandato, o recepcionista Athos Florencio, funcionário de Matheus Vermelho, tergiversou: “Veja, aqui é o gabinete do deputado federal Vermelho. Não do Matheus. Por isso a Andreia não trabalha aqui. Mande por email tudo que você precisa que iremos te responder”, esquivou.
Redes sociais
Antes de seguir a orientação do assessor recepcionista, a reportagem passou a monitorar diariamente as redes sociais de Matheus, Darlon e Andréia. O período de cobertura se deu entre 1 de março e a última quinta-feira (26). Única a manter seus perfis no Instagram e Facebook fechados para desconhecidos, Andreia continua sem responder à reportagem e tampouco compartilhar publicamente qualquer informação que relacione seu trabalho com o cargo ocupado.
Também sob a condição de anonimato, uma liderança partidária de Foz do Iguaçu, desafeto dos Vermelho, desafiou: “Pode procurar onde for. Enquanto assessora do Matheus, você não vai encontrar quem conheça a Andréia. Simplesmente porque ela não trabalha com o deputado. A Andreia está nomeada, mas quem presta o serviço sempre foi o irmão. Está tudo nas redes sociais deles”, garantiu o antigo aliado.
Por meio de nota, o deputado estadual Matheus Vermelho afirmou que a servidora realiza as atividades previstas na Lei Estadual 16552/2010, que regula os requisitos para escolha e nomeação dos servidores para cargos de provimento em comissão, dos quadros da Assembleia Legislativa.
“Neste sentido, é importante destacar que sua atuação profissional (Andreia) é itinerante, com abrangência em todo o Estado do Paraná. Logo, não há o que se falar em controle de jornada, exceto o controle máximo de 40 horas semanais, conforme preconiza a legislação, o que a servidora executa normalmente”, defendeu.
Segundo o Art. 15, § 3º da lei mencionada pelo deputado, servidores incumbidos de atividades de representação do parlamento fora das dependências da Assembleia devem apresentar relatórios mensais de atividades em formulário disponibilizado através do “Portal da Transparência”. A assessoria do deputado não apresentou tais documentos ou qualquer relatório neste sentido.
Em relação à atuação profissional de Darlon, a assessoria confirmou que ele desempenha funções de “social media” ao gabinete. “Sua contratação é feita através de uma empresa terceirizada que realiza o serviço para a atividade parlamentar. Seu trabalho é esporádico, pontual, sob demanda, e de acordo com a necessidade da atividade parlamentar”.
Social media candidato
Via Whatsapp, o Plural acionou Darlon para ouvi-lo sobre as atividades que desempenha para a família Vermelho e as evidências de que sua irmã seria funcionária “fantasma” no gabinete do deputado estadual. Antes mesmo que o assunto fosse devidamente apresentado, o social media desafiou: “Mete marcha. Nem precisa me avisar. Agora, se você escrever, terá que provar. Apenas isso. Siga seu trampo. Boa sorte”.
Em Foz do Iguaçu, desde fevereiro passado, além de atuar como social media dos Vermelho, Darlon faz campanha aberta a vereador com a promessa de que devolveria o salário caso eleito ao Legislativo Municipal. Registrada em cartório após oficializar sua candidatura, a promessa faz parte da plataforma “antissistema” propagada na internet por meio das páginas Paraná Pop, Foz é Assim e Foz 1000 Grau.
Juntos, os três perfis publicitários, utilizados para fins eleitorais, ultrapassam 1 milhão de contas únicas/mês. “O primeiro vereador da história de Foz a abrir mão do salário. Os R$16 mil reais serão devolvidos para a população iguaçuense”, anuncia. Crítico ao uso do fundo eleitoral, Darlon ainda não informou a origem do financiamento de sua candidatura.