Ataques de Bolsonaro a jornalistas preocupam

Tentativas presidenciais de desrespeitar profissionais, colocando-os como inimigos políticos, fere a liberdade de imprensa. Violência contra a categoria aumentou 36% no último ano

O boicote de empresários à Rede Globo, divulgado pelo Plural, teve o intuito de reforçar o apoio ao presidente Jair Bolsonaro, citado nas investigações da morte da vereadora Marielle Franco. Com isso, intensificaram-se os ataques à mídia e também a profissionais do jornalismo – violência que aumentou 36% no último ano. Os discursos recentes apenas reforçam os insultos frequentes do mandatário aos profissionais. As tentativas presidenciais de deslegitimar o trabalho dos jornalistas chegaram a 99 somente neste ano.

O levantamento foi realizado pela Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) e envolve – de 1 de janeiro a 31 de outubro – 88 ocorrências de descredibilização da imprensa e 11 de ataques diretos aos profissionais, colocando a categoria como adversária política.

Divulgado na véspera do Dia Internacional pelo Fim da Impunidade dos Crimes contra Jornalistas (2/11), o mapeamento teve como base todas as postagens de Bolsonaro no Twitter e no Facebook neste ano, além das transcrições dos discursos e entrevistas oficiais. Foram avaliadas, mês a mês, todas as ocasiões em que o presidente se refere a jornalistas, mídia, imprensa e produção de notícias.

A Fenaj destaca que quando autoridades públicas usam de sua visibilidade para colocar jornalistas ou a imprensa como oponentes políticos, abre-se espaço para ataques às liberdades de imprensa e de expressão, essencial para a manutenção de um espaço público democrático. “A Fenaj e todas as instituições que prezam pela democracia não podem aceitar a institucionalização da violência contra jornalistas e das ameaças à liberdade de imprensa como prática de um governo”, afirma a presidente da entidade, Maria José Braga.

Ocorrências

Os ataques do presidente começaram dois dias depois da posse (3/01), via conta pessoal no Twitter, quando ele afirmou que um de seus ministros fala o que “parte da grande imprensa omite”.

De janeiro a junho, foram entre duas e 12 declarações por mês contra jornalistas e o jornalismo, contudo, houve um aumento significativo nos meses de julho e agosto, totalizando 39 registros. Em setembro, foram oito, cinco durante seu discurso na 74ª Assembleia Geral das Nações Unidas (24/09), diante de chefes de Estado de todo o mundo.

A forma como o presidente se refere ao trabalho dos jornalistas e à publicação de conteúdo informativo pela imprensa contém expressões com questionamento da veracidade, atribuindo às instituições o papel de adversárias, conclama para que a população não acredite nas notícias, ataca os profissionais chamando-os de “idiota”, afirmando que cometem “excessos”. Bolsonaro também afirma reiteradas vezes que a imprensa “esculacha”, “massacra”, “acusa”, “está na oposição”, “que tem lado”, “presta desserviço”, que “publica mentiras”.

No dia 13 de setembro, ele chegou a afirmar, em sua conta no Twitter, que a imprensa é inimiga: “Nossa inimiga: parte da grande imprensa. Ela não nos deixará em paz. Se acreditarmos nela será o fim de todos”.  

No mês de outubro, foram 13 ocorrências. O episódio da “live” (30/10) aparece somente uma vez na contagem, ainda que o presidente tenha proferido diversos ataques nos 20 minutos de vídeo, pois na base de dados elencada pela Fenaj não são analisadas declarações do presidente que não estejam transcritas de forma oficial.

“Nesse mapeamento, que produzimos de forma a seguir uma metodologia de busca e de categorização para visibilizar esses ataques à nossa profissão por parte do presidente, entendemos que é uma postura deliberada de Jair Bolsonaro colocar profissionais jornalistas como inimigos e a imprensa, de uma maneira geral, como sem credibilidade para apurar, produzir e publicar informações. Enquanto entidade de defesa dos trabalhadores jornalistas, vamos expor essa postura institucionalizada”, ressalta Paula Zarth Padilha, diretora da Fenaj.

Ataques a jornalistas

A contaminação do ambiente democrático pelo acirramento das disputas políticas tem feito aumentar os episódios de violência. O Relatório de Violência Contra Jornalistas e a Liberdade de Imprensa no Brasil, da Fenaj, aponta que em 2018 o número de agressões a jornalistas chegou a 135 casos, contra 227 jornalistas, um aumento de 36% nos casos de violência contra os profissionais, em relação ao ano anterior. Em 22% das violências no último ano, os autores de violência foram manifestantes ou eleitores.

“Percebemos que o discurso que coloca jornalistas como adversários tem impacto na segurança de todos os profissionais, seja na cobertura de assuntos do dia-a-dia, quando estão sujeitos a intimidações e a violência física, seja no ambiente digital, quando jornalistas têm seus perfis nas redes sociais expostos e começam a sofrer diversos ataques, xingamentos, ameaças e exposição de informações pessoais, como endereço residencial e fotos da família. Não são poucos os casos de jornalistas que tiveram que fechar suas contas em redes sociais por causa de ameaças”, alerta Márcio Garoni, diretor da Fenaj.

A pressão no ambiente de trabalho foi colocada como um dos problemas principais enfrentados pelos jornalistas do Paraná, em recente questionário aplicado pelo Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Paraná (Sindijor-PR) e pela Universidade Federal do Paraná (UFPR), que disponibilizam tratamento psicológico gratuito aos profissionais.

*Com informações da Fenaj

Sobre o/a autor/a

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

O Plural se reserva o direito de não publicar comentários de baixo calão, que agridam a honra das pessoas ou que não respeitem níveis mínimos de civilidade. Os comentários são moderados por pessoas e não são publicados imediatamente.

Rolar para cima