31 de março é um dia esquisito

A data já serviu para lembrar Anne Frank, uma lembrança de que ditaduras não devem ser lembradas nem por lunáticos

Até 2015 o dia 31 de março foi lembrado pelo seu forte simbolismo: era o dia oficial da morte de Anne Frank. Assim como milhares de outros prisioneiros, ela morreu no campo de concentração de Bergen-Belsen, na Alemanha nazista, em 1945. Há quatro anos, no entanto, pesquisadores concluíram que a autora do famoso livro O Diário de Anne Frank morreu um mês antes, em fevereiro, aos 15 anos de idade. A causa é tifo, mas o motivo é por ser judia.

Em junho desse ano Frank faria 90 anos. Em setembro, a Segunda Guerra Mundial completa 80. Se o nazismo tivesse matado somente Anne Frank, ainda assim seria um crime imperdoável contra a Humanidade. A garota era promissora –falava quatro línguas e já tinha lido a biografia de Galileu Galilei- e seu diário devia ser leitura obrigatória em todas as escolas, especialmente nesses tempos sombrios de revisionismo histórico, onde pessoas pretendem bater palmas e assoprar velinhas para regimes ditatoriais que torturaram e mataram pessoas.

Durante dois anos, enquanto esteve escondida com familiares e amigos no “anexo secreto”, um sótão com passagem vedada por uma estante falsa de livros, em um prédio de Amsterdã, ela manteve um diário contando os dias que passou enclausurada, o pânico de ser capturada pela polícia, os conflitos e a escassez de comida, o desejo de ter um dia de liberdade para respirar ar puro e tomar sol, o florescimento de um amor adolescente quase proibido. E, apesar das perspectivas sombrias, ela ainda era capaz de sonhar em ter algo parecido com uma vida novamente.

Não deu tempo. Em uma trágica manhã de agosto de 1944, um telefonema dedurou o esconderijo dos Frank. Oficiais nazistas prenderam todos e os enviaram de trem, numa viagem que durou três dias, para Auschwitz e posteriormente Bergen Belsen. Apenas o pai, Otto Frank, sobreviveu. Quando voltou para Amsterdã, uma das mulheres que ajudou a esconder a família lhe entregou o caderno de Anne, que havia encontrado no anexo secreto. O caderno tornou-se o famoso O Diário de Anne Frank.

Bergen Belsen

Se tiver coragem de saber como era Bergen Belsen, assista Campos de Concentração Nazistas, no Netflix. É uma compilação de filmes curtos feitos por fotógrafos e cinegrafistas das forças aliadas, que registram os campos de concentração alemães recém-descobertos, e o estado deplorável em que se encontravam os sobreviventes.

Corpos cadavéricos empilhados por todo lado, corpos jogados em valas comuns, corpos doentes ou mutilados, corpos incinerados em fornos, corpos mumificados, corpos semimortos sendo alimentados e tratados das epidemias que vitimaram centenas de milhares de prisioneiros. O verdadeiro horror em estado bruto. Em um dos trechos mais perturbadores, é mostrado o infame abajur feito de pele humana, encomendado pela esposa de um oficial da SS.

Campos de Concentração Nazistas é documento essencial para nos lembrar que regimes ditatoriais escondem pilhas de cadáveres nas sombras de seus heróis e não merecem ser celebrados nem pelo mais lunático dos seres vivos. O último dos campos de concentração mostrados no filme é Bergen-Belsen. O destino final de Anne Frank.

Desde que a data oficial da morte de Anne Frank foi alterada, o dia 31 de março pode ser lembrado por outros acontecimentos, como o dia da inauguração da Torre Eiffel, o aniversário do guitarrista Angus Young, do AC/DC ou, melhor ainda, o Dia Mundial do Backup.

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