A guerra declarada pelo presidente russo Vladimir Putin contra a Ucrânia desencadeou imediatamente fortes ondas de pressão no mundo. O Brasil, que agora começa a acolher parte dos refugiados da crise humanitária, também busca alternativas para driblar os impactos econômicos provocados pelo conflito, prestes a completar um mês. Uma das pontas soltas rebate contra o agronegócio. Responsável por cerca de um terço do PIB paranaense, o setor vê com preocupação a quebra no fluxo de abastecimento de fertilizantes, nutrido sobretudo pela Rússia.
O mesmo desafio que colocou, por um lado, a dependência externa do país no centro dos debates, ajudou, por outro, a alavancar os trabalhos de uma empresa curitibana voltada à facilitação do comércio de insumos.
Lançada no mercado em abril de 2021, a plataforma batizada de Insumo Agrícola conecta fabricantes, revendedores e produtores em torno da compra e venda de fertilizantes. O modelo funciona em duas frentes distintas. Uma apenas como um suporte de vínculo entre clientes e revendedores. Já o projeto mais recente adota estratégias do modelo “B2B” [business to business], com a migração da própria empresa ao centro da logística para se encarregar das operações.
O conceito fez as barreiras do negócio expandirem ainda para serviços de frete e crédito, dando mais garantias e facilidades aos compradores em potencial.
Pesquisa do sistema Faep/Senar-PR mostra que, somente em 2021, os fertilizantes da Rússia corresponderam a 20% do adubo comprado por produtores rurais de todo o Paraná. Embora o Brasil não tenha adotado medidas de embargo contra o Kremlin, a entidade alerta para o risco de a restrição da movimentação financeira imposta contra o governo russo por diferentes países e de possíveis rupturas na dinâmica do transporte de carga darem ainda mais corpo à crise de fertilizantes, em curso antes mesmo da guerra.
“A China já vinha diminuindo suas exportações para focar no mercado interno. Tinha ainda a falta de contêineres, e os preços estavam subindo. Ou seja, eram potenciais clientes e revendedores sem estoque porque quem estava com o produto na mão era quem estava mandando no mercado”, explica o CEO Luca Lachica, referindo-se ao cenário de expansão da Insumo Agrícola.
Na hora em que cedeu a conversa ao Plural, na última sexta-feira (18), Lachica contabilizava 117 pedidos em tempo real. Em 2021, foram mais de R$ 35 milhões movimentados pela plataforma, que agora também incorpora ofertas de químicos e sementes para o setor.
Expansão
O crescimento da Insumo Agrícola acontece em paralelo ao endosso das discussões voltadas ao fortalecimento da produção interna de insumos essenciais ao agronegócio. Há expectativa de que até 2024 a produção de fertilizantes com selo brasileiro cresça 35%. A expansão, segundo o Sindicato Nacional da Indústria de Matérias-Primas de Fertilizantes, reduziria em 10% a dependência externa e acarretaria investimentos de até R$ 20 bilhões.
O movimento é importante para o Paraná, estado onde o agronegócio tem posição de destaque.
Em reunião com representes do setor no último dia 10, o próprio governo do estado disse estar acompanhando os impactos da guerra na Ucrânia nas taxas de juros, na desvalorização do câmbio e falta de insumos – todas de grande peso para o trabalho no campo.
A escassez de fertilizantes, especificamente, tende a refletir a longo prazo, mesmo que o fornecimento venha a ser solucionado em breve, o que ainda não tem respaldo. De acordo com o sistema Faep/Senar de São Paulo, a falta de insumos já prejudica a programação das safras previstas para os próximos ciclos sazonais. “Para o próximo ciclo de soja, por exemplo, em setembro/outubro, o produtor não sabe como ficará a situação”, alertou a entidade nesta segunda-feira (21).
Dessa forma, a insegurança dá mais força para negócios que hoje atuam com produtos essenciais para este mercado. No caso da Insumo Agrícola, o CEO da empresa afirma que a vantagem de trabalhar com fornecedores fixos tem conseguido garantir a oferta aos clientes
“Até hoje, mesmo com toda essa crise, não teve nenhum cliente para o qual não mandamos produtos. Se tem proposta é porque tem produto em estoque, e a gama de fornecedores que temos facilita. Temos alguns parceiros de porte muito grande”, diz Lachica.
Para 2022, a empresa estima um faturamento de R$ 600 mil. Hoje, já estão cadastrados na plataforma mais de 1.200 produtores, 50 revendedores e sete fabricantes.