Política, feminismo e maternidade: Bruna Alcantara faz primeira exposição individual em Curitiba

“Estou usando meu corpo para contar a história de muitas mulheres”

Com cerca de dez anos de dedicação à arte, a jornalista e artista visual Bruna Alcantara expõe pela primeira vez, de forma individual, em Curitiba, cidade onde mora desde os 17 anos.

A mostra começa neste sábado, 11, às 14h, na Alfaiataria Espaço de Artes e fica aberta ao público até 11 de outubro, de terça a sexta, das 14h às 18h.

Com pautas políticas, feministas, sociais, sobre igualdade de gênero, maternidade e que também abordam o corpo da mulher, Bruna Alcantara tem ganhado cada vez mais notoriedade pelo amadurecimento artístico, pelas reflexões e críticas sociais seguras que propõe. Já expôs as obras em Portugal, no Líbano (Beirute), Egito (Cairo) e em diferentes locais do Brasil como São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte.

A exposição, intitulada “Derivações Para Uma Mártir”, que em 2019 esteve em São Paulo, num projeto da Secretaria Municipal de Cultura da capital paulista, reúne cerca de 40 obras dos primeiros cinco anos de trabalho, desde a época em que morou na cidade do Porto, em Portugal, até o retorno ao Brasil. As intervenções podem ser vistas de diferentes formas como bordado, fotografia, colagem e lambe-lambe, sempre propondo uma provocação sobre a mulher contemporânea e que vai além do ponto de vista estético, como observa a curadora da mostra, Michele Micheletto.

“O nome da exposição vem de uma alusão à vida da mulher contemporânea. Tanto nas questões reprodutivas, de gerar a vida e de cuidados da família, quanto na questão de enfrentar suas jornadas contínuas de trabalho, dentro e fora de casa. Problemas de desigualdades de gênero, de salários, de jornadas, de comportamentos esperados e pautados numa cultura machista, que fazem da vida das mulheres contemporâneas verdadeiras batalhas. Nesse sentido, enfrentar essas derivações sociais e culturais, é formar uma mártir”, diz.

Processo de criação

Tanto em Portugal quanto no Brasil, fotografias antigas de pessoas desconhecidas estão presentes na arte proposta. A busca por estas histórias é feita principalmente em sebos. A partir do olhar, cada personagem é escolhido e as histórias são recriadas.

As primeiras obras trazem questões pessoais da artista, como a maternidade. Assim, apostou em autorretratos para expressar sentimentos compartilhados por tantas mulheres. Este processo espontâneo é o caminho de Bruna Alcantara para os trabalhos íntimos e para os que são mais políticos que acabam pautados por fatos do país e do mundo, como a atual situação do Afeganistão, que voltou a ser comandado pelo Talibã e coloca em cheque diversos avanços no que diz respeito às conquistas das mulheres.

Obra da artista Bruna Alcantara

“É 2021 e o movimento feminista reacende a importância de nós falarmos por nós mesmas. Dentro disso, assuntos como maternidade, o direito dos nossos filhos, a liberdade dos nossos corpos políticos, o nosso próprio direito ao espaço público e às cidades, estão gerando discussão. E meu trabalho é também sobre isso: sobre a necessidade de contar a minha história, que é a mesma história de milhões de outras mulheres. Estou usando meu corpo para contar a história de muitas mulheres”, diz.

A curadora Michele Micheletto reforça o potencial deste trabalho que consegue abordar temas tão complexos de uma forma potente e que, de uma maneira ou de outra, conversa com diversos públicos.

“Com as críticas feitas através da sua costura nas fotos antigas, bordando palavras em linha vermelha, ela aborda temas complexos, deixando-os de fácil entendimento, por vezes num tom de ‘memes’. Fotos cortadas, coladas, suturadas, passando as mensagens de maneira simples e potentes, é impossível passar por um trabalho dela e não pensar a respeito, trazendo questionamentos fundamentais nos nossos tempos”, explica.

Além das intervenções em fotografias – que estarão expostas para o público – quem anda pelas ruas de Curitiba pode encontrar os trabalhos de Bruna espalhados em forma de lambe, técnica que ela usa para alcançar o público e estabelecer um diálogo por meio da arte.

A artista

Bruna Alcantara nasceu em Jacarezinho, no interior do Paraná. Desde a infância teve a arte muito presente na vida, já que os avós sempre trabalharam com teatro. Além disso, gostava de desenhar, fez aulas de pintura e aprendeu a bordar com a mãe. Porém, foi com o jornalismo que descobriu a paixão pela fotografia e a possibilidade de fazer arte.

O bordado retornou de forma intensa quando a artista foi embora para Portugal cursar um mestrado. Sozinha e grávida em outro país, Bruna encontrou nas agulhas uma lembrança afetiva e um consolo para os momentos de solidão.

“Assim nasceu a série de autorretratos de gravidez e pós-parto, que eu e o Tom, meu filho, fazemos até hoje – e ele já tem 6 anos”, explica Bruna.

A união de fotografia e bordado não foi algo pensado, apenas aconteceu e ganhou forma com o tempo para abordar questões feministas e sociais históricas e do dia a dia.

“Quando comecei a imprimir as fotos em preto e branco, eu senti que faltava algo que não era propriamente a cor da imagem fotográfica. Faltava mais sentimento naquilo, por isso comecei a bordar por cima das fotografias e a fazer colagens. E depois disso eu passei a bordar tudo: cinta pós-parto, sutiã de amamentação, por exemplo. Agora, com um processo artístico desenvolvido, posso dizer que tenho muitas referências estéticas que me levam a fazer meu trabalho como ele é”, avalia a artista.

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