Projeto Novas Clarices lê e entrevista mulheres da nova geração de escritoras brasileiras

No Instagram, a curitibana Rafaela Riera escreve resenhas curtas e realiza bate-papos com autoras importantes como Carol Bensimon e Daniela Arbex

Tempos atrás, em conversas com amigas, a publicitária Rafaela Riera costumava recomendar dois livros de que gostou muito: “Assim na terra como embaixo da terra”, da Ana Paula Maia, e “O peso do pássaro morto”, da Aline Bei. E sempre chamava sua atenção o fato de ninguém conhecer nem os livros, nem as autoras.

Então ela se deu conta de que, ao menos do seu círculo de convívio, “a única escritora brasileira realmente conhecida era a Clarice Lispector”. Não demorou muito para ela partir dessa constatação para criar o perfil Novas Clarices, no Instagram. A primeira postagem foi no dia 5 de junho de 2019 – pouco mais de um ano atrás.

“Sempre fui a chata que fica indicando livros para os amigos”, diz Riera. Agora, ela indica livros para todo mundo.

No projeto Novas Clarices, ela escreve resenhas breves dos livro que lê, como se estivesse batendo um papo. Sobre “Cova 312”, de Daniela Arbex: “Gente do céu, que livro é esse? De verdade, eu acho muito difícil gostar de todos os trabalhos de alguém, mas esse é o caso aqui”.

E ela também entrevista escritoras. Em um curto período de tempo, já conversou com Carola Saavedra (“Toda terça”), Carol Bensimon (“Clube dos jardineiros de fumaça”) Luísa Geisler (“Quiçá”) e várias outras.

Na entrevista a seguir, a curitibana que vive em São Paulo (SP) fala sobre mulheres e literatura: “O Brasil tem uma safra talentosíssima de escritoras contemporâneas. Achei que eu precisava mostrar isso, precisava ajudar a dar voz a essas mulheres”.

Vi que você escreve resenhas breves, um formato que acho muito atraente. Quando você se dispõe a escrever sobre um livro de que gosta, como faz para manter o texto enxuto? Qual é tua lógica ao falar de um livro?

Eu gosto de pensar as minhas resenhas como se estivesse indicando um livro para um amigo ou amiga. É mais do que uma resenha, é uma conversa. E uma conversa não pode ser um monólogo. É preciso falar de forma direta o que fez esse livro mexer com você, é uma opinião pessoal mesmo. Não sou uma especialista. Sou uma pessoa que ama livros e lê livros, indicando para outra, de um jeito leve e amigável.

Em um tempo relativamente pequeno, você conseguiu entrevistar várias escritoras importantes. Poderia citar uma entrevista que te deixou particularmente feliz?

É claro que todas elas me deixaram extremamente feliz. Cada conversa é uma aula sobre diversos assuntos. Carreira, livros, papel da mulher na literatura, processos de escrita, maternidade, publicação e tantos outros assuntos que surgem em cada uma das conversas. Aliás, essas aulas até começam antes, porque assim que marco a entrevista com a escritora, eu estudo muito sobre ela. Vou atrás de todos os livros, leio e assisto a entrevistas, porque isso é uma forma de valorizar o tempo que ela está dando para mim. Das entrevistas até aqui, posso destacar duas em especial. Com a Daniela Arbex fiquei muito emocionada porque li seu primeiro livro há muitos anos, no começo da faculdade, então é uma escritora que é uma paixão antiga. E ela é uma mulher que luta para trazer vozes silenciadas para o conhecimento das pessoas e isso é muito importante, sou fã dela. Na conversa com a Aline Bei, além de gerar um debate muito bom, foi incrível porque o livro dela foi um dos responsáveis por fazer o Novas Clarices existir. Mas toda vez que uma escritora topa uma conversa é uma alegria muito grande. E é incrível como todas elas são acessíveis e dispostas a debater a literatura, sempre com muita simpatia. O que me ajudou a entender que elas são pessoas, tirar essa imagem endeusada do escritor que a gente cria na nossa cabeça.

E uma entrevista que foi particularmente difícil de fazer?

Talvez a primeira. Porque antes disso eu nunca mostrava o rosto. Só tinha uma foto minha em uma das postagens, mas eu nunca havida falado olhando para a câmera. Esse “falar com a câmera” precisou de um tempo para virar realidade. Além disso, na primeira entrevista, por mais que você tenha as perguntas, por mais que você saiba como mexer no aplicativo, tudo é uma surpresa, gera ansiedade e medo.

Acho que foi a Aline Bei que disse que o Brasil tem muitos leitores em potencial, que muita gente se interessa por livros e só precisa de um empurrãozinho. Qual é sua opinião sobre isso?

Eu concordo com ela. E mais do que um empurrãozinho, precisa encontrar o tipo de leitura que gosta. Tem uma coisa que eu acho terrível que é alguém falar que um tipo de leitura não é adequado. “Ai, sério que você lê o escritor Y, isso não é literatura!” ou “Ah, romances água com açúcar? Por que não lê algo de verdade?” Ao envergonhar alguém pelo que lê, você faz ela se sentir mal em estar lendo e até a desistir da leitura. Um livro sempre vai levar ao outro, ninguém já abre de primeira um Tolstói, o leitor se constrói aos poucos. Por isso, a leitura, não importa qual seja, deve ser incentivada, porque acima de tudo, ela tem que ser prazerosa. A experiência da leitura, especialmente nas escolas, não pode ser traumática. A falta de leitura nos leva a muitos problemas, o principal deles – e que me assusta muito ao ver por aí – é a falta de interpretação de texto. Ler é essencial para criar esse questionamento, esse entendimento além do que está escrito.

Na web

Confira o perfil Novas Clarices no Instagram.

Sobre o/a autor/a

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

O Plural se reserva o direito de não publicar comentários de baixo calão, que agridam a honra das pessoas ou que não respeitem níveis mínimos de civilidade. Os comentários são moderados por pessoas e não são publicados imediatamente.

Rolar para cima