“Matrix Resurrections” é uma reflexão sobre entretenimento e arte

Matrix Resurrections é um interessante retorno ao clássico e tem entretenimento e reflexão em igual medida

Em 1999, as irmãs Lana e Lilly Wachowski revolucionaram a ficção científica com Matrix, obra de vasta influência que propunha um universo dominado por máquinas que mantinham os seres humanos em um estado de animação suspensa, com suas mentes plugadas em uma simulação da realidade enquanto seus corpos eram usados como fonte de energia. Uma profecia versava sobre a chegada do Escolhido, alguém com poderes extraordinários, capaz de subjugar as máquinas e libertar a humanidade. Matrix trouxe uma variedade de reflexões sobre a realidade, simulação e simulacro, a natureza do livre arbítrio, os perigos que as novas corridas tecnológica e armamentista poderiam representar, além de poder ser interpretado como uma contemplação da jornada pessoal das irmãs Wachowski, ambas mulheres trans que, à época, ainda não haviam passado pelo processo de transição. A filosofia de Neo (Keanu Reeves) aliada às suas habilidades nas artes marciais garantiu mais duas excursões às telonas, com um capítulo final em 2003 com Matrix Revolutions. Então vieram os anos 2020, com suas pandemias, suas nostalgias e suas propriedade intelectuais bilionárias, e o Escolhido foi novamente convocado a salvar o mundo e a margem de lucro da Warner Bros. Pictures.

Com direção de Lana Wachowski, que assina o roteiro ao lado de David Mitchell e Aleksandar Hemon, Matrix Resurrections encontra Neo como o desenvolvedor de games Thomas Anderson, criador da franquia Matrix. Enquanto busca uma história para a sequência de seu jogo, Anderson descobre que vive aprisionado na realidade que acreditava ter criado. Para entender como voltou a integrar a Matrix e reencontrar sua amada Trinity (Carrie-Anne Moss), Neo precisa confiar em Morpheus (Yahya Abdul-Mateen II) e escapar do perigoso Smith (Jonathan Groff).

Em Matrix Resurrections, Lana Wachowski faz uma reflexão sobre o atual estado do entretenimento e da arte, sem abster-se de seu próprio papel nesta construção. O primeiro ato do filme se dedica à uma bem-humorada, mas incisiva, crítica sobre a indústria bilionária das propriedades intelectuais transformadas em franquias que domina Hollywood. Nada se perde, tudo se adapta e ganha sequências, e o roteiro de Resurrections é autoconsciente. As críticas não poupam sequer o estúdio que produziu Matrix e suas continuações: a Warner Bros. é citada por nome como uma companhia que, independentemente do envolvimento dos criadores, encontraria uma forma de trazer Matrix de volta à vida. Num momento em que Homem-Aranha: Sem Volta Para Casa conquista números pré-pandemicos em bilheteria e esmaga a competição, Resurrections é uma bem-vinda contemplação sobre o contexto histórico destas produções.

Para além de seu discurso, Resurrections constantemente trabalha com referências do primeiro capítulo de sua franquia, demonstrando que não está acima de se utilizar da nostalgia contemporânea que inunda o cinema. Wachowski encontrou uma interessante solução para voltar a este universo, mas se apoia com frequência na iconografia já estabelecida para contar sua nova história. A diretora utiliza excertos dos filmes anteriores, recria sequências icônicas e até transforma elementos de Matrix em piadas para o espectador mais atento.

Keanu Reeves retorna à pele de Anderson/Neo com a facilidade de alguém que conhece o personagem e entende sua jornada aqui, com a vantagem de proporcionar sequências de ação que poucos atores ainda conseguem executar. O Morpheus de Yahya Abdul-Mateen II é um deleite tanto por seu estilo, quanto por sua presença. Jonathan Groff é uma excelente nova versão do agente Smith, envolto em uma aura de perigo e desdém a cada aparição na tela.

Com 2h23 de duração, Matrix Resurrections é um interessante retorno ao clássico e, como aquele, proporciona entretenimento e reflexão em igual medida.

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