Travis Stubbs era alcoólatra. Grávida, Krystal Stubbs, sua esposa, decidiu dar a ele um ultimato: ou ele encontra um caminho na vida e consegue prover para a família, ou ela e a criança iriam embora. Foi quando ele encontrou a salvação: criar seu próprio negócio e investir na chance de se tornar um milionário.
Stubbs vira a estrela da equipe de vendedores de Cody Bonar, seu melhor amigo. Todo dia, depois do trabalho numa seguradora, ele pega o carro e vai cada vez mais longe para recrutar novos vendedores para a Founders American Merchandise (FAM), cujos produtos cobrem todos os itens de uso doméstico, do banheiro até a cozinha.
O que o mantém empolgado e focado (e longe do álcool) são as fitas inspiradoras de Obie Garbeau II, o multimilionário líder dos representantes da FAM na Flórida e o sonho de ser um Washington, o topo da cadeia alimentar da empresa. Para tanto, precisa recrutar 50 representantes que vão trabalhar abaixo dele.
Se o esquema da FAM parece familiar, é porque é familiar. A série “Como se tornar uma divindade na Flórida”, em cartaz na Globoplay, apresenta Kirsten Dunst como Krystal Stubbs e a FAM claramente inspirada em empresas como Amway e a febre dos esquemas de pirâmide nos EUA dos anos 1990. Além de Dunst, a série conta também com a cantora Beth Ditto no papel da esposa do chefe de Krystal.
Logo no primeiro dos dez episódios, Travis larga o emprego para se dedicar só a FAM, mas acaba enfiando o carro num pântano e é comido por um crocodilo. Viúva, Krystal descobre que não só a situação financeira da família é grave, como a extensão com a qual Travis investiu na FAM, comprando e estocando produtos, é ainda maior do que ela imaginava.
As cenas de garagens cheias de caixa lembram muito outras similares em “Betting on Zero”, documentário sobre a Herbalife (que esteve em cartaz na Netflix, mas hoje não está disponível em nenhum serviço de streaming no Brasil).
Mas “Como se tornar uma divindade na Flórida” não é sobre desvendar grandes esquemas de enriquecimento. Como Krystal, Dunst não está interessada em ser uma Washington nem em denunciar fraudes. As preocupações dela são mais mundanas: garantir teto e comida para a filha bebê, Destinee.
É para isso que ela, por um lado, se torna uma representante FAM no lugar do marido, mas por outro continua à procura de sobrevivência fora desse mundo.
Mas não espere uma série dramática. O tom é de humor negro que usa e abusa do ridículo (não só da estética típica dos anos 1990) das convenções da FAM, do discurso sacerdotal do líder e da fé inabalável de Cody Bonar nas palavras de Obie Garbeau II.
E, é claro, a série se ambienta na Flórida, mais precisamente nos arredores de Orlando, com toda aquela estética kitsch típica da região. Em uma cena clássica, um Washington reúne coragem para perguntar a Obie por que, apesar de ter chegado ao topo, não está ganhando “seis dígitos” por mês, como o esperado. E recebe como resposta que ele está vivendo como um Washington Ouro, mas só é Washington Prata.
Independente de cutucar não só as promessas vazias do marketing multinível, mas o próprio discurso econômico/religioso de que só é rico quem se esforça para tanto, “Como se tornar uma divindade na Flórida” é divertidíssima.
O único problema é acabar rápido. Mas a segunda temporada já foi confirmada, muito embora a estreia, prevista para o ano que vem, ainda não tenha data certa.
Streaming
“Como se tornar uma divindade na Flórida” está em cartaz na Globoplay.