Em “Deserto Particular”, identidade e pertencimentos são questionados

Filme de Aly Muritiba indicado para representar op Brasil no Oscar estreia nos cinemas

Em tempos em que o cinema nacional sofre com a falta de incentivos, Deserto Particular demonstra o potencial da indústria brasileira para o mundo. O filme recebeu o prêmio do público do Festival de Veneza e o Premio Camilo (conferido ao melhor longa-metragem com temática LGBTQ), no Festival de Huelva – Cine Iberoamericano. Também foi escolhido como Melhor Filme Internacional no TLVFest 2021 (The Tel Aviv Internacional LGBTQ Film Festival) e ainda está longe de encerrar sua carreira internacional. Depois de rodar o mundo, Deserto Particular estreou no Brasil nesta semana, em um circuito limitado que inclui Curitiba, cidade que serviu de cenário para o filme.

Com direção de Aly Muritiba, que assina o roteiro ao lado de Henrique dos Santos, Deserto Particular acompanha o policial militar Daniel (Antonio Saboia), que, após se envolver em um caso isolado de violência excessiva, é afastado de suas funções. Enquanto aguarda uma decisão sobre seu futuro na corporação, Daniel conhece Sara (Pedro Fasanaro), com quem mantém um relacionamento virtual. Quando ela deixa de responder suas mensagens sem nenhuma justificativa, Daniel decide partir à sua procura no outro extremo no Brasil.

Com duas horas de duração, Deserto Particular dedica seu tempo de projeção ao estudo da natureza de Daniel e Sara. Dividido entre a violência inerente à sua identidade e uma sensibilidade que frequentemente transpassa sua fachada sisuda, Daniel vive uma crise interna quando descobre que sua amada Sara também atende pelo nome de Robson. A heterossexualidade faz parte da composição de sua masculinidade e, quando isso entra em questão, sua própria identidade ameaça entrar em colapso.

Cena de Deserto Particular. Foto: Divulgação

Já Sara é segura com sua identidade e, mesmo quando se apresenta como Robson, ela mantém sua personalidade. A chegada de Daniel provoca uma reviravolta em sua vida, mas está se dá no campo do pertencimento. Residente de uma cidade pequena em que todo mundo conhece todo mundo e ninguém aprecia o diferente, Sara não questiona quem é, mas passa a refletir sobre seu lugar no mundo. Ela almeja acolhimento completo, que não esteja atrelado à forma como se apresenta ou se veste. Do encontro entre Daniel e Sara nasce um conflito que evolui para tolerância e, finalmente, para aceitação.

Para além do roteiro e das sensíveis atuações dos dois protagonistas, Deserto Particular conta com uma bela direção de fotografia assinada por Luis Armando Artega, cujas composições oferecem um espetáculo visual à parte das ruas de Curitiba e do sertão da Bahia.

Com uma trajetória estelar que pode culminar em uma indicação ao Oscar de Melhor Filme Internacional, Deserto Particular é um testemunho do talento encontrado no cinema local e vista obrigatória para os apreciadores desta arte.

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