Cine Passeio exibe “Flee”, documentário de animação sobre um refugiado na Dinamarca

“Flee” fez história no Oscar 2022 ao disputar as categorias de animação, documentário e filme estrangeiro

Durante o Oscar 2022, na apresentação do prêmio de animação, vencido por “Encanto”, três atrizes que interpretam princesas da Disney subiram ao palco para falar dos filmes de animação como algo para crianças. Só que, entre os cinco concorrentes, um deles não cabia nessa ideia de “algo para crianças”: “Flee – Nenhum lugar para chamar de lar”, de Jonas Poher Rasmussen, um documentário sobre um refugiado afegão na Dinamarca.

O filme fez história na premiação mesmo sem levar nenhuma estatueta para casa. Isso porque se tornou a primeira obra a disputar as categorias de animação, documentário e filme estrangeiro.

Cine Passeio

Depois de ter sido exibido no Festival É Tudo Verdade do ano passado, a produção finalmente estreia nos cinemas brasileiros nesta quinta-feira (21). Em Curitiba, o Cine Passeio exibe “Flee” numa sessão diária, às 18h10.

“Para muita gente, é difícil aceitar que a animação pode ser um meio para adultos também”, disse Rasmussen em entrevista ao Estadão, por videoconferência.

Além disso, o uso da animação faz muito sentido em “Flee”. Rasmussen conheceu o personagem do filme quando ambos ainda eram adolescentes, em uma vila na Dinamarca.

Amin, seu nome fictício no filme, era diferente. “Fiquei curioso porque, na falta de uma palavra melhor, ele era exótico”, disse Rasmussen. Ficaram amigos. Sempre existiu, porém, um muro entre eles: o segredo sobre o percurso de Amin do Afeganistão até ali.

Quando estava trabalhando em rádio, Rasmussen tentou convencer Amin a contar sua história. “Ele me disse que não estava pronto”, disse o diretor. “E que, quando estivesse, compartilharia comigo.”

Documentário animado

Nesse meio tempo, Rasmussen fez um workshop sobre documentários em animação. “Vi como era eficaz para reviver o passado”, explicou o cineasta. “Flee” teria de voltar à infância e adolescência de Amin antes de chegar aos dias de hoje. Rasmussen conversou, então, com o amigo. “E ele ficou intrigado por poder permanecer anônimo por trás da animação”, disse.

“O que se ouve no filme é a sua história contada pela primeira vez. Não foi fácil para ele, que só topou porque nos conhecemos há 25 anos.” Amin também não queria ser reconhecido no supermercado nem ter de responder a perguntas. Tanto que não participou de entrevistas.

Traumas

A animação também era a linguagem ideal porque o filme trata de memória e trauma. “Com a animação, dá para usar uma camada mais surreal e expressiva. De certa forma, dá para descrever essas coisas de maneira mais honesta do que com uma câmera normal”, disse o diretor. Ele tinha visto como uma animação podia lidar com assuntos difíceis em “Valsa com Bashir” (2008), em que o cineasta Ari Folman recupera memórias e traumas da sua participação como soldado israelense na Guerra do Líbano de 1982. “Uma animação é capaz de retratar histórias difíceis de modo que as pessoas entendam melhor”, afirmou Rasmussen.

Autenticidade

“Flee” começa deixando clara sua verdadeira natureza. O diretor Jonas senta-se ao lado da câmera. Seu entrevistado, Amin, senta-se do lado oposto. Amin não esconde o nervosismo. Mas o Jonas do filme é loiro. O Jonas real, não. A aparência de Amin, claro, também é diferente.

Uma câmera captou seus movimentos para a equipe de animação replicar seu gestual. “Comecei o filme assim porque queria passar a ideia de que é tudo autêntico”, garantiu. Amin começa a revelar sua história, desde a infância livre, quando corria pelas ruas metido em um vestido.

Seu depoimento, que contém a verdade sobre seu passado, é intercalado com cenas de sua procura por uma casa com o namorado, com quem vai se casar.

Refugiado

A ideia de Rasmussen nunca foi fazer um filme sobre refugiados, mas, sim, sobre seu amigo Amin, que, por acaso, era um refugiado. Por coincidência, as primeiras entrevistas foram feitas quando a crise de refugiados na Europa estava no auge, em 2015.

“Normalmente a história dos refugiados não tem nuances. Ser refugiado vira sua identidade”, disse Rasmussen. “Mas não é. Fiquei com esperança de que narrar a história de um refugiado por meio de uma amizade pudesse oferecer mais nuances.”

Ser refugiado é uma circunstância da vida que marca para sempre, de muitas maneiras, inclusive fazendo alguém guardar um segredo por 25 anos. “Ser refugiado é algo que Amin viveu e superou. Ele construiu uma vida para si”, lembrou o diretor. “É ainda um acadêmico, gay, dono de uma casa, tem um gato, é amigo, é muitas outras coisas.”

Ser humano

O cineasta lembrou que todo ser humano, em qualquer parte do mundo, pode tornar-se um refugiado – a crise na Ucrânia só deixou isso mais evidente. “Espero que o filme ajude a enxergar que os refugiados são pessoas como nós.” No caso de Amin, poder finalmente contar para Jonas e outros amigos a verdade completa derrubou o muro que havia no relacionamento, mas não só. “Acho que ajudou Amin a conectar seu passado e seu presente, tornando-o um ser humano mais completo.”

Onde assistir

O Cine Passeio exibe “Flee – Nenhum lugar para chamar de lar” a partir desta quinta-feira (21), com uma sessão diária às 18h10.

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