Benett faz humor com amor nas tirinhas de “Anedonia”  

Cartunista consegue ser engraçado, trágico e romântico no espaço de uma tirinha – e o novo livro tem uma centena delas

Se alguém me dissesse que, um dia, Benett publicaria um livro sobre o amor, eu ficaria surpreso. Ou, na melhor das hipóteses, riria da piada – porque é uma piada, certo? Haha.

Mas não. Com frequência, o cartunista surpreende até aqueles que o conhecem (ou acham que conhecem). Pois, falando sério, ele acaba de desenhar um livro sobre o amor: “Anedonia”, com lançamento neste sábado (2), na livraria Arte & Letra.

Anedonia, diz o dicionário, é a “perda da capacidade de sentir prazer”. Numa conversa que começou na última reunião de editores (trabalhamos os dois no Plural) e continuou por WhatsApp e e-mail, Benett me diz que “o livro fala da falta de amor ou da impossibilidade de se amar”.

E por que falar de amor?

“Engraçado que as explicações para minhas decisões sempre são mais prosaicas do que as pessoas imaginam”, diz Benett. “A origem do Amok, por exemplo, foi minha paixão por molho pesto. Criei um personagem que queria comer os próprios pais com molho pesto porque, segundo ele, qualquer coisa com pesto ficava bom.”

Para desenhar o livro do “Amok”, publicado em 2013, o cartunista passou meses mergulhado no universo de serial killers como Charles Manson, Ted Bundy e Jack (aquele mesmo, o estripador). “Depois disso, fiquei com medo de ser associado a esse tipo de humor, de um cara meio depressivo e obscuro”, diz.

Zé do Caixão

Certa vez, participando de um evento, Benett encontrou um sujeito que ficou surpreso porque imaginava o cartunista vestido de preto, com cartola e óculos escuros. “Mais ou menos como um agente funerário ou o Zé do Caixão”, diz Benett, que, para deixar registrado, não usa só roupas pretas e não tem uma cartola (até onde sei).  

“Então fui fazer o oposto do que era o Amok”, continua. “Tinha a ver mais ou menos com o sair de um porão e ver como são as coisas lá fora, num dia iluminado de sol.”

As tirinhas de “Anedonia” foram pensadas para o formato de jornal. Isso quer dizer que os quatro quadrinhos da história eram dispostos em linha, formando um retângulo.

Para o livro, elas foram reorganizadas de modo a fazer um quadrado. O formato funciona e é bastante charmoso: um livro quadrado de quadrinhos.

Benett e Laerte

Se você acompanha o Plural ou a “Folha de S.Paulo”, deve conhecer o humor agridoce de Benett. Em “Anedonia”, ele consegue ser engraçado, trágico e romântico no espaço de uma tirinha. Só conheço duas pessoas que são geniais ao fazer essa mistura: o Benett e a Laerte.

Por exemplo, um dos desenhos mostra uma fileira de quatro latas distintas para a separação de lixo. As três primeiras dizem “orgânico”, “plástico” e “vidro”, todas vazias. A última lata, transbordando de corações ensanguentados, diz: “ilusões”.

Aliás, essa é apenas umas das sacadas do cartunista: alternar o sinal gráfico do coração, ❤️, com os traços de um coração “de verdade”, cercado de artérias, veias e ventrículos.

Em outra tirinha, um sujeito está agarrado a um fio com uma mão, olhando para baixo como quem contempla o próprio fim. O fio está preso de um lado por um coração e, do outro, por um cérebro. (O embate entre esses dois órgãos aparece bastante ao longo do livro.)

Às vezes, o humor é mais sarcástico, mas feito de frases impagáveis, que causam pequenas explosões de significado quando você amarra uma coisa na outra. Dizem que esse é também o efeito de um trocadilho.

Como na tirinha em que ele explica o conceito de “amor plutônico”: “frio, distante e já foi rebaixado a outra coisa”. BUM!

Daria para escrever muito mais sobre o prazer causado pelas pequenas explosões de significado em um livro com o título irônico – agora entendi! – de “Anedonia”. Mas isso não seria justo com você, leitora (ou você, leitor). O mais legal é experimentar as explosões por conta própria.

Livro

“Anedonia”, de Benett. Arte e Letra, 100 páginas, R$ 40. Humor. Lançamento do livro com a presença do autor no sábado (2), às 10h30, na livraria Arte & Letra (Rua Desembargador Motta, 2.011), (41) 3223-5302.

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