Brutal, “A tragédia de Macbeth” explica como funcionam a política e a ganância

Adaptação da peça teatral de Shakespeare feita por Joel Coen recebeu três indicações ao Oscar 2022

É bom começar dizendo o óbvio: se você nunca viu um “Macbeth”, veja. Não é à toa que, mais de 400 anos depois da morte de Shakespeare (405, para ser exato), o texto continua sendo encenado, filmado, discutido. Além de todos os outros méritos, é uma das histórias que melhor explicam como funcionam a política e a ganância – o que não é pouco.

Joel Coen é um sujeito preparado para contar essa história: ao longo de 30 anos, escreveu e filmou histórias violentas que também têm como centro a capacidade do homem de atingir seus objetivos por meio da violência. Pense em “Fargo” (1996) ou em “Onde os fracos não têm vez” (2007), por exemplo.

Primeiro filme em que ele trabalha sozinho, sem ter o irmão Ethan como colaborador, “A tragédia de Macbeth” caiu como uma luva para ele. O drama do sujeito que decide matar para ser rei, e que por isso se vê pego numa teia de sangue e brutalidade, é arrepiante a ponto de muita gente, durante séculos, ter temido dizer o título da peça em voz alta. Imagine o que um dos irmãos Coen pode tirar disso.

Já no começo do filme – indicado ao Oscar 2022 nas categorias de ator, fotografia e design de produção – há uma das interpretações mais impressionantes que você vai ver no cinema. Uma atriz praticamente desconhecida mesmo dos cinéfilos, Kathrin Hunter, faz misérias ao interpretar as bruxas que instigam Macbeth a cometer o crime. “Serás rei”… duas palavras que causam um morticínio na Escócia.

Genial

O elenco é só um dos pontos fortes da produção, com Denzel Washington e Frances McDormand fazendo o casal de assassinos. Mas há muito mais: a iluminação teatral de alguns dos espaços é coisa de gênio (a fotografia é de Bruno Delbonnel, de “O fabuloso destino de Amélie Poulain”). Num dos momentos, por exemplo, Macbeth e a esposa estão num pátio conversando, e a luz vem do alto, aproveitando um círculo aberto no teto: lembra exatamente uma iluminação por holofotes, fazendo uma referência nada óbvia mas emocionante ao palco.

A solução do filme para lidar com o sobrenatural é igualmente brilhante. Sempre que deveriam aparecer fantasmas, bruxas ou qualquer elemento do além, o que vemos na tela são pássaros associados ao mau agouro – como na cena em que Macbeth vê Banquo, que ele sabe estar morto, e sai pelo castelo combatendo um fantasma: quando vemos a cena de outro ângulo, vemos que a luta é contra um pássaro que invadiu o palácio.

Coen conseguiu reduzir a história a pouco menos de duas horas mantendo os elementos centrais. E decididamente não faz feio na comparação com as versões anteriores da peça produzidas pelo cinema – e olha que estamos falando de um texto já filmado por Orson Welles, Roman Polanski e Akira Kurosawa.

Streaming

A versão nova de “A Tragédia de Macbeth” está em cartaz na Apple+.

Sobre o/a autor/a

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

O Plural se reserva o direito de não publicar comentários de baixo calão, que agridam a honra das pessoas ou que não respeitem níveis mínimos de civilidade. Os comentários são moderados por pessoas e não são publicados imediatamente.

Rolar para cima