Orgulho LGBTI+ sai do armário e entra na cozinha

Multiplicam-se os empreendimentos gastronômicos voltados para esse público

Uma marca de café, um bar de drinks e uma linha de pães artesanais. Essas três novidades da gastronomia curitibana têm algo em comum: chegaram ao mercado ostentando o orgulho LGBTI+ (Lésbicas, Gay, Bissexuais, Transexuais, Intersexuais e outros grupos). 

“Ficamos muito tempo no armário. Esse é um lance de resistência e de nos impor como empreendedores. Estamos buscando nossos espaços ”, diz o empresário Diego Xavier, que junto com o marido Murillo, acaba de lançar a Yag Coffee, marca que comercializa cafés produzidos em Lupionópolis, na região metropolitana de Londrina. 

Os dois vêm de famílias de cafeicultores e recentemente enxergaram a oportunidade de abocanhar uma fatia do mercado dos cafés especiais apostando numa marcada voltada para o público LGBTI+. O café é uma mistura das variedades Mundo Novo, Obatá, IPR 100, Catuaí e Acaiá e é vendido nas versões em grãos e, a partir da próxima semana, também em pó. A embalagem de 500 g custa R$ 20. 

Segundo Diego, a ideia surgiu para “homenagear as cafeterias, como o Café do Teatro, que em Curitiba sempre foram pontos de encontro para a comunidade LGBT, numa época em que não havia aplicativos [de paquera]”. O nome Yag é o anagrama da palavra gay.

Diego e Murillo Xavier, donos da Yag Coffee. Foto: Divulgação.

A previsão do casal é lançar mais seis tipos de bebidas nos próximos três meses. A venda, por enquanto, é feita pela internet, mas o plano é abrir um espaço físico depois da pandemia.

O mesmo projeto – sair do mundo virtual para o real – é compartilhado por Gabriel Castro, fundador de O Pão Que O Viado Amassou, padaria caseira que no meio do ano passado começou a bombar na internet, não só por causa dos pães saborosos, mas pela comunicação bem humorada que envolve a comunidade LGBTI+. 

“Acho que a gente tem que dar as caras e tentar fazer uma transformação. O Pão não é uma marca que adotou um posicionamento, mas fez o caminho inverso: já nasceu para falar sobre isso”, diz Castro. Com muita farinha e glitter, ele leva a cultura gay para a casa das pessoas.

Tente enviar uma mensagem ao WhatsApp da padaria e você receberá a seguinte mensagem. “E aí, tutupão, ser iluminado e perfeito aos olhos de Cher? Pra fazer seu pedido, vem aqui comigo!”. E prepare-se porque a entrega será feita pelas “belas mãos do motobofe”.

O padeiro diz que graças ao bom humor, a missão está se cumprindo. Ele cita como exemplo um cliente que levou o pão para a casa dos pais, o que foi uma brecha para que eles conversassem sobre os temas LGBTI+.

“Esse discurso da dita minoria, que às vezes é estigmatizado e fica restrito a certos nichos, busca marcar presença também no mundo dos negócios. Muitas vezes somos retratados como caricaturas de algo que não somos”, afirma Castro.

Ator, DJ e professor de teatro e circo, Gabriel, 34, começou a fazer pães em casa durante a pandemia. Antes de iniciar as vendas, aprendeu técnica e receitas assistindo a vídeos no YouTube e distribuiu as primeiras fornadas a amigos e parentes. Hoje ele produz até 150 pães por dia, migrou para uma cozinha profissional e está contratando ajudantes.

Dos oito currículos que recebeu, a metade foram de pessoas da comunidade LGBT, o que o deixou chateado. “Será que só tem quatro viados sapatões que fazem pão por aí? Será que tem uma dificuldade dessas pessoas de entrarem para o mercado de trabalho?”, questiona o padeiro.

Apesar de cada vez mais pessoas da comunidade LGBTI+ empreenderem no setor gastronômico, as iniciativas ainda são esparsas. Por isso, Castro cogita montar uma frente para oficializar esse movimento com o objetivo de “criar uma consciência de classe” e “para que outras forças surjam”.

Pink money atrai investimentos

O mercado voltado para o público LGBTI+ é enorme. A empresa de consultoria LGBT Capital calcula que vale mundialmente U$ 3,9 trilhões ao ano, sendo U$ 75 bilhões no Brasil. Essa oportunidade tem levado cada vez mais empresas de todos os portes a investirem em produtos para esse público em busca do chamado pink money, ou dinheiro rosa. 

“Muitos empresários estão vendo que existe uma demanda não suprida porque tem um público [LGBTI+] muito grande, não só em Curitiba, mas no Brasil inteiro”, diz Rodrigo Keller, sócio-proprietário, ao lado de Alex Douglas, do Love y Gin, bar de drinks que inaugurou em janeiro, no Água Verde, em Curitiba.

Ao frequentar festas, os dois empresários observaram que seus amigos tomavam pouca cerveja, mas gostavam de drinks. Daí, a ideia de abrir um bar especializado. “No nosso caso não quisemos apenas turbinar o negócio, mas desde o início propor assumidamente um bar LGBT, não apenas gay friendly. Esse é o nosso grande diferencial”, afirma Keller.

 

Alex Douglas e Rodrigo Keller, donos do Love y Gin. Foto: Divulgação.

Diante de um mercado tão promissor, não faltam empresas que usam as causas da comunidade LGBTI+ apenas como ferramentas de marketing para impulsionar os negócios. É o chamado pinkwashing, ou lavagem rosa. Não é exclusividade desse segmento: isso ocorre também com empresas que fazem greenwashing, ou seja, usam a pauta ambiental para lavar a própria imagem.

“Empreendimentos LGBT não podem viver só de aparências. O nosso público reconhece quando algo é forçado ou feito apenas para atrair o pink money. Não dá para fazer algo só pelo pink money, o dinheiro é só uma consequência. Tem que fazer espaços voltados para esse público não apenas pensando no dinheiro”, completa Keller.

Serviço

Yag Coffee. (41) 98450-7021. facebook.com/yagcoffee; instagram.com/yagcoffeeoficial/

O Pão Que o Viado Amassou. 41 98787-7087. facebook.com/opaoqueoviadoamassou; instagram.com/opaoqueoviadoamassou/

Love y Gin – Av. Iguaçu, 3160 – Água Verde. Terça a sexta das 18h às 23h. instagram.com/loveyginbar

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