O drama do porto tem rosto

O fotógrafo Bruno Santos mostra quem são as pessoas que serão afetadas pelo Porto de Pontal

Fotos de Bruno Santos.

Me chamo Bruno Santos, hoje tenho 35 anos e começo a me deparar na vida, com coisas das quais, se pudesse escolher, não gostaria de me deparar.

Iniciei na fotografia em 2009,  e desde então já passei por várias áreas de atuação: casamentos, famílias, eventos, moda, publicidade etc. Nada disso pra mim fazia muito sentido. Por isso em 2013 resolvi fazer uma alteração na rota, drástica e necessária, direcionando meu trabalho para finalidades que me parecessem ter real sentido e serem necessárias; algo que movimentasse uma engrenagem muito maior.

Inspirado pelo mestre Sebastião Salgado, iniciei uma jornada acompanhando alguns projetos sociais, como fotógrafo. O objetivo principal era o de registrar as ações para que tais projetos pudessem usar essas imagens para divulgar seus trabalhos.

Rapidamente esse objetivo principal foi se expandindo para percepções muito maiores, que só a rotina desses trabalhos pode proporcionar à alguém. Acessar certas histórias e realidades e perceber que, mesmo em certas condições precárias de vida, as pessoas são capazes de ensinar preciosas lições foi algo que aos poucos atraiu minha atenção como um ímã.

Além do registro das ações, passei a fazer retratos cada vez mais conectados com essas pessoas e estabelecer uma linha direta de troca e aprendizado.

Cada personagem que pude retratar traz na foto uma história, uma lição e uma mensagem muito profunda, algo que faz do meu trabalho algo extremamente gratificante. Porque mais do que mostrar essas pessoas, com elas eu aprendo, evoluo e construo uma identidade em mim e no meu trabalho.

Nessa ação em especial, do projeto Barco Sorriso, que leva atendimento odontológico e médico a comunidades de difícil acesso do nosso litoral, fomos atender duas comunidades que passam por situações semelhantes e extremamente delicadas.

https://www.plural.jor.br/os-dentistas-que-chegam-de-barco%EF%BB%BF/

A comunidade Maciel, que está sendo coagida e forçada a se retirar, pois está localizada exatamente na área de interesse para a construção do novo Porto de Pontal do Paraná; e a comunidade indígena Guaviraty, situada exatamente onde se pretende construir uma nova estrada que dará acesso a esse porto.

Qualquer um sabe que tais obras são motivadas por interesses de poucos e vêm acompanhadas pela velha história de que assim se traz o progresso e geração de renda para a população local. Papo para boi dormir.

Essa série de retratos que apresento, não tem como objetivo tentar impedir tais obras ou cessar esse movimento estúpido e que trará danos irreversíveis a natureza da nossa região, fazendo com que a parte mais linda do nosso litoral sucumba à degradação.

Quando a motivação maior é alimentada pela ganância e sustentada pelo dinheiro, sabemos que é muito difícil lutar contra.

Por isso através dessas fotos, gostaria de levantar a questão, de “até quando?”, o ser humano, dotado de certo poder, vai continuar repetindo antigos erros, movido pela ganância e vai continuar passando por cima de valores fundamentais de respeito e convivência com o próximo, por puro interesse proveniente do seu insignificante umbigo.

O que faz com que essas pessoas assumam esse comportamento, e por gerações cometam esse tipo de desrespeito com a nossa história, natureza e povo?

No começo desse texto comentei que havia me deparado com coisas que não gostaria. Pois bem, ao fazer esses retratos e ouvir algumas histórias, durante essa ação me deparo com atitudes que vêm dessa minoria que está no poder, que me deixam profundamente enojado com a capacidade desses seres, que podem ser chamados de qualquer coisa, menos humanos.

Quero chamar a atenção também de você que continua inerte frente a tantos fatos grotescos. Chamar a sua atenção para que saiba que a mudança também depende de nós. Que esse tipo de coisa só continua acontecendo porque deixamos.

Talvez as pessoas presentes nessas fotos não façam diferença alguma pra você. É só muda-las de local e tudo se resolve. Vida que segue.

Mas elas, eu e você, somos todos escravos dessa minoria que decide como a banda toca.

Não sei vocês, mas eu não gosto de música ruim.

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