Depois da robótica, programação, a palavra-chave da vez no marketing das grandes escolas particulares de Curitiba é a “cultura maker”. O termo, como de praxe importado dos EUA, se refere não a uma disciplina ou conteúdo, mas a um “espírito” ou “modo de pensar” que implica buscar consertos e melhorias de forma amadora e com os recursos que se tem em mãos.
O termo maker fez o seu primeiro début em terras brasileiras vindo da Europa. Nos anos 1970 a Editora Salvat trouxe ao país a Enciclopédia de Bricolagem, uma publicação de origem francesa que reunia projetos de móveis e equipamentos a serem construídos em casa. Numa época em que a compra de móveis sob medida era um sonho distante para a maioria da população, a coleção nutriu o espírito “Faça você mesmo” em toda uma geração.
Junto a esse espírito estava a ideia de que conhecimentos básicos de eletricidade e corte e costura a marcenaria eram parte de uma base importante da formação do “homem e da mulher modernos”. Com esse canivete suíço de conhecimentos em mãos, a pessoa podia ter uma vida doméstica autônoma e dar conta dos desafios domésticos, do conserto de tomadas a construção de peças inteiras sob medida. Esse “espírito” maker ou “faça você mesmo” começa em projetos de revistas e livros, mas tem o objetivo de evoluir para projetos próprios e soluções originais.
Dos anos 1970 para cá a sociedade mudou muito. Mas o encanto de poder dar conta de si mesmo e de criar coisas novas nunca diminuiu. O espírito “Faça você mesmo” enche milhares de canais, sites e perfis em redes sociais, muito embora nem sempre fieis a ideia de arriscar e de inventar. E chegou nas escolas como parte de uma resposta a reivindicação de que a experiência escolar seja mais conectada a reais necessidades da vida.
Mas o que é esse “espírito maker” na escola? Se fiel à proposta, ele é uma mistura entre aprender e inventar. No vocabulário americano da comunidade maker há um termo essencial de difícil tradução: tinker. Em português a tradução literal seria “remendar”, mas é mais que isso. “Tinker” na cultura maker é pegar algo pronto e explorar para criar algo original.
Dentro de um contexto escolar, implantar uma cultura maker é partir por um lado aprender habilidades básicas como descascar um fio elétrico ou conectar um plug, cortar, lixar e colar madeira, enquanto experimenta usar essas habilidades para criar algo novo.
Ter um espírito maker na escola não implica em ter uma “aula” ou disciplina “maker”. Ele pode e deve estar incorporado ao currículo normal. Um exemplo é a experiência realizada em sala por uma amiga professora. Ao estudar máquinas básicas e insetos com estudantes do anos finais do Ensino Médio, ela os ajudou a ver a relação entre, por exemplo, o conceito de alavanca e as articulações de baratas e aranhas. A partir daí ela desafiou os alunos a tentar criar uma criatura reproduzindo essas articulações usando materiais comuns aos quais eles tinham acesso.
Note que nessa iniciativa a professora determinou parâmetros claros: uso das articulações/máquinas simples para criar um inseto, mas deixou o produto final em aberto, dando vazão a criatividade do aluno e permitindo soluções que ela mesma pode não ter previsto.
Do ponto de vista de prática de ensino, levar a cultura maker para sala de aula é desafiar a cultura da “resposta certa”, o que é um ajuste tanto para professores quanto para alunos. Isso, porém, não quer dizer que não existam “respostas certas”. Você continua não podendo inverter os pólos numa ligação elétrica. Mas o trabalho intelectual e físico não termina quando a ligação é feita corretamente.
Mas como avaliar se a escola do seu filho realmente está tentando incorporar a cultura maker a sua filosofia de ensino ou só está usando a fama do termo para angariar novos alunos? É de certa forma simples: é normal que professores partam de projetos específicos com os alunos, mas é preciso que esse projeto permita o espaço necessário para levá-lo adiante.
Podemos ver isso num projeto clássico das escolas: o do “robô escovão”. É possível que seu filho já tenha feito um. O robô escovão é um projeto simples de robótica que usa um escovão, material reciclável e um motor de vibração simples. Ao ligar o motor de vibração ao escovão conseguimos fazer com que ele “ande”, muito embora não seja possível direcionar esse movimento.
Existem até kits de robôs escovão para comprar. É um ótimo projeto inicial porque é simples e resulta em algo interessante. E você aprende algo importante construindo ele: aprende a ligar um motor simples a uma fonte de energia (normalmente um case com duas pilhas AA). Mas a construção do robô em si não é “cultura maker”. O que faz disso algo relevante dentro do contexto escolar é a integração disso ao conteúdo e a exploração do que foi aprendido para aprofundar o conhecimento.
Por exemplo, a construção do robô é parte do estudo dos conceitos de movimento, inércia e atrito. Depois de fazer o escovão andar, o que mais será que um motor de vibração consegue movimentar? Será possível usar o mesmo princípio para direcionar o movimento?
Os resultados podem ser incríveis tanto na produção dos alunos quanto na efetiva compreensão do conteúdo, bem como aplicação dele a questões práticas. Mas essa situação ideal depende de um professor qualificado que tem respaldo da instituição e tempo para estudar e preparar aulas nesse espírito, espaço e recursos para os estudantes poderem explorar e um ambiente que fomenta a criatividade.
Nada disso vem de um kit. Nem no pacote de uma impressora 3D.
Oi Rosiane. Pode me passar um e-mail de contato? Vou te mostrar muitos trabalhos legais que temos feito no Colégio na área de Ciências Humanas.
Aguardo
Um abraço
Oi Isabel, mandei um email pra ti.
Excelente matéria Rosiane!
Parabéns.