Cia Laica narra histórias reais de abandono infantil em “Vozes de abrigo”

Cia Laica chama atenção para as histórias de crianças em situação de abandono nas cidades de Joinville e Fortaleza

O pai do menino chega um pouco diferente em casa… Fala grosso, está agitado, profere palavras em um tom mais alto. Vendo o clima de tensão se instalar dentro da casa, a mãe decide que o melhor é colocar o filho dentro de um armário para protegê-lo. O menino fica lá durante horas. Quando sai, acredita que passou por ali uma chuva. Só que as gotas que molharam o chão tem cor. São gotas vermelhas. Uma chuva diferente e nenhum sinal dos pais.

Essa é uma das histórias de “Vozes de abrigo”, da Cia Laica, um musical apresentado nas Ruínas de São Francisco, durante a programação do Festival de Curitiba, na quarta-feira (6). Foi a última apresentação da peça que é uma produção da companhia de teatro curitibana nascida na Faculdade de Artes do Paraná, em 2015.

Abandono

Recheado de metáforas e embaladas com canções populares e autorais, a Cia Laica sensibilizou a plateia e chamou atenção para as histórias de crianças em situação de abandono e que vivem em abrigos nas cidades de Joinville e Fortaleza.

O cenário misturou elementos lúdicos como nuvens, muitos tecidos e um carro de madeira que facilmente se transformava em um armário. Esses elementos sofriam metamorfoses para criar os diferentes ambientes em que as crianças vivenciaram suas histórias reais.

Sem nome

O uso de metáforas dá o tom suave para a narração de duras e tristes histórias vividas pelos personagens. Um deles é um menino, sem nome, que nasceu no sítio. Devido à crença popular da região, não é permitido que uma criança receba nome se não for batizada.

Os anos se passam e o menino cresce sem um nome, sendo chamado simplesmente de menino. Em um dia de festa na cidade, seu pai o leva para ver os fogos de artifício que coloriam o céu. De repente, o menino se vê sozinho em meio à multidão. Procura pelo pai desesperadamente. Já é tarde. O menino é abandono ali, sem nome, sem pai, sem identidade.

“Autoninar”

Em determinada cena, uma das atrizes canta a cantiga “Tutu Marambá”, os demais atores deitam no chão e com o embalo da canção de ninar reproduzem uma cena muito comum presenciada nos abrigos: o ato de se “autoninar”, onde as crianças são responsáveis para se colocarem na cama, se acalentarem e, enfim, dormirem.

O elenco alterna momentos em que dão vida aos bonecos com as inserções da presença dos próprios atores e atrizes dentro do roteiro, utilizando músicas, efeitos sonoros e luzes que eles mesmos conduzem.

É o que acontece quando uma das atrizes representa uma boneca de pano e, com o auxílio dos colegas de cena, ganha vida se transformando na Pequena Vendedora de Fósforos, personagem do clássico conto infantil.

Durante o processo de pesquisa para o desenvolvimento da peça, o diretor Fábio Nunes Medeiros ouviu das próprias crianças histórias infantis populares e, tanto em Joinville quanto em Fortaleza, o conto da Pequena Vendedora de Fósforos foi diversas vezes narrado pelas crianças dos abrigos.

Aviõezinhos de papel

Com a cantiga final, os atores jogaram aviões de papel na plateia que, aos poucos, foram sendo recolhidos pelo público.

Fui buscar o meu aviãozinho caído no chão. No papel, vi o desenho de uma criança brincando em um jardim e com letras grandes e tortas estava escrito: “Me leva pra casa?”. As lágrimas vieram à tona e a certeza de adotar se firmou ainda mais no meu coração.

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