e agora você

nunca desmaiei no bonde mas rolou do meu lado nas antiga. foi na hora de passar na roleta. o cobrador esterçou o pescoço dela. aí ela foi desacelerando. desacelerando. abriu os olhos e perguntou. nada nada nada fica deitadinha aí tá tudo bem. no outro dia não foi pra aula. no outro dia tava no bonde de novo. a vez que desmaiei tava apostando com meu irmão quem ficava mais tempo sem respirar. ele disse que segurou um tempo ainda depois que caí mas não botei fé. ele tinha bronquite. eu fazia a inalação dele. era salgadinho. hoje é azedo. quase não trombo as pessoas que amo. quando trombo tô lesado do trampo. as incoerências do mundo não me representam e olhando pra minha bolha a galera com mais idade diz ô, na moral, é assim memo, corre atrás do que você quer e bora. a galera com menos idade diz que o lance é viver a vida. trampar o necessário e nunca jamé vender fim de semana. só se for pra viajar no fim do ano. ou trocar de celular. então eu olho pra essas parada e tento ficar feliz porque no fim das conta o que “““fica””” é a troca de ideia. a visão que a outra pessoa te passa e que muitas vezes você não tinha. papo de horizonte. de conscientização. de luta diária. tem um som do djonga que diz pra amadurecer sem perder a ternura. ontem esqueci o fone no trampo e uma senhora puxou assunto no bonde. trabalha com café? dá pra sentir? ô se dá. bom né? eu tenho um pé em casa… e ficamo falando. ficando em silêncio. falando. uma hora olhei pro lado ela tava igualzinho eu quando tô o pó da gaita e boto a cabeça no vidro mas não fecho o olho porque tem que ter alguma coisa tá ligado? a gente vai achar. vai reconhecer. o lance é não esquecer onde fica o zíper da armadura. não esquecer que o biarticulado desce o jardim botânico e que as árvores somem e crescem prédios atrás dos prédios. parece sampa. geral em situação de rua perto da rodoviária. em baixo do viaduto do capanema tem um restaurante da prefeitura que serve rango a três pila. já vi gente saindo de lá atravessando a rua e indo tentar dormir. não é fácil dormir no cimento. imagine sonhar. quero calma. quero um dia atender no meu próprio negócio. seja bem-vinda. esse? esse é um empadão de palmito. ele me contou agorinha que tava esperando você. pra levar? pra já. opa. seja bem-vindo meu parceiro. um espressinho curto ou carioca? carioquita entonces. no capricho. esse aqui é de minas. terra de carolina maria de jesus. não conhece? foi uma escritora. tá vendo aquela estante? procura um que se chama diário de bitita. é. bi-ti-ta. achou? esse pra mim é tipo nosso espresso. é ácido. marcante. e é doce também.

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