bumerangue

praia de novo, tava eu e um cara venezuelano atendendo a galera desse bar que era tipo uma casa grande. as mesas ficavam na areia, nos cômodos era tipo um museu, descendo as escadas tinha o depósito de garrafas e uns colchões bem finos. eu só conseguia dar um bizu nos cômodos se desse perdido no trampo e uma hora o dono do bar me disse Cara, ainda preciso passar no outro bar, dirigir quinze quadras na contramão, e quero que você suma da minha frente porque aguentar essa tua cara não consigo mais. lembro de não entender porque é que ele precisava ir na contramão mas não disse nada. nos meus sonhos escuto mais do que falo.

tava garoandinho na tarde que o zap e o insta caíram: troquei de roupa no vestiário, enrolei um cigarro e fui pegar a bike. a chaveta do pedal esquerdo foi pro beleléu, a bicicletaria fica do lado do Cemitério Luterano. minha vó também tá enterrada lá. quando eu era menor, lembro que ela sempre lia o obituário. às vezes chorava, dizia Nossa, não acredito que beltrana faleceu. esses dias me peguei falando isso. sei lá qual fita. sei que no meio do caminho a garoa ficou sinistra e corri pro banco sacar a grana pro bonde.

cheguei agência, produto de limpeza acaba com a digital e meu cartão com o chip de lua. esfreguei o dedo no papel de pão amanteigado que tava na mochila. deu boa no leitor mas, em vez de tirar cincão e sair fora, tentei cadastrar o número pra na próxima sacar pelo aplicativo. a tela do caixa eletrônico ficou vermelha e no meio Senha bloqueada, comparecer a agência. na marquise esperando a chuva passar, o cara com a caixinha de bala de goma fica espiadão quando chego perto

– salve meu parceiro

– opa

– deixa eu te perguntar uma coisa: tu tem pix?

– é que tentei sacar uma grana no banco ali mas deu ruim meu cartão

difícil saber o que uma pessoa tá dizendo quando não diz nada. mais difícil é alguém botar fé no teu papo se você mesmo não bota muito. olhei bem no olho dele e soltei

– meu parceiro: boto fé que tá rolando vários golpe de pix e tals

– tá né?

– mas a real é que tô ligado que o nome do teu filho é Richard

– que papo é esse cara?

– tu não lembra de mim? trampava naquela confeitaria da Espanha

– porra meu irmão, de máscara é osso. como que tá?

– na paz pô, na paz. e por aí?

– daquele jeito. agora que não tá mais vendendo Estar, o jeito é a balinha

– boto fé

– tu acredita que depois que tu saiu da confeitaria, fui ajudar a galera a carregar uma geladeira?

– e aí?

– aí que meu celular caiu em baixo do pé dela quando a gente colocou no chão. fui ajudar e me fodi

falamos de positividade, negatividade, prédios e bumerangues. depois fiz o pix e entrei no bonde.

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