a vida dos outros

tinha esse josé na oitava. maluco era zica em matemática. por causa da cicatriz eu chamava de harry potter mas nunca mais trombei pra conseguir pedir desculpas. sei lá como tá. se já é pai. sei que às vezes a gente fica próximo de alguém por causa do que tá rolando e na oitava só dava atlético e santos. foi ponto a ponto a disputa pelo título. quando tinha jogo final de semana na segunda eu e o josé se xingava. quando tinha jogo na quarta na quinta a gente quase saía na mão. em 2004 o atlético terminou em segundo e em algum dia depois da aula fui pagar o carnê da planeta pé que tem no fazendinha. vi uma peita de treino do santos. pensei em economizar passagem no bonde e comprar. pensei que eu queria ficar feliz igual o josé e outra fita é que muitas vezes a gente quer ser como às outras pessoas. como se as outras pessoas fossem felizes. como se elas não lidassem com as próprias merdas também. esses dias a prefeitura da cidade de santos deu uma medalha de honra ao mérito pra djamila ribeiro e me lembrei dele. lembrei também que a maior parte dos vereadores de curita rejeitou prestar homenagem pra marielle franco. se eu trombo o josé e ele me solta que o que rolou com a marielle não tem nada a ver com a gente eu só viro e vou embora. fiz isso quando o cara da pizzaria me olhou de cima a baixo antes de dizer que estavam fechados. fiz isso quando o cabeleireiro perguntou se era mesmo pra passar a zero porque não queria me deixar com cara de febem. antes febem do que milico devolvi de prima. aí saí. entrei na academia. tô tentando canalizar minha raiva. não tô ouvindo duas música pesada na sequência. vimo um filme essa semana. ataque dos cães. aquele ator que também faz o sherlock holmes manda bem demais. aquela atriz que também faz o melancolia me lembrou a santana da novela. alcoolismo é um bagulho triste. quando meu tio tava de cara limpa ele me dava um troco pra comprar pão doce. pão doce no espírito santo é tipo um chineque. não tem nada a ver com chineque na real. é tipo um pão com creme. aí eu ia andando pra padoca e o asfalto era tão quente que ficava mole às quatro da tarde. eu pensava se dava pra fritar alguma coisa. se meu tio de cara limpa ia arquitetar o roubo da geladeira comigo que seria primeiro esperar a vó ir pro banho aí pegar o ovo depois sair de fininho pelo portão e desbaratinar desbaratinar e dar mó galeto dobrando a esquina sorrindo pulando cantando música de torcida organizada até a parte mais quente do asfalto só pra ver se o ovo estalava. o ataque dos cães me lembrou que uma galera vai olhar feio quando a gente passar. que o lance é não baixar a cabeça. a gente se sustenta naquilo que acredita e isso as outras pessoas não sabem. isso as outras pessoas não têm como saber.

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