Vida sorrindo

É desejo de qualquer pessoa levar a vida sorrindo e como e porque C. leva ou levava a vida sorrindo não sei. Talvez ela não levasse a vida sorrindo, e é somente a impressão do autor do livro e da dedicatória.

Pode ser que toda vez que o Marco Antonio – autor do livro – a visse ou a vê, estava ou está sorrindo, por isso fez uma dedicatória de caráter bem pessoal.


À C.

que leva a vida sorrindo, pois a vida merece por isso meu carinho

Marco

29.05.12


Esta dedicatória está no livro Da Alemanha aos Trópicos, Identidades Judaicas na Terra Vermelha (1933-2003), Marco Antonio Neves Soares.

O livro está praticamente novo, sem nenhum risco e o único sinal de ter sido lido e/ou manuseado é que está destacado o marcador de páginas que vem picotado – para ser destacado – da página de orelha.

É uma leitora cuidadosa, diferente de mim que risco, rabisco e faço anotações nas margens dos livros.

Abro parênteses: sempre defendi que livro não deveria ter orelha. Deveria sim ter língua para de maneira automática e própria ler-se a si próprio e as nossas orelhas/ouvidos ouvir. Fecho o parênteses.

O Da Alemanha aos Trópicos, Identidades Judaicas na Terra Vermelha (1933-2003) relata a história de cerca de 80 famílias alemãs de origem judaica, que se refugiaram em torno da Gleba Roland, hoje município de Rolândia.

Com a ascensão do nazismo na Alemanha de Hitler, fugiram da perseguição e da morte e vieram se refugiar no Brasil.

É uma viagem do fim da República de Weimar à mata virgem do norte do Paraná, no inicio da década de 1930. Viagem de fuga, sem muitos sorrisos e, imagino, cheia de esperança de que o novo refúgio – Rolândia – lhes desse a condição de construção de uma nova vida.

José Miguel Arias Neto, na apresentação do livro, publicado pela Aduel, em 2012, escreve que “as mentiras da propaganda totalitária distinguem-se das mentiras comuns pela sua negação sistemática dos fatos em geral: todos os fatos podem ser modificados e todas as mentiras podem ser transformadas em verdades”.

Esta frase nos traz ao presente momento do Brasil, onde as mentiras repetidas cotidianamente, construiu uma triste realidade: eleição de um fascista, do qual agora somos vítimas.

Além da dedicatória manuscrita a C., há a dedicatória de praxe e, neste livro, como em muitos outros não falta a dedicatória pela dedicação da mãe.

E como sempre que encontro livros nos sebos com dedicatória me vem à mente a pergunta: por quê vendeu o livro?

E sempre a primeira e principal razão que imagino é a econômica: vendeu porque precisava de dinheiro.

E, se não for isso, porque C. vendeu? Será que deixou de sorrir e a dedicatória levava-a a um momento de um largo sorriso? Ou o livro, por ser de história roubou-lhe o sorriso? Ou será que não gosta de história? Será que era um encanto pelo autor e desencantou-se?

Há uma possibilidade: deixou de sorrir quando descobriu que em Rolândia havia nazistas, existia o Partido Nacional-Socialista, que fez tremular a bandeira com a suástica no dia da inauguração da Escola Alemã, em julho de 1935.

Há também perguntas que se repetem: C. teve dificuldades financeiras e precisou vendê-lo? Ou pior, morreu e o herdeiro ou a herdeira não gosta de ler, ou precisamente não gosta deste tipo de leitura ou teve dificuldades financeiras? Ou o melhor, C. gostou muito do livro e achou por bem compartilhá-lo.

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