Extinção em massa do Boitatá

Quando eu era criança tinha Boitatá.

Assim… de verdade. Tinha mesmo.

Perto da minha casa. No parquinho.

Não era uma dúvida.

Tinha e pronto.

E olha que eu nem sou uma criança dos anos 50, ou 60, ou 70… e só sou dos anos 80 por míseros 25 dias.

Sou bem mais dos anos 90.

E mesmo assim tinha Boitatá.

Ou seja. Ontem tinha. Hoje não tem.

Hoje em dia não tem mais nada disso que é legal e mistura bicho com magia.

Nem Boitatá, nem curupira, nem mula sem cabeça, nem lobisomem.

Chato demais.

Uma extinção em massa provocada pela falta de contação de história.

Ou pela poluição.

Ou pela miscigenação com os Pokémons.

Não sei direito.

Eu definitivamente não entendo como a nossa geração tem a ousadia de ser tão cética, sendo que fez parte da nossa formação humana notícias como: menina que chora vidro, ET Bilu e Chupacabra.

Sabe?

Foram MESES de notícia do Gugu ao Fantástico, sobre um troço misterioso que CHUPAVA O SANGUE DAS CABRAS E DEPOIS DESAPARECIA.

E as cabras ficavam lá, tudo chupada, sem um pingo de sangue.

No Brasil inteiroooooo!

E ninguém sabe o que é, até hoje!!!

Medão da zorra!

Aí, o povo vem me dizer que não acredita em ET, espírito, mula sem cabeça e lobisomem???

Aaaah, cês me poupem!

Quem foi que roubou seus sonhos?

A menina chorava VIDROOOOO!

Tinha santa que CHORAVA SANGUE!!!!

Cês tão doido!

Os anos 90 me ensinaram a não duvidar de nada, nunquinha (e os anos atuais me ensinaram a procurar tudo no google porque pode ser Fake News do presidente).

Mas imagina só: Você tá lá, de boas, vivendo sua vida assistindo TV Colosso e Fada Bela, e, de repente, aparece o plantão da Globo pra te contar que um bichão tá chupando o sangue das cabras!!!

Pra ser o TEU sangue, é um pulinho!

Por isso na minha geração, quando falavam que tinha Boitatá, era porque tinha mesmo.

(Nota pra você que não faz ideia do que é um Boitatá, porque nasceu num lugar frio e sem cores depois dos anos 2000, deixa eu explicar… Pode haver opiniões contrárias, mas o MEU Boitatá era uma cobra gigante que soltava bolas de fogo pela boca quando alguém maltratava a natureza).

– Mas se é cobra por que o nome é boi, AB?

Porque as coisas são assim no mundo mágico.

E tinha um Boitatá, específico, que morava no parquinho do final da rua da minha casa.

Eu conseguia ver as bolas de fogo no céu a noite.

Essa história se espalhou no bairro quando alguma criança voltou do parque contando que tinha visto ele lá.

Aí a gente PAROU DE IR NO PARQUE, de verdade, por semanas…

Até que um dia (eu juro) um carro da polícia florestal foi lá e tirou uma cobra gigante (acho, não vi) de dentro do parquinho.

Pronto. Boitatá.

– Ai, mas era só uma cobra, então, AB.

Nããããããããão. Porque tinha as bolas de fogo. E a contação de história. E a magia.

Tinha visagem lá nesse parquinho também.

(Nota aos jovens da geração kinder ovo com brinquedo ruim: Visagens são tipo fantasmas, só que eles moram em cidades pequenas dos anos 90.)

A visagem fazia as balanças mexerem sozinhas.

SOZINHAS!!!!

– Será que não era o vento, AB?

Era a visagem!!! E a magia.

Presta atenção, poxa!

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