O Vampiro, o besouro e outras confissões

Sobre Dalton Trevisan (parabéns! 94 anos no dia 14 de junho!), um de seus amigos (sim, ele os tem)  recordou um episódio. Lá por 1970, seus livros começaram a ganhar o mercado externo. Ou, como diriam mais tarde, começavam a bombar. […]

Sobre Dalton Trevisan (parabéns! 94 anos no dia 14 de junho!), um de seus amigos (sim, ele os tem)  recordou um episódio. Lá por 1970, seus livros começaram a ganhar o mercado externo. Ou, como diriam mais tarde, começavam a bombar. O primeiro deles foi Novelas Nada Exemplares, traduzido para o espanhol, inglês, alemão e, quem diria, na época, holandês.

Conforme relato do próprio Vampiro de Curitiba, foi com o tradutor na Holanda que a porca (quase) torceu o rabo. Afinal,tradução traição… Em um dos contos, Dalton fala do besouro que se debate do lado de fora da janela. Besouro? O tradutor, muito compenetrado, buscou de todas as formas a mais fiel das transposições, até porque, como já se disse, tradução traição. Mas qual seria o correspondente mais próximo de besouro para um leitor da Holanda? O tradutor, sem querer ser traidor, patinava. Só chegava perto… Meticuloso ao extremo, afinal é atleticano e da velha Baixada, as traduções vinham e Dalton mandava de volta, devolvendo o texto p ara desespero do editor e, por supuesto, do coitado do tradutor.

Tudo culpa do besouro sem uma imagem correspondente. Lá pelas tantas, o Vampiro não teve dúvida: capturou um besouro, colocou o dito cujo em uma caixa de fósforos (da marca Pinheiro) e despachou o bichinho para a Holanda. Já pensou se fosse barrado na alfândega, tráfico de besouros?

Passado bom tempo, depois de acurado exame do besouro in natura e muitas acrobacias mentais, lá na Holanda o tradutor achou um inseto de semelhança e trejeitos mais indicados para transpor para a cuca do leitor holandês o que seria o tal de besouro. E ele, o leitor de bandas distantes, pôde beber água de fonte segura. Tradução sem traição.

É, parece brincadeira, mas existem 300 mil tipos de besouros, embora todos pertençam a uma mesma  família, a doscoleópteros.

Confissões do Vampiro adolescente.  Ainda do Dalton, em O Vampiro de Curitiba, reedição, 1974:

– Adolescente, meu ideal era ser corredor de 110 metros sobre barreira. Jovem de bigodinho, sonhei ser farol de dancing, o galã amado por todas as táxi girls. Nem atleta, nem bailarino de gravatinha borboleta, meu lugar é entre os últimos dos contistas menores.

 – Um herói solitário é a soma de não sei quantas pessoas. No fundo de cada personagem há um pouco de mim. Nelsinho, odelicado, é certo que sou eu. Também sou GigiNanáFirififi. Vampiro, sim, mas de almas. Espião dos corações solitários.

Um escorpião de bote armado, eis o nosso grande contista.

PS – A quem interessar possa, besouro na Holanda é conhecido como kever.

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