Filme americano dos anos 70, preto e branco. A cena é rápida e se passa atrás das grades de uma penitenciária. Um preso puxa conversa com outro:
– Quero fumar…
– Cannabis sativa?
– Não. Cancerus americanus filtrus…
Pois é. Essa saiu do fundo do baú por conta da tal fake news e o cigarro.
Houve época em que era comum ouvir a sentença “mentira tem perna curta”. Quer dizer: ela não iria muito longe, sendo desmascarada de uma hora para outra. Nem sempre, é claro.
Embora pareça uma coisa recente, fake news é algo bem mais antigo do que aparenta. Tornou-se (altamente) popular pelo uso desenfreado das redes sociais. Ou antissociais, como preferem alguns. Era, então, o que recebeu o carimbo de propaganda enganosa.
E, envolvendo o poderoso lobby da indústria do cigarro, o assunto mereceu em julho de 2017 uma sensacional matéria da revista Carta Capital, texto do médico Drauzio Varela, com reprodução de requintados anúncios a favor do tabaco (Chesterfield, Camels, Marlboro, Hollywood) e o certeiro título Serial killers.
Trechos:
– Fake news “quando ainda se chamava propaganda enganosa: médicos receitavam veneno, ou seja, faziam propaganda de cigarros. A designação “baixos teores” de nicotina era arbitrária e desprovida de qualquer outro sentido que não o mercadológico”.
Médicos, além do Papai Noel e do ator Frank Sinatra, recomendavam marcas de cigarros. “More doctors smoke Camels”. E até um bebê aconselhava Marlboro cigarettes: Gee, Mommy you sure enjoy your Marlboro. E, no anúncio (ou reclame, como se dizia), a mamãe respondia:
– Yes, you need never feel over-smoked… that’s the Miracle of Marlboro!
Como destaca a matéria, “a designação baixos teores de nicotina era arbitrária e desprovida de qualquer outro sentido que não o mercadológico”.
Ainda da Carta Capital:
– A associação entre cigarro e câncer de pulmão foi estabelecida nos anos 1950. Naquele tempo, o poder de dissuasão da indústria tabaqueira era enorme.
Adendo do Plural: no Brasil, a lei 8.069, de 1990, determinou que as carteiras de cigarro estampassem o aviso: venda proibida para menores de 18 anos. Outra lei, de número 10.702, reforçou a proibição em 2003. O resultado? Igual ao de tabuletas com os avisos “não pise na grama”, “atravesse na faixa”, “favor não buzinar”, “puxe a descarga ao sair”…