The Mandalorian e as muitas camadas de um tema musical

Vamos falar de Ludwig, não o Beethoven, o Göransson

Confesso que uma das razões que me levou a assinar o Disney+, assim que o serviço chegou ao Brasil, foi a série The Mandalorian. Decepcionado com a desastrosa nova trilogia de Star Wars, estava ansioso por um produto que fosse consistente e digno de atenção. Até aqui valeu o investimento, porque em termos musicais a série é muito boa, vindo das mãos do compositor sueco Ludwig Göransson, de 36 anos, que já carrega na bagagem o Oscar de melhor trilha sonora por seu trabalho no filme solo do Pantera Negra.

É inevitável a associação de seu nome ao do xará famoso, Ludwig van Beethoven, que consolidou o piano como o instrumento que conhecemos hoje. No entanto, as semelhanças não se resumem ao nome, elas estão também na escrita musical. Beethoven trabalhava com o desenvolvimento de motivos melódicos e rítmicos, a exemplo do que ocorre no primeiro movimento de sua “5.ª Sinfonia”, quando o famoso Pan-Pan-Pan-Pan se repete ritmicamente, porém em diferentes relações intervalares. A mesma estratégia foi adotada por Göransson para a composição do tema em questão, apresentando inicialmente um motivo simples tocado numa flauta baixo, que se desenvolve gradualmente e ganha densidade quando passa a ser tocado por diferentes naipes orquestrais, levando a um clímax que é, ao mesmo tempo, dramático e triunfante.

Esse mesmo motivo vai ser inserido em outras peças que integram a trilha, como é o caso de “Ashoka Lives” e “Come with Me”, obras musicais que estão em dois importantes episódios da segunda temporada. Esta última, por sinal, carrega uma escrita contrapontística de roupagem barroca.

Ludwig Göransson e sua flauta baixo. Crédito da foto: divulgação.

Bastidores

A Variety publicou um vídeo em seu canal que detalha os bastidores da composição do tema principal, expondo o processo produtivo de Göransson, que começa com o próprio músico gravando as guias de instrumentos acústicos e virtuais em seu estúdio particular, para depois finalizar a gravação com a orquestra em um estúdio de grandes proporções. O compositor explica que buscou incorporar à música de The Mandalorian as memórias que tinha de Star Wars, de quando era criança. Isso fica evidente através da peça “Open the Door”, que faz uma citação ao “Tema da Força”, presente nos filmes da saga desde o seu capítulo original, em 1977.

Além disso, percebe-se forte influência dos filmes de samurai e dos faroestes. No primeiro caso essa percepção vem dos desenhos rítmicos adotados, que se unem ao motivo principal, exposto na flauta; enquanto que no segundo a conexão se dá também com a personalidade do protagonista, por se tratar de um homem errante, cujo passado obscuro mescla-se ao modo com que ganha a vida driblando o sistema convencional, em outras palavras, um fora da lei. Outro fator importante da composição, considerando agora um horizonte mais amplo, é a ligação entre a música e os demais elementos presentes nas cenas, o que coloca a trilha musical como parte da paisagem sonora exposta no vídeo, algo que se vê nas obras do mestre Ennio Morricone (1928-2020). 

Ao longo de toda a trilha são ouvidas diversas surpresas musicais interessantes, que denotam a escrita de um compositor habilidoso, tanto nas formas tradicionais quanto nas novas tecnologias. A julgar pela qualidade e por sua juventude, certamente ainda ouviremos muito sobre esse novo Ludwig.


Para ir além

O tema de The Mandalorian, executado pelo próprio compositor.

Making of da produção do tema musical da série.

Trilha sonora da segunda temporada de The Mandalorian.

As performances musicais em Soul

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