Hoje começo a coluna lembrando de um ano atrás, quando sofri um ataque hater em fevereiro de 2021. A motivação dos discursos de ódio a mim dirigidos ainda é muito significativa: minha luta pela igualdade menstrual.
O tema é de fato pouco compreendido. Alguns consideram a falta de absorvente como supérflua. Mas, na verdade, esse argumento só reforça a importância “de um mísero absorvente”.
Quando falamos em absorventes, falamos de três grandes eixos, a tríade da pobreza menstrual: falta de acesso e exclusão social; falta de informação e entendimento sobre o próprio corpo; e falta de estrutura, como saneamento ou água encanada.
Quando falta absorvente, sobra tabu
A menstruação ainda é vista como um fator limitante na vida de meninas, mulheres e homens trans. O ciclo menstrual é considerado como doença ou incômodo, e a consequência disso são gerações e gerações crescendo sem conhecer o próprio corpo. Segundo o Fundo de População das Nações Unidas e UNICEF, 73% das jovens dizem sentir constrangimento ao menstruar.
Quando falta absorvente, sobra exclusão
Quando uma menina, mulher ou homem trans não tem acesso a um absorvente, não consegue estudar ou trabalhar. A consequência é um processo gradativo de exclusão que mantém essas pessoas à margem da sociedade, impedindo o desenvolvimento de sua autonomia e liberdade. Tanto que, para se ter ideia, 1 em cada 4 meninas falta à escola durante o período menstrual, chegando a perder 2 meses de aula por ano (Relatório da Pobreza Menstrual no Brasil, UNICEF).
Quando falta absorvente, falta água encanada
A pobreza menstrual também reflete a falta de saneamento básico no Brasil. 30% das pessoas no país ainda não têm acesso a saneamento, enquanto 3% das escolas e 2% das residências sequer têm banheiro. Até hoje, são 713 mil meninas que vivem sem acesso a banheiro ou chuveiro em casa.
Curitiba pode ser uma cidade vanguarda no combate à pobreza menstrual
A pobreza menstrual é um problema universal, que acomete pessoas de diferentes regiões e classes sociais. Em Curitiba não é diferente, mas a cidade pode estar prestes a se tornar um exemplo para o país, que recentemente vetou uma política nacional de combate a essa vulnerabilidade.
Na semana do Dia Internacional da Mulher, a Câmara Municipal votará o Projeto de Lei n.º 005.00063.2021, que institui uma Campanha de Conscientização do Ciclo Menstrual em Curitiba. A proposta orienta a realização de atividades educativas nas escolas públicas da cidade, com o objetivo de conscientizar estudantes, pais e mães, professores e equipes pedagógicas sobre o ciclo menstrual. Além disso, o texto indica a distribuição gratuita de absorventes higiênicos, calcinhas e coletores para as estudantes da rede municipal, via utilização de recursos oriundos do Programa Fundo Rotativo, destinado às Unidades Educacionais da Secretaria Municipal de Educação.
Para quem chegou a ser atacada por defender a distribuição gratuita de absorventes, liderar a oportunidade de aprovar uma política pública inovadora em Curitiba é comprovar que vale a pena trabalhar pela verdadeira nova política.
Sobre o/a autor/a
Maria Letícia
Vereadora de Curitiba, vegetariana, médica especialista em Ginecologia e atua como médica legista de carreira no IML do Paraná. Também é fundadora da ONG MaisMarias, que atua no combate à violência contra as mulheres.