O Velho Testamento

Cada livro, cada filme ou série ou música, traz pra mim um monte de referências. É uma mistureba

Já escrevi antes, aqui, coluna sobre pessoas e lugares que merecem ser conhecidos. E também outra sobre literatura e cinema – especialmente diretoras e autoras. Em ambas, parei, por falta de tempo e porque meus interesses vão mudando.

Re-re-inauguro hoje uma coluna que pretende discorrer sobre livros e também audiovisual. Cada livro, cada filme ou série ou música, traz pra mim um monte de referências. É uma mistureba.

Pra começar, porquê não falar da Bíblia? Vou discorrer sobre Gênesis, ilustrado por Robert Crumb, de 2007. E sim, ele está vivo. E é um grande artista!

A edição da Conrad, de 2009, é um primor. Tradução de Rogério de Campos! Nesses tempos obscuros que estamos vivendo, parece, ainda mais, uma raridade. Revisores, tem quatro… Na equipe da editora, muita gente com sobrenome japonês – porque será…?

“Eu, R. Crumb, (…) reproduzi fielmente cada palavra do texto original (…) me abstive de ser indulgente nessa “criatividade” e, por vezes, mantive sua intrincada vagueza, em vez de balbuldiar um texto tão venerável”.

Isto é parte da introdução assinada por Crumb. Mais:

“Muitos estudiosos percebem nelas (as palavras) sentidos e intenções antigas e perdidas (…) e o triunfo do patriarcado sobre o antigo matriarcado”.

Sim: o Velho Testamento é uma leitura, além de tudo, feminista. 

Experimente ler a Biblia em voz alta. Pequenos trechos. E com alguém que conheça pelo menos um pouco dela. O mais importante: atente à tradução. Evite as edições que resumem e/ou tentam explicá-la. Melhor nem ler.

O artista usa uma técnica tão apurada que fiquei imaginando como que ele ilustrou 200 páginas em quadrinhos.

Mistureba

Fiz uma playlist inpirada na Bíblia. Chama-se Genesis. No Spotify: Bia Moraes. 

Como filme: A Última Tentação de Cristo, de Scorcese. Tem David Bowie. Willen Dafoe. Harvey Keitel. Barbara Hershey. Não preciso dizer mais. Tem no YouTube, Google Play e outras plataformas de streaming.

Aqui um trecho do Velho Testamento. Salmo 23 (eu encontrei conforto e amor nesse trecho):

O Senhor é meu pastor, nada me faltará. Deitar-me faz em verdes pastos, guia-me mansamente a águas tranquilas.

Refresca a minha alma; guia-me pelas veredas da Justiça, por amor de seu nome.

Ainda que eu andasse pelo vale da sombra da morte, não temeria mal algum, porque tu estás comigo; a tua vara e o teu cajado me consolam.

Preparas uma mesa perante mim na presença dos meus inimigos, unges a minha cabeça com óleo, o meu cálice transborda.

Certamente que a bondade e a misericórdia me seguirão todos os dias da minha vida; e habitarei na casa do Senhor por longos dias.

Alex Castro (@outrofobia no Instagram), um escritor que dá vários cursos – entre eles um sobre a Bíblia – escreveu no site dele (é uma categoria do site com todos os textos dele sobre o Genese):

Alguns dos momentos mais belos, mais humanos, mais surpreendentes da Bíblia são quando humanos tem a temeridade de interpelar a Deus, de questionar sua justiça, de barganhar com ele pelas vidas e pelas almas de seus irmãos.

O melhor momento de Abraão, certamente, é quando barganha com Deus pela vida dos sodomitas. Não deixa de ser surpreendente tanto destemor: afinal, nós já o vimos cafetinando sua mulher, tanto por autopreservação quanto por cobiça, e também entregando uma escrava inocente à sanha de uma senhora ciumenta apenas para não se estressar. Abraão claramente coloca sua própria vida acima de tudo, inclusive de sua descendência — senão, não aceitaria matar seu único filho.

(…)

Abraão argumenta com insistência, impertinência, agressividade, e só pára quando Deus claramente já perdeu a paciência e parece pronto a esmagá-lo como se fosse uma formiga. 

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