O autor que abriu meus olhos para a história do Brasil

Li com prazer e curiosidade os três primeiros livros de Laurentino Gomes. Ele me fez menos bobo e mais brasileiro

Vou confessar algo que não é motivo de orgulho para mim. Sempre tive dificuldade para ler a história do nosso Brasil escrita por historiadores. Muita gente pensa que só leio os clássicos da literatura, as grandes obras, mas não é assim. Sou apaixonado por escritores que levam anos escrevendo, reescrevendo, voltando e refazendo capítulos, todo esse trabalho pensando em nós, leitores comuns, que vamos “viver” o livro.

Acredito que um bom livro é aquele que me lê, aquele que não dá vontade de deixar para amanhã. Para mim, livro não pode ter parte chata e parte boa. Esse é o segredo dos grandes homens e mulheres da escrita. Facilitar nossas vidas, sem nos enganar.

Li com prazer e curiosidade os três primeiros livros de Laurentino Gomes. Ele me fez menos bobo e mais brasileiro. Aprendi muito com ele sobre olhar para trás para entender o presente.

Em 2008, convidei Laurentino para vir a Curitiba e conversar conosco sobre o livro “1808” no Conversa entre Amigos, o grupo de leitura que organizo há mais de dez anos. Foi maravilhoso, mas ocorreu um pequeno incidente que agora eu relembro com leveza, mas que naquela noite (11 de julho de 2008) me deixou tenso. Havia um historiador sentado na primeira fila do público e ele pediu a palavra. Eu repassei o microfone para ele… Para quê? O homem soltou os cachorros no Laurentino Gomes. O tempo foi passando e todo mundo incomodado, com vergonha alheia da enxurrada de críticas e questionamentos. Eu querendo confiscar o microfone da mão do homem e então o Laurentino me cochichou: “Calma, Marcelo! Eu sei lidar com essa situação.” Sabia mesmo.

Resumo da história: era pura dor-de-cotovelo diante do Laurentino, que era a bola da vez.

Em 2010, trouxe Laurentino para lançar no meu grupo de leitores o “1822”. Faltou cadeira no evento. Tinha tanta gente que não deu para abrir para perguntas. Em 2014, já com o livro “1889”, fizemos nosso evento em Ponta Grossa. De novo, muita gente, fotos e pedidos de autógrafos. Assim acompanhei o lançamento da primeira trilogia e compartilhei com meus amigos.

Agora em setembro estivemos juntos. Ele veio para Curitiba lançar “Escravidão”, o primeiro volume de uma nova trilogia. Tomamos um café e batemos um papo: eu, ele e Carmen, sua esposa, que por sinal é uma pessoa maravilhosa. Compartilho com vocês o que ele me contou sobre a produção desses novos livros. Laurentino foi uma dezena de vezes à África, passou seis meses em Portugal e três meses nos Estados Unidos para pesquisar nas melhores bibliotecas do mundo, que estão lá. Sabe quantos livros ele leu em seis anos a respeito do assunto da trilogia? Duzentos.

Antes de terminar, quero contar uma pequena história. Em 2010, propus a Laurentino uma palestra no interior do Paraná. A cidade escolhida foi Inácio Martins, a 200 quilômetros da capital, limítrofe com Irati, Guarapuava e Prudentópolis. População de Inácio Martins: 12 mil habitantes. Ele topou. Cheguei na casa da mãe dele em Curitiba, onde ele estava hospedado, às cinco da manhã e dali seguimos de carro para o nosso destino. Lá, muitas crianças e educadores nos esperavam. Foi absolutamente lindo! Um escritor do mundo ali, com crianças de uma escola pública de uma pequena cidade. Já chegando ao fim do evento, uma senhora se levantou e me dirigiu uma pergunta: “Não te entendo, Marcelo Almeida, por que não levar o Laurentino para Guarapuava, que é um município maior e com mais recursos e sim a Inácio Martins?”

Eu respondi: “Porque são as cidades menores que mais precisam de mais acesso aos livros e de mais autoestima.”

Aquele dia ficou como uma experiência maravilhosa na minha memória.

Na Amazon: Escravidão – Vol. 1: Do primeiro leilão de cativos em Portugal até a morte de Zumbi dos Palmares. Globo Livros. 504 pgs.

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