Aprender a viver é um privilégio dos humanos

Marcelo Almeida fala de filosofia e de como ela é capaz de ajudar o ser humano a enfrentar os dilemas da vida

Recentemente, em um grupo de leitura da Aliança Francesa, conversamos sobre um livro do Luc Ferry. O título escolhido foi Aprender a Viver – Filosofia para os Novos Tempos, que eu tinha lido há muitos anos. Mas achei melhor relê-lo. Luc Ferry é filósofo e foi ministro da Cultura da França.

Este livro é um sucesso por causa de uma sacada: ele apresenta a filosofia de forma compreensível e sem perder o conteúdo. Eu mesmo gosto de ler filosofia, mas uma filosofia que eu consiga entender. O próprio Ferry diz que a maioria das obras sobre história da filosofia que a gente encontra nas livrarias são áridas demais ou chatas. O livro dele não é uma coisa nem outra.

O segredo de Aprender a Viver é desvendado já no prólogo: o livro nasceu a partir de umas aulinhas de filosofia que Luc Ferry deu para os filhos de amigos durante as férias. Ou seja, primeiro veio a contação de história para um público leigo. A oralidade sempre favorece a simplicidade.

Eu mesmo gosto de contar histórias (fiz aulas de contação, que me ajudam bastante) e dou muitas palestras, além de ser comentarista de rádio. Sei que para cativar a atenção de uma plateia é preciso usar frases curtas e com conteúdo. Nada de enrolação!

Hoje recomendo este livro para quem quer se aproximar da filosofia ou procura uma reflexão mais profunda sobre a vida. Uma ideia que ele traz e de que gosto muito é a de que o ser humano, ao contrário de outros animais, nasce frágil e ignorante e vai se formando ao longo de muitos anos, ou seja, vai aprendendo a viver. Um pássaro, um cachorro ou um macaco aprendem logo nos primeiros dias de vida ou no máximo nas primeiras semanas, instintivamente, tudo o que precisam saber para sobreviver. Já nós atravessamos toda a infância dependentes de nossos pais. As crianças se estruturam até os sete anos, mas isso não quer dizer que já sabem muito sobre a vida. Quando chegarem aos 14 anos terão outra carga de informações e aos 21 serão pessoas totalmente diferentes. E seguirão aprendendo até o fim de suas vidas.

Claro que a gente pode “jogar os betes” depois de levar umas bordoadas da vida e achar que já sabe tudo que dá pra saber… Aí que entra a filosofia para mostrar que sempre tem um ângulo novo para ser explorado e que o que parece não fazer sentido nas nossas vidas esconde segredos sobre nós mesmos.

Ferry pede pra gente imaginar um gato diante de uma tigela de alpiste ou um pássaro diante de um filé mignon. Vão morrer de fome, mas não vão comer o que não faz parte da dieta deles. Já o homem faminto comeria o alpiste, o mignon, o gato e o pássaro porque faz parte da natureza humana empreender, inovar, experimentar.

A ideia de que vamos nos formando aos poucos me motiva a fazer palestras para públicos diferentes e por todo o Paraná. Quando falo em uma cidade pequena do interior, que não tem livraria, vejo a curiosidade nos olhos das pessoas que me ouvem. Eles querem ideias, reflexões, referências! Ao final, sempre me abordam e pedem para eu repetir os nomes dos autores que citei porque querem anotar. Um dos autores que eu cito é Luc Ferry.

Se eu gasto meu tempo e minha energia falando para tantas pessoas que nem conheço é porque acredito que o ser humano pode melhorar, aprender, desabrochar.

Luc Ferry também aborda o grande tema que assombra o ser humano: a morte. No fundo, a gente quer aprender a viver porque sabe que vai morrer. Queremos aproveitar melhor o que temos por sabermos que não vai durar pra sempre. O tema morte me assusta e acredito que assuste também muitas outras pessoas. Como lembra Ferry, o ser humano é o único animal que tem consciência do fim e por isso se angustia. A filosofia nasceu dessa angústia e pode ser usada como uma ferramenta de superação.

 

Para ir além

Aprender a Viver – Filosofia para os Novos Tempos, Luc Ferry, Editora Objetiva, 240 págs,

 

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