Agindo para solucionar o efeito e esquecendo a causa

Leis populistas só dão falsa impressão de segurança, diz Isabel Kügler Mendes

No Brasil, infelizmente o Estado sempre chega tarde e acaba agindo na busca de soluções para o efeito e não para a causa de determinada questão. Isso vale para o desemprego, como vimos com a tão propagada Reforma Trabalhista de Michel Temer, que com os cortes de direitos trabalhistas traria os empregos de volta. Não, o desemprego só aumentou de lá para cá, Temer já deixou o Palácio do Planalto e estamos com 13 milhões de pessoas na rua da amargura, segundo o IBGE.

Isso vale também para o tratamento dispensado ao crescente consumo de drogas no país. O que vemos nas ruas são verdadeiros mortos-vivos, zumbis debilitados pelo consumo de entorpecentes como o crack. Mas quais medidas o Estado tomou para enfrentar a causa do problema? Exceto algumas iniciativas tímidas, como a desenvolvida em São Paulo na gestão Fernando Haddad, quando a prefeitura disponibilizava casa, comida e empregos aos usuários, as medidas mais usuais são o endurecimento prisional, jogando atrás das grades usuários que se aproximam do tráfico para manter o vício.

Os exemplos acima são duas portas que abrem caminho para um outro flagelo nacional: a superlotação do sistema penitenciário brasileiro. Temos a terceira maior população carcerária do mundo, com cerca de 800 mil pessoas presas. A média de idade é de 25 anos. Isso tem um custo. Perdemos jovens que poderiam estar produzindo para o país crescer. Pior, como sempre chega atrasado, o Estado tem de dispor de recursos para construir prisões e para custodiar essas pessoas.

No senso comum, usar dinheiro público para manter pessoas atrás das grades é desperdício de recursos. Concordo. Em média, a manutenção de um preso custa R$ 3 mil. Se o detento estiver em uma penitenciária privada, passa de R$ 4 mil. O melhor seria usar esses recursos para construir escolas e pagar bons salários a professores. O dinheiro seria mais bem aplicado se o Estado criasse políticas públicas inclusivas. Mas como o Estado corre para atacar o efeito do problema, surgem iniciativas como uma que tramita no Senado.

O plenário da Casa deve analisar em breve o Projeto de Lei 580, de 2015. De autoria do senador Waldemir Moka (MDB-MS), a proposta altera a Lei de Execução Penal para obrigar o preso a “ressarcir” as despesas com a sua manutenção no sistema prisional, “mediante recursos próprios ou por meio de trabalho”. No projeto, o senador não leva em consideração que a grande maioria da população carcerária no Brasil é formada por pessoas oriundas das classes mais pobres do país. O parlamentar também não se atém ao detalhe de que seria o próprio Estado quem deveria oferecer oportunidade de trabalho e não o faz. É o que está previsto na Lei de Execução Penal, como forma de ressocialização, mas apenas 18,9% dos detentos têm acesso a um emprego nas cadeias do país.

Em vez de fiscalizar a aplicação das leis já existentes, uma parte da classe política busca dar respostas fáceis a uma sociedade amedrontada, que clama pelo endurecimento da lei com a falsa sensação de que é isso o que vai trazer segurança. Muitas vezes a proposição de projetos como esse que tramita no Senado só serve para responder a um clamor, sem que isso traga efeito ou resultado prático.

Vale lembrar, também, que o direito penal repressivo, como muitos defendem, custa mais dinheiro aos cofres públicos. A utilização de penas alternativas, além de diminuir os custos do sistema, ajuda evitar que mais pessoas entrem para o crime.

Diante desse cenário, o que podemos esperar?

 

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