Por conta da reclusão, para reforçar o combate ao Covid-19, a tal gripezinha, há quem, impossibilitado de ir a uma livraria, já que faz questão de percorrer as estantes e bater continência a grandes autores, tenha recorrido a um livro ao alcance da mão. Até porque, e infelizmente, é mais do que atual. Atualíssimo:
– Ideias para Acabar com os Picaretas – Cidadania Ativa e Poder Legislativo, de Chico Whitaker, Editora Paz e Terra, 1994.
Trata-se de um manual para abater os picaretas. Como ressalta o autor, “picaretas não faltam no Brasil – ninguém pode negar. Mas estão longe de ser a maioria do povo brasileiro. O mesmo não acontece no Congresso, nas Assembleias Legislativas e nas Câmaras de Vereadores”. Faltou o governo central. Obviamente entraria na lista, e com destaque, numa reedição para atualizar o livro.
Os “golpes de cidadania”
Como a democracia plena é um longo e penoso aprendizado, o livro traz uma contribuição singela, mas extremamente importante para isso:
– Trata-se de um manual para ensinar o eleitor a identificar os políticos “picaretas”, para abatê-los, sem piedade, a “golpes de cidadania”.
Ao sugerir trabalho por etapas, Chico recomenda que o cidadão “deve se limitar ao que se pode conhecer”, até chegar a uma lista final. E dá a receita:
1) Proceder por eliminações progressivas.
2) Excluir os candidatos “laranjas” (“candidatos que não perdem nada porque não pretendem gastar muito dinheiro em suas campanhas; muitas vezes até ganham alguma coisa, aliciados como cabos eleitorais pelo candidato ao Executivo”).
3) Excluir os candidatos de partidos picaretas (“há pequenos partidos com propostas sérias e pequenos partidos sabidamente montados com objetivos de picaretagem”).
4) Analisar os partidos (“Nesse ponto, a lista já deve ter começado a emagrecer”).
5) Separar novos candidatos de candidatos à reeleição (“Será mais fácil – para separá-los – conhecer os candidatos à reeleição: sua atuação no mandato”).
6) Analisar a atuação parlamentar dos candidatos à reeleição (“Para pontos negativos está a apresentação de projetos oportunistas, clientelistas, suspeitos… Mais o crescimento de seu patrimônio pessoal…”).
7) Analisar as histórias de vida (no caso dos picaretas, “sua entrada na política não pretende senão uma promoção – a maior – na carreira da picaretagem”).
8) Analisar os gastos de campanha (“Campanhas milionárias são facilmente detectáveis – outdoors são caros, um número muito elevado de muros pintados, às vezes exatamente com a mesma técnica, denota trabalho profissional bem pago e prováveis pagamentos também aos donos dos muros”… “o terreno da tia que foi vendido também não justificará muitos gastos”; “campanhas muito caras têm bastante probabilidade de serem financiadas com dinheiro obtido pelo candidato mediante manipulações indevidas de recursos públicos, pessoalmente ou por meio do partido que o financia – não é outra a tradição brasileira. Se isso não ocorreu, será preciso demonstrá-lo de maneira convincente”).
9) Analisar o conteúdo da campanha (“As propostas, sua maneira de ver o trabalho parlamentar, a maneira como pretende se relacionar com seus eleitores no cumprimento do mandato”).
10) Analisar o candidato como pessoa (“O que pode ser feito pela observação ou entrevista direta”).
11) Elaborar e – se possível – divulgar uma lista final.
12) Escolher o nosso candidato pessoal (“Cada um de nós terá sua preferência a partir dos próprios valores e opções políticas locais”).
Pressão da sociedade
Recado do Chico Whitaker:
– Os parlamentares não mudarão sem uma pressão que venha de fora, da própria sociedade que representam. O primeiro tipo de pressão possível é sobre a sua composição, que resulta do processo eleitoral. Continuemos afinando a pontaria. Os candidatos em geral e os picaretas em particular não estão acostumados com isso.
PS: já que a tragédia (genocida) está consumada e é impossível voltar no tempo, resta aguardar os acontecimentos e as próximas eleições. Com a pontaria devidamente afinada.