Antes do Seproc e da Serasa…

Camargo relembra a trajetória dos "vermelhinhos", cobradores que faziam plantão na casa dos devedores

A cena aconteceu na semana passada: quase seis e meia da tarde, expediente encerrado, quatro operários entram no bar (Luzitano) para tomar uma (merecida) cervejinha. Meio espantado, um cliente volta ao passado: como o quarteto trajava uniforme totalmente vermelho, veio-lhe à memória velhos personagens da vida curitibana – os cobradores de vermelho. Isso mesmo.

Nos anos 70, antes do Seproc (Serviço de Proteção ao Crédito) e da Serasa (Centralização de Serviços dos Bancos), existia uma empresa de caráter público “responsável por reunir informações, fazer análises e pesquisas sobre as pessoas físicas e jurídicas que estão com dívidas financeiras”. Aí, muita gente recorria aos cobradores de vermelho para colocar em xeque os caloteiros.

Pra todo mundo ver (e ficar sabendo)

Os cobradores que se vestiam de vermelho faziam plantão diário na frente da casa do devedor – até receber o dinheiro. Como foi devidamente registrado, “o constrangimento público do devedor diante dos amigos e vizinhos apressava o pagamento”. Os ‘‘vermelhinhos’’ – como ficaram conhecidos em Curitiba – desapareceram com a intervenção da regional da Ordem dos Advogados do Brasil. E, depois, o Código de Defesa do Consumidor proibiu qualquer atitude semelhante.

Como escreveu, anos atrás, o jornalista Roger Modkovski, hoje no G1/São Paulo, “na Curitiba da década de 60, o Perigo Vermelho não vinha de Moscou/URSS. Estava instalado na própria cidade, mais precisamente na Avenida João Gualberto”.

Era o endereço da “Agência de Cobrança Os Vermelhos do Paraná”, mais conhecidos como “os vermelhinhos”. Tudo começou quando alguns funcionários públicos exonerados (rapazes entre 16 e 18 anos) resolveram montar uma firma de cobrança.

Começaram por baixo, cobrando contas penduradas em armazéns, com vendedores ambulantes, até se arriscarem mais e intimar o inquilino devedor para receber aluguel atrasado.

A primeira visita era feita à paisana.

Bem educados, deixavam cartão de apresentação.

Ainda da narrativa de Roger:

Caso acontecesse uma segunda visita é que entrava então o ingrediente interessante: o rapaz ia de uniforme vermelho com a identificação “COBRADOR” às costas.

Na rua todo mundo parava “para ver quem era a vítima”, que, “vermelha de vergonha”, pagava.

Os vermelhinhos também facilitavam, faziam qualquer acerto naquela época de inflação baixa.

Ainda assim alguns devedores partiam para a “ignorância”.

Não foram poucos os casos de “vermelhinho” que saiu correndo de caloteiro, esquecendo até da bicicleta, veículo indispensável ao trabalho.

Com o tempo e a experiência, passaram a agir em duplas para intimar o devedor.

As bicicletas foram substituídas por lambretas – vermelhas, é claro.

Prósperos, os “vermelhinhos” mudaram o escritório para a Praça Generoso Marques.

Mas o terror dos trambiqueiros não durou muito mais.

Receberam sinal vermelho do chefe de polícia, que achou ilegal o tipo de cobrança.

Isso quando o ramo estava se tornando bastante lucrativo.

Tanto é que não tardaram a aparecer imitações.

Também foi criada outra agência, que funcionava no mesmo sistema.

Tudo igual. A única diferença era mesmo a cor utilizada, já que os rapazes tinham uniforme verde. Não era para menos.

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