República dos coroneis

O resultado desse pacto foi o enfraquecimento das oposições, a fraude eleitoral e a exclusão da maior parte da população de qualquer participação política

A instalação da República em 1889 foi insuficiente para que a população tivesse condições de escolher livremente seus governadores. A Primeira República, também chamada de República Velha, perdurou até 1930 e foi marcada – em todo o país – pelo coronelismo, controle político oligárquico e o chamado “voto de cabresto”. No Paraná, a situação não fugiu deste padrão.

O principal mecanismo político desse período foi a chamada “política dos governadores”, estabelecida pelo segundo presidente civil, Manoel Ferraz de Campos Salles, a partir do ano de 1898. Esse arranjo teve como base o seguinte acordo: o governo federal garantia ampla autonomia aos grupos oligárquicos dominantes de cada Estado e, em troca, as bancadas estaduais lhe davam apoio político no Congresso. Desta forma, só tomavam posse os deputados eleitos e indicados pelos governadores.

O resultado desse pacto foi o enfraquecimento das oposições, a fraude eleitoral e a exclusão da maior parte da população de qualquer participação política. “O controle político oligárquico também era assegurado pelo voto aberto e pelo reconhecimento dos candidatos eleitos não pelo Poder Judiciário, mas pelo próprio Poder Legislativo.

Como o Congresso sofria a influência do presidente e dos governadores, esse mecanismo dava margem à chamada “degola” dos candidatos indesejáveis”, destaca material histórico publicado no site da Câmara dos Deputados. Ou seja, quem não era apoiado pelo grupo dominante era sumariamente excluído do processo eleitoral. 

“Além de disporem de toda uma rede de favores de natureza econômica, os governadores também conseguem apoio político federal para se perpetuar no poder. […] O problema básico consistia na falta de regras claras a respeito da sucessão de poder”, escrevem Mary del Priore e Renato Venancio.

Paraná

No Paraná, em tese, a votação seria por sufrágio universal, conforme previa a Constituição estadual de 1892 – a que durou mais tempo durante a República Velha (foi substituída por outra apenas em 1927). No artigo 36, a Carta Magna paranaense apontava: “O poder executivo é confiado a um cidadão denominado ‘Governador do Estado’, que será eleito pelo voto direto do povo, com mandato por quatro anos”.

Segundo o artigo 108, tinham o direito de voto cidadãos brasileiros, homens, maiores de 21 anos, que soubessem ler e escrever.

No entanto, uma brecha legal chama a atenção: “As eleições se farão por escrutínio secreto, garantindo-se, entretanto, ao eleitor a faculdade de assinar sua cédula, quando assim o queira fazer”. Ou seja, o voto poderia ser facilmente identificado! Na prática, o voto secreto não passava de uma falácia.  

“O controle das eleições era realizado pelos coronéis, via sistema coronelista, onde persuadiam a população votante, dependente destes agentes, pobres, desinformados dos princípios republicanos e do valor do voto. Quando necessário, os coronéis usavam da força para coagir os eleitores e tb. os opositores”, ressalta a pesquisadora Mônica Helena Harrich Goulart, doutora em Sociologia e autora do livro “Coronelismo e poder local no Paraná (1880-1930)”.

Assim o que ocorria era o chamado “Voto de cabresto”: Voto em eleições controladas e administradas por pessoas que dominavam a política de determinada região, município ou estado. “Também lembro que o voto não era secreto e não era obrigatório. Daí as artimanhas dos políticos para um ‘envolvimento mínimo’ da população durante o processo com o objetivo de dar certa ‘legitimidade’ aos seus mandatos e ao próprio sistema como um todo”, explica Mônica. Para se ter uma ideia, em 1889, o Brasil tinha cerca de 2 a 3% da população aptos a votar. Em 1930, esse índice permanecia praticamente inalterado – 5%.

E foi dessa forma, com o domínio eleitoral da elite – formada por um grupo de pessoas que por questão de berço, herança, concessões econômicas e/ou políticas obtém “autorização” do poder central de atuar no seio da sociedade em que vive – que o Paraná, e o resto do Brasil, viveu até 1930 – ano em que o gaúcho Getúlio Vargas comandou uma revolução que, entre outros fatores, transformou parte do país e o manteve no cargo de Presidente da República por 15 anos ininterruptos. 

*Este é o terceiro texto que essa coluna está fazendo sobre eleições no Paraná.

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