A política no Regime Militar

As torturas tornaram-se práticas rotineiras depois da promulgação do AI-5

Há 58 anos, o Brasil entrava em um dos períodos mais conturbados da história. Choques elétricos, afogamentos e muita violência deixaram marcas eternas em todas as vítimas do Regime Militar (1964-1985). As torturas tornaram-se práticas ainda mais rotineiras depois da promulgação do Ato Institucional número 5 (AI-5), no mandato do general Costa e Silva, em 1968.

No Paraná, o grupo estadual Tortura Nunca Mais estima que quatro mil pessoas foram presas durante a ditadura. Desses, no mínimo, mil sofreram tortura. O número, contudo, pode ser muito maior. A última coluna a respeito das histórias das eleições no Paraná aborda justamente o cenário dessa época. 

Nas eleições de 3 de outubro de 1965, a população ainda votava e elegeu Paulo Pimentel como governador do Estado, com 51,1% dos votos contra 45,1% de Bento Munhoz da Rocha Neto. “Por outro lado, outros dois importantes governadores conspiradores, Magalhães Pinto, em Minas Gerais, e Carlos Lacerda, na Guanabara, não conseguiram eleger seus sucessores. A vitória de Israel Pinheiro da Silva (PSD), em Minas Gerais, e Francisco Negrão de Lima (PSD), na Guanabara, representaram uma séria derrota ao regime militar”, escreve o historiador Alessandro Batistella, em artigo científico.

Em resposta, os militares decretaram, em 27 de outubro de 1965, o Ato Institucional nº 2 (AI-2), que, entre outras coisas, estabeleceu a eleição indireta para a presidência da República e extinguiu os partidos políticos existentes no país, dando início ao bipartidarismo. “Assim, surgiram, de um lado, a Aliança Renovadora Nacional (Arena), partido de apoio ao regime; de outro, o Movimento Democrático Brasileiro (MDB), partido de oposição consentida e controlada”. Era o fim do pluripartidarismo no Brasil.

A partir de então, a população não teria mais o direito de escolher seu governador e, muito menos, seu presidente. Assim, o golpe militar de 1964 impediu a manifestação mais legítima de cidadania proibindo o voto direto para presidente da República e representantes de outros cargos majoritários, como governador, prefeito e senador – era o fim da democracia no país. “Apenas deputados federais, estaduais e vereadores eram escolhidos pelas urnas. O regime que destituiu o presidente João Goulart fechou emissoras de rádio e televisão, e a censura tornou-se prática comum”, assinala material publicado no site da Câmara dos Deputados.

Na cadeira de governador do Paraná sucederam-se, na ordem cronológica da ditadura, nomes como Haroldo Leon Peres, Pedro Parigot de Sousa, Emílio Hoffman Gomes, Jaime Canet Junior e Ney Braga – todos alinhados politicamente com o regime.

Contexto político

Em 1968, vale lembrar, a ditadura se intensificou: o presidente Costa e Silva decretou o AI-5, que deu totais poderes ao governo. O Congresso foi fechado e diversos parlamentares tiveram seus direitos cassados.

Em 1972, foram restauradas as eleições diretas para senador e prefeito, exceto para as capitais. Entretanto, o cientista político Jairo Nicolau em entrevista ao site da Câmara dos Deputados, aponta que os militares continuaram interferindo no processo eleitoral municipal, sempre na busca por favorecer aliados políticos.

Por outro lado, a intensificação das torturas – os chamados “anos de chumbo” – desgastou a imagem dos governos militares. Tanto que em 1974 houve um crescimento do MDB nas urnas.

Para evitar novo fracasso nas eleições de 1978 para o Senado, o governo editou o que ficou conhecido como Pacote de Abril. “O Pacote de Abril foi outra artimanha, uma intervenção mais forte. Cada estado tem três senadores, e, na eleição de 78, eram apenas dois senadores, um eleito diretamente e outro, indiretamente. De que maneira? Eleito pela Assembleia Legislativa de cada estado. Como a Arena era o partido majoritário, seus senadores foram eleitos em praticamente todos os estados, com exceção da Guanabara, onde o MDB era o partido majoritário”, explica Jairo Nicolau. A população apelidou os eleitos pelas Assembleias Legislativas de senadores biônicos.

Mesmo assim, o MDB, liderado por Ulysses Guimarães, saiu vitorioso nas eleições de 1978, obtendo 57% dos votos.

Fac-símile de reportagem do Jornal do Brasil de 1979.

Volta do pluripartidarismo

Um ano depois, em 1979, o governo desistiu de manter dois partidos em vigência no país e extinguiu o bipartidarismo. “No ano de 1979, foi decretado um novo conjunto de reformas que, entre outras, pôs fim ao bipartidarismo e permitiu as eleições diretas para governador, processo que originou ao Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB) – com quadros políticos oriundos do MDB – e ao Partido Democrático Social (PDS) – proveniente da ARENA”, explicam os autores Roberto Mauro da Silva Fernandes, Rafael Freire de Paula, Matheus Mazurechen Barros e Bruno Henrique Costa Toledo.

Desta maneira, as eleições majoritárias de 1982 – as primeiras depois dessa medida, foram disputadas por mais de dois partidos políticos, algo que não ocorria desde 1966.

O Paraná voltou às urnas e elegeu José Richa como governador. Ele foi um dos nove governadores eleitos pelo PMDB naquele ano. Richa derrotou Saul Raiz (PDS) com 53,5% dos votos.

José Richa. Foto: Agência Senado.

Era a primeira experiência democrática após décadas de ditadura. Uma luz de esperança se acendia. O movimento Diretas Já ganhou corpo. A luta agora era garantir o direito da população em escolher o presidente da nação.

Segundo o Tribunal Superior Eleitoral, foram realizadas seis eleições indiretas para presidente da República, sendo três pelo Congresso Nacional e três pelo Colégio Eleitoral, “sendo que na última foi eleito um presidente civil, o deputado Tancredo Neves, que não tendo assumido em razão de seu falecimento, foi substituído pelo vice, José Sarney”, colocando um ponto final na era dos governos militares.

A primeira eleição direta para presidente da República após a ditadura militar aconteceu em 1989 e elegeu o Fernando Collor de Mello, que foi acusado – entre outras coisas – do confiscar as poupanças dos brasileiros e depois de dois anos de mandato sofreu impeachment. O primeiro presidente eleito pelo povo, após décadas, sequer conseguiu cumprir o mandato…

Neste ano, mais uma vez, o povo irá às urnas. Espera-se que a sociedade tenha maturidade para escolher um caminho que auxilie o país a sair do buraco que está enfiado.

Movimento das Diretas Já. Foto: reprodução.

Confira os demais textos da série “Eleições”:

A elite no poder – a primeira eleição no Paraná
Uma “escola” de administradores
República dos coroneis
A era dos interventores
Uma experiência democrática que durou 20 anos

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