A era dos interventores

Em janeiro de 1932, Manoel Ribas, velho conhecido de Vargas, foi nomeado interventor do Paraná

Se no decorrer da República Velha, as elites econômicas e políticas dominavam as eleições, com a prática do voto de cabresto, com a deflagração da Revolução de 1930, um novo grupo político, liderado por Getúlio Vargas, assumiu o poder e permaneceu por 15 anos comandando o país. Ao longo de todo esse período, o povo brasileiro ficou sem o direito de comparecer às urnas para votar para presidente do Brasil ou governador do estado.

Era uma fase da história brasileira em que a ditadura e a censura davam seus sinais em todo o Brasil. Nessa época, por quase 13 anos, o Paraná foi governado pela mesma pessoa: Manoel Ribas.

Antes, durante os primeiros anos da República dos Coronéis, imperou no Paraná os mandos e desmandos de Vicente Machado, o chamado “vicentismo”, “pois nada de relevante era decidido sem passar pelo crivo do hábil político”, como escreve Renato Mocellin, em “História Concisa do Paraná”. Após a Revolução de 30, foi a vez de “Seo” Manoel dominar politicamente o Paraná.

Vale rememorar que até o final da Primeira República, a oposição não conseguia encontrar espaços para se firmar “e praticamente não havia renovação dos quadros políticos. Affonso Camargo e Caetano Munhoz foram Presidentes de Estado duas vezes”, salienta o historiador.

Com o advento da Revolução de 30 e a subida de Getúlio Vargas ao poder, foi nomeado como Interventor do Estado o general Mário Tourinho, que assumiu um governo financeiramente quebrado. O legado deixado por Affonso Alves de Camargo era terrível, com “dívidas com bancos nacionais e estrangeiros. Os funcionários públicos não recebam havia dez meses. Boa parte dos empréstimos não se sabia onde foram aplicados”, revela Mocellin.

Getulio Vargas se valeu de um suposto plano comunista para tomar o poder no Brasil para dar um golpe e instalar o Estado Novo no país.

Os interventores

“Uma das primeiras medidas do Governo Provisório foi a edição do Decreto do dia 11 de novembro de 1930, que tornou Getúlio Vargas detentor do Poder Executivo e também do Poder Legislativo, extinguindo temporariamente o Congresso Nacional”, escrevem os pesquisadores da Universidade Federal do Paraná, Ricardo Oliveira e Natália Granato. O decreto também previa a substituição do cargo de governador pelo de interventor, a quem coube dissolver o congresso legislativo estadual, cassar o mandato dos prefeitos e nomear outros.

“Os interventores, por sua vez, deviam fidelidade ao chefe revolucionário, que tinha a prerrogativa de mantê-los ou não no cargo”, completam os autores.  Mas, sem traquejo político, Tourinho durou pouco no cargo, sendo demitido em 29 de dezembro de 1931. O cargo foi assumido interinamente por João Pernetta.

Ribas no poder

Manoel Ribas: Imagem: Casa Civil do governo do Paraná.

Em janeiro de 1932, Manoel Ribas, velho conhecido de Vargas, foi nomeado interventor do Paraná. “O principal argumento para a ocupação da interventoria por Ribas era a sua capacidade de gerir os negócios onde estava envolvido, seja na cooperativa dos ferroviários, ou na administração das suas fazendas de criação, sendo um grande estancieiro no Paraná”, escrevem Oliveira e Natália.

Natural de Ponta Grossa, Ribas pertencia a uma tradicional família dos Campos Gerais. Dos 24 aos 59 anos, ele viveu no Rio Grande do Sul, estabelecendo vínculos políticos e econômicos com este estado. “Em síntese, Manoel Ribas era descendente das principais famílias que detinham a grande propriedade de terras nos Campos Gerais, somado ao prestígio social e domínio de exercício de importantes cargos políticos, reproduzidos por séculos na história paranaense”, resumem os pesquisadores.

Realizações

Sem formação universitária, Ribas era descrito como um home rude e prático. O homem de confiança de Getúlio Vargas, deparou-se com um Estado em situação precária – seja na parte financeira ou no setor de infraestrutura. Para começar a cortar gastos demitiu metade dos funcionários públicos – aí o apelido de “Maneco Facão”.

Durante seus anos à frente do Estado, teve seus méritos: construção da Estrada do Cerne ligando a capital ao Norte Pioneiro, aumentou, entre 1932 a 1941, os gastos com Educação de 3,05% para 21,24% e ampliou em 220% as verbas para a saúde pública – por exemplo. Foi em seu governo, graças a boa relação com o empresário Wolff Klabin, que em 1942 começaram as obras da Indústria Klabin de Papel e Celulose na região de Telêmaco Borba.

Golpe dentro do golpe

Para dar um verniz de legalidade ao governo de Getúlio Vargas, foi elaborada uma nova Carta Magna no país, a Constituição de 1934, que duraria apenas três anos. Essa carta constitucional elegeu indiretamente pela Assembleia Constituinte, Getúlio Vargas presidente do Brasil.

Ainda estava previsto, segundo a própria Constituição, que seriam realizadas as “eleições dos membros da Câmara dos Deputados e das Assembleias Constituintes dos Estados. Uma vez inauguradas, estas últimas passarão a eleger os governadores e os representantes dos estados no Senado Federal”. Ou seja, o governador seria eleito de maneira indireta pela Assembleia Legislativa. Dessa forma, em 1935, Manoel Ribas permaneceu no posto – agora como “governador” e não mais como “interventor”.

Ao assumir o poder em 1930, Getúlio Vargas havia, ainda, determinado a criação do Tribunal Superior Eleitoral dois anos após tornar-se o presidente do Brasil. Assim nasceu a Justiça Eleitoral em território brasileiro em 1932. O objetivo de sua instituição era dar transparência ao processo de votação e aperfeiçoar o sistema eleitoral. O novo código garantiu pela primeira vez na história o direito do voto às mulheres.

Tudo caminhava de uma maneira positiva dentro do Tribunal Eleitoral até o ano de 1937, quando Vargas instaurou o Estado Novo, se perpetuando no poder até 1945.

Com o período ditatorial de Vargas, o Brasil assistiu à chegada da nova Constituição de 1937. A nova Carta extinguiu a Justiça Eleitoral, aboliu os partidos políticos, suspendeu as eleições livres e estabeleceu a eleição indireta para presidente da República com mandato de seis anos. Manoel Ribas continuou comando o Paraná novamente como interventor.

Com o Estado Novo ruindo aos poucos, tinha sido aprovado e sancionado em maio de 1945 um novo Código Eleitoral, que restabeleceu a Justiça Eleitoral, permitindo, assim, a organização, o alistamento e as eleições.

Em outubro de 1945, Getúlio Vargas renunciou, o que fez Manoel Ribas deixar o Governo no mês seguinte. Até 1947, cinco nomes passaram pelo cargo por pouco tempo: Clotário de Macedo Portugal, Brasil Pinheiro Machado, João Cândido Ferreira Filho, Mario Gomes da Silva e Antônio Augusto de Carvalho Chaves.

Chegava, em 1947, ao fim o período de interventores. A população paranaense estava, a partir de então, livre para voltar às urnas e eleger os seus governantes – prática que perdurou pelo menos até o golpe de 1964 proibir o voto direto para presidente da República e representantes de outros cargos majoritários, como governador, prefeito e senador.

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