Porque ouvir os clássicos

Tudo que existe para que a música exista, conta sobre o mundo ao redor dela. E a música, em si, conta sobre os sentidos daquelas pessoas.

Bach, Billie Holiday, Belchior, Beatles, Bee Gees e Beethoven foram alguns dos nomes que me vieram à mente quando eu pensei em clássicos com a letra B. Cada um – ao seu modo, tempo e estilo – construiu um legado musical que está na memória da maioria de nós, mesmo que não saibamos disso. Os clássicos, sejam eruditos, populares, brasileiros ou internacionais, são clássicos porque estão em uma memória coletiva, uma nuvem de conhecimento intrínseca à existência em um determinado tempo e lugar.

É como se o som concebido por eles pairasse no ar. Clássicos são marcas do tempo, da história e das perspectivas humanas. Esses repertórios contam sobre suas gerações, sobre as subjetividades importantes para um tipo de gente diferente de nós. Marcam comportamentos, sociabilizações, economias, rituais e pensamentos que entendemos como passados, mas que se observarmos de perto, ainda nos faz sentido, seja por uma razão ou por outra, e por isso eles permanecem na memória.

Tudo que constitui a música conta sobre quem a fez. Os timbres, os instrumentos usados, as durações, as poéticas, os músicos, as plateias, e tudo mais que existe para que a música exista, conta sobre o mundo ao redor dela. E a música, em si, conta sobre os sentidos daquelas pessoas. Quando ouço um clássico e gosto, é porque, mesmo em outro tempo, aquilo tem direção para mim. Algo presente ali, em qualquer aspecto, falou comigo de maneira direta. Me atravessou.

Às vezes, quando conto que eu trabalho com música de concerto, as pessoas me fazem perguntas sobre os clássicos europeus do século XIX. Quando eu era mais nova, vários dos meus amigos ficavam meio abismados, porque, para eles, eu gostava de “música de gente velha”. Estereótipos à parte, eu me abri para os clássicos europeus por pura curiosidade e possibilidade. Lembro do meu pai ouvindo música de concerto na rádio educativa, e fui lá ver qual era a daquele som. Talvez por um romantismo adolescente, talvez por uma admiração técnica, talvez para me sentir mais perto do meu pai, aquela música falou comigo.

Por que ouvir clássicos? Respondo com: “por que não? ”. Essas músicas contam e cantam histórias. Explicam de maneira artística um bocado de coisas que não temos clareza sobre as razões. Houve um povo que considerava cotidiano assistir óperas de 3 horas. Houve um povo que considerava cotidiano cantar na lavoura. Houve um povo que cansou do cotidiano e desfamiliarizou. Ouvir seus clássicos é quase como conhecê-los nus, expostos em seus sentidos e sentimentos.  Às vezes, ouvindo eles, conhecemos um pouco mais de nós.

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