Esta é uma coluna de assuntos jurídicos e histórias, e hoje é dia de história.
E a história de hoje é sobre uma gafe, perpetrada por um advogado em uma audiência, que presenciei lá pelo início dos anos oitenta. Na época eu trabalhava no cartório da 12ª Vara Cível de Curitiba e datilografava as atas de audiências, conforme eram-me ditadas pelo juiz (na Olivetti, com papel carbono para sair com cópia).
Primeiro preciso explicar que, em linguagem jurídica, usa-se o termo “competência” para designar a gama de matérias, ou casos, que cabe a cada juiz julgar.
Existe uma competência territorial, por exemplo: a um juiz compete os casos de Curitiba e a outro compete os casos de Ponta Grossa etc.
E existe a competência material, ou seja, o juiz do Trabalho julga as causas trabalhistas, o juiz da Vara Criminal julga os crimes, o juiz das Varas de Fazenda Pública julga os casos relativos às coisas públicas do Estado, e assim por diante.
Portanto “competência”, juridicamente, é termo usado para designar uma forma de organização do funcionamento do Judiciário: a quem compete julgar cada coisa.
Pois bem, nessa audiência, que tratava de um acidente de automóvel, acabou surgindo um fato novo: o envolvimento de um terceiro veículo no acidente, que por acaso era de propriedade do Estado, além dos veículos do autor e do réu.
Em virtude da presença desse veículo de propriedade do Estado, o acidente somente poderia ser julgado por um juiz da Vara da Fazenda Pública.
Ao certificar-se de que o terceiro veículo envolvido realmente pertencia ao Estado, o Juiz declarou que iria remeter o processo para uma das Varas da Fazenda Pública de Curitiba, dizendo: “Eu sou incompetente para julgar este processo”.
Ao ouvir isso, o advogado do autor, prevendo demora no processo, interrompeu ostensivamente bradando: “Modéstia sua! Vossa Excelência é muito competente”.
O constrangimento foi geral.
Coube ao juiz desfazer o mal entendido sem ser grosseiro com o causídico que, neste ponto, já era digno de compaixão; mas o pessoal meio que notou um escrevente que não conseguia conter o riso.
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Sobre o/a autor/a
Vicente Moraes
Vicente Moraes é advogado especializado na área trabalhista, com uma carreira jurídica de mais de 40 anos. Escritor, poeta e músico, nas horas vagas gosta de fazer doce de goiaba.