Elevador de Serviço – Acidente de percurso

Sabe aquela tempo de deslocamento à disposição do empregador? A Reforma Trabalhista cortou. Mas como fica se acontecer um acidente? Vicente Moraes explica

Mais um direito a menos.

Embora o governo Temer tenha se esforçado em afirmar que a Reforma Trabalhista não retirou direitos dos trabalhadores, isso não é verdade. Alguns direitos efetivamente foram suprimidos, entre eles as chamadas horas in itinere.

O que se chama de horas in itinere, é o tempo de deslocamento de casa para o trabalho, e vice-versa.

Quando o trabalho tem que ser realizado em um local de difícil acesso, não servido por transporte público regular, e a condução é fornecida pelo empregador – e somente nestes casos – o tempo de deslocamento é considerado como sendo à disposição do empregador.

Isso ocorre, por exemplo, em uma mineradora, ou em uma torre de observação de reflorestamento, ou em uma fazenda. Não consigo imaginar quem o presidente Temer beneficiou suprimindo essas horas in itinere. Pelo visto, este foi um daqueles direitos taxados de “exagerados”.

Mas nada tem de exagerado, basta lembrar que não somente as horas efetivamente trabalhadas pelo empregado são remuneradas. Aquele tempo em que o empregado está à disposição do empregador, aguardando ordens, também deve ser remunerado. Inclusive é comum, por exemplo, em empresas de transporte coletivo, manter alguns motoristas na reserva, apenas para suprir eventual falta.

A Reforma Trabalhista suprimiu as horas in itinere, e o tempo de deslocamento, mesmo nesses casos específicos, não é mais considerado como tempo à disposição do empregador, portanto, não se inclui no cômputo da jornada de trabalho, logo, não gera direito a horas extras.

Sinto ser repetitivo, mas quero deixar bem claro este ponto.

Se o empregado trabalha, por exemplo, em uma mina de ouro lá no interior, onde não chega ônibus, e é levado por condução fornecida pelo patrão, e isso demora uma hora para ir e uma hora para voltar, esse tempo não é mais remunerado, pois não se considera como tempo à disposição do empregador.

Reflexo na Previdência

Atualmente o governo Bolsonaro pretende suprimir benefícios previdenciários, ao argumento de que a Previdência Social está quebrada e precisa economizar. Afirmação bastante questionável, cujos números são propositadamente escondidos, sob um sigilo injustificável.

O governo usou uma medida provisória (do pente fino no INSS) para propor que não sejam mais considerados como acidente de trabalho, aqueles ocorridos no percurso casa-trabalho ou trabalho-casa.

O chamado Acidente de Percurso, ou de Trajeto, teve seu marco inicial mais significativo, na legislação, com o Decreto Lei n.º 7.036, de 10 de novembro de 1944, no qual esta espécie de acidente do trabalho foi “batizada” como acidente in itinere.

O acidente de trabalho que causa ofensa física, a ponto do empregado ter que se afastar do trabalho, por longo período, para tratamento, é coberto pelo chamado auxílio-acidente do INSS, e dá ao empregado estabilidade no emprego (que é proteção contra demissão sem justa causa) de 12 meses após a alta médica.

Os acidentes de trabalho são classificados em três tipos – todos eles geram os efeitos acima mencionados, quais sejam:

O ACIDENTE TÍPICO, aquele caso clássico em que o empregado cai, se machuca no trabalho, prende a mão em uma máquina, etc.

As DOENÇAS DO TRABALHO, que são equiparadas a acidente de trabalho, como as LER (Lesão de Esforço Repetitivo) e Dort (Distúrbio Osteomuscular Relacionado ao Trabalho).

E os ACIDENTES POR EQUIPARAÇÃO LEGAL, ou seja, casos que, pela lei, são equiparados a acidente de trabalho – no qual se encaixa o acidente de percurso – e que são (conforme prevê o art. 21 da Lei Previdenciária – Lei 8.213/91):

II – o acidente sofrido pelo segurado no local e no horário do trabalho, em conseqüência de:

a) ato de agressão, sabotagem ou terrorismo praticado por terceiro ou companheiro de trabalho;

b) ofensa física intencional, inclusive de terceiro, por motivo de disputa relacionada ao trabalho;

c) ato de imprudência, de negligência ou de imperícia de terceiro ou de companheiro de trabalho;

d) ato de pessoa privada do uso da razão;

e) desabamento, inundação, incêndio e outros casos fortuitos ou decorrentes de força maior;

III – a doença proveniente de contaminação acidental do empregado no exercício de sua atividade;

IV – o acidente sofrido pelo segurado ainda que fora do local e horário de trabalho:

a) na execução de ordem ou na realização de serviço sob a autoridade da empresa;

b) na prestação espontânea de qualquer serviço à empresa para lhe evitar prejuízo ou proporcionar proveito;

c) em viagem a serviço da empresa, inclusive para estudo quando financiada por esta dentro de seus planos para melhor capacitação da mão-de-obra, independentemente do meio de locomoção utilizado, inclusive veículo de propriedade do segurado;

d) no percurso da residência para o local de trabalho ou deste para aquela, qualquer que seja o meio de locomoção, inclusive veículo de propriedade do segurado.

§ 1.º Nos períodos destinados a refeição ou descanso, ou por ocasião da satisfação de outras necessidades fisiológicas, no local do trabalho ou durante este, o empregado é considerado no exercício do trabalho.

§ 2.º Não é considerada agravação ou complicação de acidente do trabalho a lesão que, resultante de acidente de outra origem, se associe ou se superponha às conseqüências do anterior.

Tudo isso estamos falando, unicamente, para fins previdenciários. Não se confunde com eventual indenização devida pelo patrão em casos de acidente de trabalho, assunto bastante complexo, que vai depender da culpa ou dolo do empregador, e não é objeto desta coluna.

Aqui cabe apenas ressaltar que o chamado Acidente de Percurso (ou de Trajeto), nunca gerou ao empregador o dever de indenizar o empregado, nos casos normais em que o empregado vai à pé, de bicicleta, com carro particular, de ônibus, metrô, etc, nada disso implica em responsabilidade do empregador, em caso de acidente.

O argumento atual do governo é o seguinte: como a Reforma Trabalhista não considera mais como tempo à disposição do empregador o trajeto de casa para o trabalho e vice-versa, portanto o acidente que nesse percurso ocorrer, também não pode ser considerado como acidente de trabalho, para fins de pagamento de benefício previdenciário.

É a supressão de um direito trabalhista, justificando a supressão de um benefício previdenciário.

Parece-me canhestro o raciocínio, pois a Reforma Trabalhista retirou apenas os casos de horas in itinere, ou seja, especificamente casos em que o trabalho ocorre em local ermo, não servido por transporte público regular, e o transporte é fornecido pelo empregador.

E os casos de Acidente de Percurso, podem ocorrer em qualquer local, mesmo em transporte público, contanto que seja no trajeto. Ou seja, abrange absolutamente TODOS os empregados.

Portanto, em sendo confirmado este ponto da medida provisória, e extinguindo-se o Auxílio-Acidente por Acidente de Trajeto, se você cair na hora de entrar no ônibus e quebrar um braço, ou uma perna; se você for atropelado; se você for assaltado e agredido, ou outras situações, no percurso de casa-trabalho, trabalho-casa, o problema é SEU.

O INSS não vai pagar qualquer benefício, para seu sustento, enquanto você estiver incapacitado. Muito menos, o patrão.

Vire-se como puder, e reze para não ser mandado embora, porque também não haverá para você qualquer estabilidade.

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