Elevador de Serviço 14 – Onde está a Justiça?

Vicente Moares lembra que os conflitos entre empregados e empregadores são inerentes a uma sociedade capitalista
A noção de justiça parece já vir impregnada na alma humana, desde o embrião. Mesmo os injustos sabem quando estão praticando injustiças. O problema é que existe uma vasta diversidade de opiniões a respeito do que, realmente, seja justo.
Assim, de uma noção básica de civilidade, de necessidade de viver em sociedade, nasceu a ideia da – digamos assim – terceirização da Justiça.
Entrega-se a um terceiro ente, o Estado, o poder de decidir a respeito dos conflitos, e o  aparelhamento necessário para colocar em prática suas decisões.
O Poder Judiciário está estruturado em segmentos, com ramos específicos como a Justiça Militar, a Eleitoral, a Desportiva etc.
A chamada Justiça Comum, além de processos criminais, trata basicamente de questões envolvendo patrimônio. É um despejo, uma cobrança, um inventário. Para quem não tem casa alugada, nem promissória pra cobrar, nem herança pra receber, a Justiça Comum não tem muita serventia.
A Justiça mais próxima do cidadão comum, portanto, é a Justiça do Trabalho. Embora quase nenhum empregador seja simpático à ela, é forçoso admitir que os conflitos entre empregados e empregadores são inerentes a uma sociedade capitalista. Já comentei isso na minha primeira coluna.
Estes conflitos trabalhistas, necessariamente, devem ser resolvidos pelo Estado. E é por conta deste raciocínio simples e lógico, que fico realmente estupefato quando ouço alguém defendendo o fim da Justiça do Trabalho. O que esperam essas pessoas? Que os conflitos simplesmente deixem de existir, por falta de alguém que os julgue? É como querer fazer uma lei proibindo chover nos feriados.
Portanto, as relações de trabalho, simplesmente, são parte do jogo. Economia, como se sabe, não é uma ciência exata, e sim uma ciência social. O custo com demandas trabalhistas integra os custos da produção, da mesma forma que os impostos ou o preço dos insumos.
Mas minha intenção hoje é falar sobre a noção de Justiça, e assim pergunto: você acha justo que alguém seja mandado embora quando é acometido de uma doença grave?
Ou seja, trabalha muitos anos enquanto está com saúde, mas é mandado embora ao adoecer.
O Tribunal  Superior de Trabalho acha isso injusto – chama-se “despedida discriminatória”. Por ocorrer muitas vezes, o TST acabou firmando este entendimento. Trata-se da Súmula 443: “Presume-se discriminatória a despedida de empregado portador de vírus HIV ou de outra doença grave que suscite estigma ou preconceito”.
Este entendimento já não é novo; a Súmula 443 é de 2012, mas baseada em casos julgados desde o ano de 2000.
Recentemente o TST julgou mais um caso. Trata-se de um executivo que trabalhou 28 anos na Pepsi, sempre tido como profissional exemplar. Acometido de câncer de próstata, foi dispensado quando estava prestes a ser promovido a diretor. A indenização pelos danos morais foi fixada em R$ 200 mil, além da indenização pela demissão injusta (Proc. n. E-ED-RR 68-29.2014.5.09.0245).
E não há como não lembrar do filme Philadelphia, com Tom Hanks.
É de se perguntar se este executivo, que já trabalhou 28 anos, vai conseguir completar 40 anos de contribuição ao INSS, para ter direito a uma aposentadoria integral. Isso é justo?
 

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